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Edson Fachin

Os domingos esperançosos de outubro

Democracia exige administração responsável da frustração

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Edson Fachin

Ministro do Supremo Tribunal Federal e vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral

O vindouro ano de 2022, dentro do Estado democrático de Direito, deve espelhar no Brasil um processo eleitoral que se desenvolva dentro de uma atmosfera de pleno respeito aos direitos e liberdades políticas, notadamente porque a justiça das eleições demanda, como item primário, a ampla circulação de ideias, em ordem a que seus resultados reflitam, sem mais, a suma de uma opinião pública construída de forma livre e consciente.

Vive a democracia de regras eleitorais estabilizadas e de disputas legítimas. As regras gerais para 2022, já ultrapassada a fase do artigo 16 da Constituição da República (sobre o limite da anualidade para fixação das normas eleitorais), estão definidas e são conhecidas. A Justiça Eleitoral, em todo o país, está preparada e em contínuo aprimoramento.

Nesse panorama, a normalidade e a legitimidade dos pleitos circula em torno de exigências essenciais que arrolam, entre outros fatores, o respeito à função vigilante da imprensa e ao reconhecimento da crítica, da oposição e da inteligência discordante. As eleições democráticas, nesse contexto, sugerem máxima deferência à compreensão recíproca das razões conflitantes, pelo que invocam, como condição de possibilidade, os conceitos de paz, fraternidade e tolerância.

Temos todas as ferramentas para que a obra democrática de 2022 seja expressão do vigor da democracia e do respeito às regras do jogo eleitoral dentro da Constituição.

As democracias são, ademais, regimes orientados pela premissa de que a fortuna comum é de ser (continuamente) buscada por caminhos plurais e (por definição) cambiantes, consoante orientações apuradas, de tempos em tempos, pela percepção predominante na comunidade envolvida, o que demanda respeito às minorias e à diversidade. Pressupõem, portanto, que à população governada assiste o direito inalienável de se informar, acompanhar e julgar, seja cotidianamente, no plano dos diálogos horizontais entre pares, seja em momentos decisivos, como em domingos de esperançosos outubros.

Somado a esse quadro, as competições políticas reclamam doses substantivas de previsibilidade, estabilidade e segurança no que se refere à consolidação das regras balizadoras do jogo eletivo. Daí o sentido do prazo contido no preceito constitucional do artigo 16, segundo o qual “a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”. É o princípio da anterioridade.

O Brasil eleitoral está em dia, porquanto já nos encontramos dentro do período defeso às alterações.
Nesse campo específico, a garantia geral de proteção da confiança se projeta de maneira especial, com o desígnio de prover a candidatos, partidos políticos, autoridades públicas e sociedade civil, um catálogo nítido com direitos e limites, interdições e consequências, e do qual se apuram, em última instância, contornos jurídicos para a aferição da legalidade das campanhas, à luz de escolhas normativas determinadas, ao fim e ao cabo, pelo próprio povo, por intermédio do Parlamento.

Ditas escolhas, logicamente, vinculam a todos, desde os poderes constituídos aos candidatos e partidos, passando ainda pelos eleitores desiludidos com o saldo do julgamento coletivo. A democracia, sob esse aspecto, vindica, ao lado da obediência às leis, a completa exclusão da violência, mediante a administração responsável da frustração.

Urge, para tal efeito, saber e compreender que a insatisfação com os resultados das urnas não contamina, para nada, a justiça e a fundamentalidade do jogo em si.

A competição eleitoral, a propósito, é precisamente o canal que assegura que as derrotas sejam sempre momentâneas, uma vez que vitórias vindouras se mantêm no horizonte, cumprindo-se, assim, o processo eleitoral de disputas inerentes à democracia, sem afastar a pluralidade nas possíveis alternâncias e sem a abdicação de conquistas vitais, como o direito a continuar tendo escolhas e a processar as diferenças.
Que venha em paz tudo o que o domingo de 2 de outubro de 2022 trouxer.

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