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Emendas obscuras

Decisão do STF joga luz sobre barganha de verbas do Orçamento sob Bolsonaro

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A ministra Rosa Weber, do STF - Fellipe Sampaio/STF

Vem em boa hora a decisão liminar proferida pela ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal, para suspender a execução das chamadas emendas de relator, o obscuro mecanismo que vem sendo utilizado pelo governo para cooptar sua maioria parlamentar.

A magistrada apontou possível inconstitucionalidade dessa categoria de emendas ao Orçamento, dimensionadas em R$ 16,9 bilhões neste ano, por não atender aos princípios de transparência e impessoalidade na gestão pública.

Ao contrário do que ocorre com as emendas individuais e de bancada, nas de relator não há vinculação entre o requerente e o beneficiário da despesa —o que é grave.

A falta de transparência já havia sido alvo do Tribunal de Contas da União, mas aparentemente não suscitou resposta do Executivo. Em seu despacho, a ministra menciona o descaso do Congresso e de órgãos da administração com os mecanismos de governança e aponta para a perplexidade com o uso de dinheiro do contribuinte por vias informais e obscuras.

Daí a determinação de que haja ampla publicidade dos documentos que embasam a distribuição de emendas de 2020 e 2021 e de que todas as demandas apresentadas por parlamentares sejam registradas em plataforma eletrônica.

O problema da captura do Orçamento não é recente, por certo. A história inclusive se repete —o célebre escândalo dos anões, em 1993, se deu justamente a partir do uso das emendas de relator, que depois caíram em desuso, mas foram reativadas a partir de 2020.

O processo é complexo e mistura razões legítimas com maus incentivos. De um lado, há o interesse do Congresso em ter voz ativa na gestão dos recursos, algo que ganhou corpo nos últimos anos.

De outro, o avanço parlamentar tende a ocorrer de forma descontrolada e sujeita a distorções quando o ocupante do Planalto é fraco, caso de Jair Bolsonaro.

O roteiro vem desde 2015, quando o Congresso deu caráter impositivo às emendas individuais. Em 2019, a mesma lógica foi estendida às emendas de bancada. O passo seguinte foi permitir que essas duas rubricas pudessem ser direcionadas a estados e municípios sem vinculação a programas.

O ponto culminante foi o retorno das emendas de relator, que passaram a ser o instrumento principal de cooptação política.

As três categorias de emendas somam R$ 34 bilhões em 2021. A quantia representa 15% de toda a despesa discricionária e cerca de metade do investimento federal.

Se o protagonismo do Congresso na feitura do Orçamento é desejável na democracia, cabe reconhecer que o processo se desvirtuou e carece de responsabilidade e transparência. Qualquer que venha a ser a decisão do STF sobre o tema, os próprios parlamentares deveriam rever os procedimentos.

editoriais@grupofolha.com.br

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