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Gênio fora da garrafa

Cuba consegue sufocar protestos, mas contestação parece ter vindo para ficar

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Veículos de polícia em Havana - Yamil Lage/AFP

Nos últimos meses, Cuba vem conhecendo uma nova e persistente onda de insatisfação popular contra um regime que, preso ao passado, não consegue oferecer aos dissidentes nada além de repressão.

O estopim ocorreu em julho, quando milhares de pessoas tomaram as ruas de Havana e de outros pontos da ilha nas maiores manifestações contra o governo desde o começo dos anos 1990.

Os atos buscaram denunciar os apagões diários, a ausência de liberdade de expressão e a falta de alimentos e remédios, que se agravou durante a pandemia.

A ditadura respondeu a sua maneira. Um relatório da ONG Human Rights Watch apontou violações graves aos direitos humanos, como prisões arbitrárias, condições desumanas de encarceramento e abuso sexual de mulheres.

Ao todo, mais de mil cubanos foram detidos durante e após as manifestações; cerca de metade deles permanece presa até hoje.

Dando continuidade aos protestos, grupos de artistas e ativistas marcaram novas manifestações para este mês. A convocação, feita por meio das redes sociais, escudou-se num artigo da Constituição cubana de 2019 que reconhece o direito de reunião e manifestação associadas a fins lícitos e pacíficos.

Como seria de esperar, o regime não só proibiu a realização dos atos como, diante da manutenção dos protestos, armou uma verdadeira operação de guerra para evitar que as cenas de julho se repetissem.

Tanto autoridades cubanas como os meios de comunicação oficiais dedicaram semanas a desqualificar a marcha. Repetindo fórmulas mofadas, acusaram o movimento de ser organizado e financiado pelos Estados Unidos.

A campanha de desmobilização foi além, com prisões preventivas, intimações para interrogatórios na polícia, ameaças e advertências.

Na segunda-feira (15), dia dos atos, os principais líderes da marcha acordaram com suas casas sob cerco policial, proibidos de sair às ruas. Nas áreas centrais de Havana, a presença maciça de policiais e de cidadãos chamados a defender a revolução dissuadiu qualquer tentativa de protesto.

Embora bem-sucedida, a estratégia de asfixia termina por revelar a profunda incapacidade do regime de lidar com um descontentamento que só tende a crescer. O aparato repressor funcionou desta vez, mas o gênio da contestação popular parece definitivamente ter saído da garrafa em Cuba.

editoriais@grupofolha.com.br

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