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Luiz Eduardo Barata e Amanda Ohara

O horário de verão deve voltar no Brasil? SIM

Crise se agrava, e qualquer redução no consumo pode ser determinante

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Luiz Eduardo Barata

Ex-diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), é consultor do Instituto Clima e Sociedade (ICS)

Amanda Ohara

Mestre em planejamento energético (Coppe/UFRJ), é consultora de energia do ICS

O próximo verão será especialmente desafiador para o sistema elétrico brasileiro. A falta de água nos rios e reservatórios se reflete em grave ameaça de crise no fornecimento de energia elétrica e no risco de que os meses de outubro e novembro sejam marcados por apagões. Enfrentar essa ameaça requer a adoção de medidas a respeito do acionamento de aparelhos de ar condicionado, novos “vilões” do consumo.

A melhoria das condições econômicas da população brasileira na década passada ampliou o acesso a equipamentos de refrigeração e mudou o comportamento da carga no Brasil. Ano após ano, a “carga pesada” do horário de ponta foi se deslocando do tradicional período das 18h às 21h para o meio da tarde, em torno das 15h, pelo maior uso de ar-condicionado. Em consequência, o horário de verão passou a representar uma economia menor para o sistema, já que ele não altera o consumo no período do dia em que o novo pico passou a acontecer.

O horário de verão foi adotado pela primeira vez no Brasil em 1931, quando já era praticado nos países da América do Norte e da Europa para aproveitar mais uma hora da luz solar. Por muitos anos, no Brasil, permitiu uma considerável economia no custo da energia graças à redução da geração térmica necessária para fazer frente à carga no horário de ponta tradicional de consumo (18h às 21h). O deslocamento do pico da carga para o meio da tarde, provocado pelos condicionadores de ar, foi reduzindo a economia no horário de ponta até que o mecanismo perdesse a relevância que tinha anteriormente.

Ocorre que, nesta crise que estamos vivendo em 2021, qualquer economia de carga, ainda que pequena, é mais do que bem-vinda. Os estudos desenvolvidos pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e por consultorias respeitáveis, e ainda por manifestações das autoridades do setor elétrico brasileiro, indicam a gravidade da crise, ficando claro o risco de o abastecimento de energia elétrica não ser atendido com a segurança desejada.

Para enfrentar esse perigo, após esgotar as medidas do lado da oferta de energia, as atenções começam a se voltar para o consumo. Ainda que tardiamente, o governo adotou providências para a redução voluntária da demanda na indústria, no comércio e nas residências, bem como a redução compulsória de consumo em prédios federais. Mas todas essas medidas podem não ser suficientes para evitar apagões, e descartar o horário de verão nesse contexto torna-se um contrassenso. Seu retorno seguramente trará economia de geração de energia elétrica no horário de pico do final da tarde, com uma redução de consumo que historicamente chega a até 4,5%.

Em vez de resistir, o governo deveria combinar o horário de verão com uma campanha massiva para orientar a população a economizar no uso dos equipamentos de ar condicionado. Por exemplo, manter a temperatura em 24°C, fechar as portas e janelas antes de acioná-los e fazer manutenção periódica.
O governo precisa também revisar os padrões de eficiência exigidos para os aparelhos vendidos no Brasil. A obrigatoriedade da etiquetagem também ajudaria muito. Estima-se que a economia de energia com aparelhos de ar condicionado mais eficientes pode chegar a 87,9 TWh até 2035, o que equivale a 64% de todo o consumo residencial em 2019.

Em um momento no qual qualquer redução no consumo pode ser determinante, o foco deve estar em todas as medidas para gerar essa economia, não em resistir a ações que possam ajudar. O país precisa sair da inércia e andar para a frente nessas discussões, antes que o desafio se torne grande demais para ser superado.

É, portanto, imperioso que o horário de verão seja retomado o quanto antes, acompanhado de uma campanha para reduzir o gasto de energia com condicionadores de ar e onde mais couber.

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