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Injustiça militar

STF precisa concluir debate sobre limites dos tribunais fardados no regime democrático

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Dois soldados de uniforme e capacete, segurando fuzis, na frente de um blindado, observam o movimento numa rua asfaltada, enquanto duas moradoras do local passam por eles. Uma das mulheres tem uma criança no colo.
Soldados durante operação em bairro da zona oeste do Rio de Janeiro em 2018. - Danilo Verpa - 3.mar.2018/Folhapress

Em boa hora o Supremo Tribunal Federal decidiu retomar o julgamento de duas ações que questionam os poderes da Justiça Militar no país, pendentes há vários anos.

No primeiro caso, discute-se sua competência para julgar civis em tempos de paz. O Código Penal militar, vigente desde o período autoritário, incluiu entre os crimes que poderiam ser julgados pelas cortes fardadas o desacato a militares, mesmo se cometido por civis.

Definido vagamente pela legislação, o delito tornou-se obsoleto com a redemocratização do país, por dar margem a tentativas de cerceamento da crítica legítima —incabíveis numa sociedade aberta.

No segundo caso, a questão é saber se crimes cometidos por militares em operações de garantia da lei e da ordem, como as ações na área de segurança pública, devem ser julgados pelas instituições castrenses ou pela Justiça comum.

Em 2010, uma lei assinada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva conferiu esta competência às cortes militares. Em 2017, Michel Temer a expandiu, transferindo para elas também os crimes dolosos contra a vida de civis praticados por militares nas operações.

A Procuradoria-Geral da República apresentou as duas ações ao STF nos idos de 2013. É injustificável a demora do tribunal em enfrentar essas questões e decidi-las.

A que trata do julgamento de civis em tempos de paz foi incluída na pauta do plenário nesta quarta (27), mas não houve tempo de discuti-la. Espera-se que os ministros voltem a ela nesta quinta (28).

O debate sobre as operações na segurança pública começou há dois anos e foi interrompido. Três magistrados se manifestaram a favor da Justiça Militar e um votou contra. A data em que o julgamento será reiniciado permanece indefinida.

O que está em jogo nos dois casos é mais do que as atribuições dos tribunais. Trata-se de definir a quais mecanismos de responsabilização os membros das Forças Armadas devem estar submetidos num regime democrático.

Passadas mais de três décadas desde o fim da ditadura, o Brasil tornou-se ponto fora da curva ao expandir, em vez de restringir, o alcance das cortes militares em tempos de paz, inclusive para punir civis.

O Congresso faria bem em rever o desenho e as competências desses tribunais. Na ausência de ação legislativa, caberá ao STF definir os limites à luz das garantias constitucionais que oferecem proteção a todos os cidadãos, fardados ou não.

editoriais@grupolha.com.br

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