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Roberta Maia Gresta

Candidaturas precisam ser julgadas mais cedo

Cabe agora ao Senado impedir risco de incertezas políticas e administrativas

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Roberta Maia Gresta

Doutora em direito político, é servidora da Justiça Eleitoral e membro-fundadora da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep)

14.989. Este é o número de candidaturas que, dois dias antes das eleições municipais de 2020, se encontravam sem decisão definitiva. Apuradas as urnas, a situação impediu proclamar o resultado da eleição para prefeito em 102 municípios do país.

Os números podem parecer pequenos em meio a 557.659 candidaturas e 5.568 municípios brasileiros. Mas as denominadas “candidaturas sub judice” afetam a formação da vontade livre dos eleitores, que precisam decidir seu voto sem saber se será válido. Além disso, a indefinição do resultado acarreta incerteza política e administrativa, com reflexo na vida de milhares de pessoas.

De tão atípica, a situação chamou a atenção da Missão de Observação Eleitoral da OEA (Organização dos Estados Americanos), que recomendou fortemente a adoção de medidas para minimizar o problema.

Mas, afinal, por que chegamos tão perto das eleições, ou ao dia delas, sem conhecer o quadro de candidaturas viáveis? A resposta é mais simples do que parece: o calendário eleitoral. Em 2015, o Congresso empurrou a data-limite do registro de candidatura de 5 de julho para 15 de agosto. Com pouco mais de 45 dias até a data da eleição, é inviável julgar todas as candidaturas.

A justificativa usualmente dada para a alteração é a redução dos gastos com propaganda. Mas, no fundo, está em questão ganhar tempo para definir estratégias eleitorais.

A pretensão é legítima. O problema é que o preço a pagar é a instabilidade do processo eleitoral.

Frequentemente, a própria classe política cobra a fatura da Justiça Eleitoral, que impediria “eleitos” (na verdade, candidatos mais votados cujo registro, indeferido, é objeto de recurso) de tomar posse.

O Tribunal Superior Eleitoral já havia indicado a conveniência de aumentar o intervalo para análise das candidaturas. Em sua fala ao Senado Federal em junho de 2020, o ministro Luís Roberto Barroso sugeriu que, uma vez adiada a eleição para novembro, fosse mantido o registro de candidatos em 15 de agosto. Na prática, seriam 90 dias até a eleição.

À época, o Congresso não adotou a proposta. Mas o diálogo institucional rendeu frutos. No projeto do novo código eleitoral (PLP 112/21) inicialmente apresentado pela deputada Margarete Coelho (PP-PI), o limite do registro de candidatura foi fixado em 1º de junho (art. 202).

Porém, após a reunião do Colégio de Líderes na Câmara, a data foi alterada para 14 de agosto (art. 191). “Antecipação” de um dia em relação à data atual, evidentemente, nada resolverá.

A versão foi aprovada em plenário no último dia 9 de setembro. Como não houve emendas sobre a matéria, a solução está nas mãos do Senado, que pode propor antecipação efetiva para 1º de junho ou, ao menos, 5 de julho.

O bom senso não aponta outro caminho. Eleitores e eleitoras têm o direito de saber, antes da eleição e mesmo antes do início da propaganda eleitoral, quem são os candidatos e as candidatas aptos a concorrer. O voto, direito fundamental, não deve ser exercido como uma aposta no escuro.

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