Descrição de chapéu
O que a Folha pensa

Justiça e aprendizado

Condenação de militares por homicídios deve gerar reflexão sobre ação das Forças

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

0
Carro do músico Evaldo dos Santos, atingido por tiros - José Lucena/Futura Press/Folhapress

A utilização das Forças Armadas em atividades de segurança pública comporta não poucos riscos. Tendo como missão precípua a defesa nacional, e não o combate à criminalidade no contexto urbano, os militares não dispõem do treinamento adequado para atuar em situação desse tipo, o que abre margem para reações imprudentes e excessivas, quando não brutais.

Foi o que se verificou no hediondo assassinato do músico Evaldo Rosa dos Santos e do catador de material reciclável Luciano Macedo, fuzilados numa ação do Exército em abril de 2019 no Rio.

Segundo a acusação, foram desfechados nada menos que 257 tiros na direção do carro em que estavam o músico, seu sogro, sua mulher, seu filho, então com sete anos de idade, e uma amiga. Na tentativa de socorrer a família, que seguia para um chá de bebê, o catador também terminou alvejado.

Como ficou demonstrado no julgamento, encerrado na quinta-feira (14), os militares procederam com flagrante despreparo, ignoraram os protocolos de abordagem e, sem que tivessem certeza de quem estava no automóvel, assumiram que poderiam atirar para matar.

Dos 12 agentes envolvidos na operação, 8, que comprovadamente realizaram disparos, foram condenados pela Justiça Militar por duplo homicídio qualificado e tentativa de homicídio (concernente ao sogro, que sobreviveu).

Por um placar apertado de 3 votos a 2, sete foram sentenciados a 28 anos, e o comandante da ação, a 31 anos e seis meses.

Cabe lembrar que desde 2017 crimes dolosos cometidos por militares contra a vida de civis durante atividades operacionais não pertencem mais à esfera da Justiça comum, fruto de uma controversa mudança aprovada pelo Congresso e sancionada pelo então presidente Michel Temer (MDB).

Não à toa, no caso em tela, instalara-se o receio, felizmente desfeito pelo resultado do julgamento, de que o espírito corporativo pudesse sobrepujar o rigor e a imparcialidade esperados de um tribunal. A apreensão não é infundada, uma vez que 4 dos 5 membros do conselho julgador são militares da ativa e não possuem necessariamente formação em direito.

Para além da importância e do simbolismo, espera-se que a condenação venha a proporcionar uma reavaliação do emprego do Exército no papel de polícia, algo que nos últimos anos só produziu resultados fugazes e tragédias humanas.

editoriais@grupofolha.com.br

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.