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Democrata flexível

A defesa de ditadores amigos por Lula e pelo PT vem de longe e não vai mudar

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O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) - Ueslei Marcelino/Folhapress

Quem tem memória dos 13 anos de governo petista, e da trajetória de mais de quatro décadas do Partido dos Trabalhadores, não estranhou a argumentação escalafobética do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para defender ditaduras amigas da esquerda brasileira.

Questionado pelo jornal espanhol El País sobre a situação da Nicarágua do ditador Daniel Ortega, reconduzido pela terceira vez seguida num processo eleitoral de fancaria, o líder do PT saiu-se com um repisado sofisma: se governantes europeus como a alemã Angela Merkel podem ficar 16 anos no poder, por que Ortega ou o venezuelano Nicolás Maduro não podem?

O brasileiro foi rebatido instantaneamente pelas entrevistadoras, que lembraram que Merkel não prende opositores, como fazem caudilhos em Cuba, Nicarágua e Venezuela. Pego no contrapé —pois não está acostumado a ser contraditado por seu círculo de bajuladores— saiu-se com uma emenda que piorou o soneto.

"Se o Daniel Ortega prendeu a oposição para não disputar a eleição como fizeram no Brasil contra mim, ele está totalmente errado", disse Lula. Outra frase que entra para o bestialógico de quem já afirmou, sobre a Venezuela chavista, que ali há excesso de democracia.

Ditaduras negam aos encarcerados o direito de apelar pela liberdade e a inocência até a última instância perante juízes independentes. Essa é uma prerrogativa exclusiva do Estado democrático de Direito, de que tem usufruído à plenitude o ex-presidente brasileiro.

Outra cortina de fumaça do velho repertório esquerdista lançada por Lula, capaz de despistar apenas os incautos, é a confusão entre os princípios de não ingerência e autodeterminação dos povos, de um lado, e o da defesa dos direitos humanos e da democracia, do outro.

Não há nenhuma contradição entre condenar os abusos cometidos em território estrangeiro e respeitar a autonomia das nações para resolverem elas próprias os seus problemas. Um democrata convicto, e não um flexível como o líder petista, faria exatamente isso.

Tampouco o imperativo de denunciar em foros adequados as violações dos direitos humanos em Cuba colide com a obrigação de criticar o embargo dos EUA, que acaba agravando a precária situação da população da ilha.

Não há, infelizmente, nenhuma evolução na retrógrada posição petista nesse terreno. O partido pensa e age como Lula —vide nota congratulando Ortega e o elogio da ex-presidente Dilma Rousseff à autocracia chinesa— e não vai mudar.

Agrada-se assim à militância fiel e ideológica, correndo-se o risco de suscitar a repulsa dos demais eleitores. De maneira mais tosca, é o que faz Bolsonaro também.

editoriais@grupofolha.com.br

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