Projetava-se, em janeiro, que a inflação deste ano ficaria em torno de 3,3%, e patamar semelhante era esperado para os juros do Banco Central. Hoje, previsões para IPCA e Selic rondam os 8,5%, em indicativo eloquente do enfraquecimento da política econômica.
Na quarta-feira (22), o BC elevou sua taxa em 1 ponto percentual, para 6,25%, e indicou que prosseguirá no aperto monetário; não é improvável que o processo tenha continuidade em 2022. O país se desgarra, assim, do padrão de relativa normalidade dos últimos três anos.
Entre 19 grandes economias do mundo, o Brasil deve registrar a terceira maior inflação neste 2021, atrás apenas da irremediável Argentina (47%) e da Turquia (17,8%), conforme levantamento da Organização para a Cooperação de Desenvolvimento Econômico (OCDE). Trata-se, mostram os dados, de um problema doméstico.
É fato que houve uma alta global dos preços de produtos primários de exportação, mas no Brasil o fenômeno teve seu efeito amplificado pela desvalorização aguda da moeda nacional e pelas incertezas quanto à solidez das contas públicas —fatores diretamente ligados a ações do governo Jair Bolsonaro.
Adicionalmente, houve quebra de safras agrícolas e a crise hídrica, que encareceu a energia elétrica e ameaça levar ao racionamento.
O IPCA teve variação acumulada de 9,68% nos 12 meses encerrados em agosto. Neste século, esse índice de preços ao consumidor chegou aos dois dígitos em apenas duas ocasiões, ambas em meio a grande tensão política e econômica: em 2002-2003, na virada do governo tucano para o petista, e 2015-2016, na derrocada de Dilma Rousseff.
Não se pode subestimar, portanto, a gravidade da escalada inflacionária e seu impacto sobre o bem-estar das famílias e os humores do eleitorado. Conforme a pesquisa Datafolha deste mês, 69% dos brasileiros consideram que a situação econômica do país piorou nos últimos meses, e 53% dizem que sua própria situação se deteriorou.
Há grande perigo quando o governo perde capacidade de conduzir as expectativas de consumidores, empresários e investidores —e um ano de eleições tende a ser um complicador. As projeções do mercado para o IPCA de 2022 estão em alta e já rondam 4,1%, acima da estimativa do BC (3,7%) e da meta fixada para o período (3,5%).
No mínimo, o descrédito da política econômica torna mais custoso, na forma de juros maiores e desemprego, o controle dos preços. Na pior hipótese, chega-se à trágica combinação de inflação elevada e retração da atividade.
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