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Odacil Ranzi

O futuro do aquífero Urucuia

Estudo aponta que é possível aproveitar águas subterrâneas sem prejuízos ambientais

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Odacil Ranzi

Presidente da Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (biênio 2021-22) e produtor rural no oeste da Bahia

Vez ou outra, aparece no debate público a narrativa fácil e equivocada que tenta opor a produção agrícola ao meio ambiente. A realidade, porém, é muito mais complexa do que o enredo de vilões e mocinhos. Os temas ambientais interessam à sociedade e, em especial, ao agronegócio, pois é da harmoniosa relação entre a produção e a preservação que asseguramos o nosso futuro.

Quando falamos em cadeias produtivas altamente tecnificadas, como as existentes no oeste da Bahia, é impossível dissociar os bons resultados da produção do correto manejo dos recursos naturais. Essa questão, crucial para o setor produtivo, é fiscalizada pelos órgãos de regulação das esferas federal, estadual e municipal. O objetivo é adotar todos os cuidados e fazer cumprir a legislação que rege o setor.

Eldo Moreira Barreto, camponês geraizeiro, se apoia em um buriti à beira do córrego Pichico, em Brejo Verde, oeste da Bahia - Dado Galdieri - 18.set.21/Hilaea Media

Graças a estudos conduzidos por diversas instituições, incluindo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e o empenho dos produtores, foi possível desenvolver uma agricultura sustentável. Nela, inovação e tecnologia se associam para favorecer a adoção de técnicas conservacionistas, como o sistema de plantio direto.

Por meio dessa abordagem, facilita-se a absorção da água das chuvas e, como consequência, a recarga do aquífero Urucuia. Outros benefícios relacionados à técnica são o aumento da matéria orgânica no solo e do sequestro de carbono, e a redução dos processos erosivos.

A região oeste da Bahia tem uma área de 14 milhões de hectares. Destes, 9 milhões estão no bioma cerrado. Há 3,1 milhões de hectares consolidados, sendo 2,6 milhões destinados às atividades agrossilvipastoris. Em toda essa superfície, que abrange as bacias dos rios Grande, Corrente e Carinhanha, há apenas 200 mil hectares irrigados. Esse total, segundo pesquisas científicas, ainda está bem abaixo da média de outras regiões agrícolas tradicionais.

Vale lembrar que 92% da agricultura praticada no oeste da Bahia decorre em regime de sequeiro, modalidade que não incide no uso dos recursos hídricos superficiais ou subterrâneos.

Portanto, reportagem publicada pela Folha ("Sumiço da água do aquífero Urucuia, fonte do São Francisco, intriga cientistas", 20/11) traz uma visão rasa a respeito da diminuição do volume do aquífero. É lamentável que, ao citar informações de estudos sobre o Urucuia, não se pontue que os levantamentos analisam períodos distintos da série histórica.

Enquanto uma das pesquisas citadas observa os dados de 2002 a 2014, os trabalhos apoiados pela Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia analisam dados de 1980 a 2021, intervalo que inclui a seca pós-2015 na região.

O tema é tão importante a nós, produtores rurais, que demandamos estudos a pesquisadores da Universidade Federal de Viçosa (UFV) e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) para entendermos o comportamento e os fatores que influenciam na formação do reservatório. O Estudo do Potencial Hídrico do Oeste da Bahia, conduzido por cientistas de renome internacional, traz subsídios que permitem o aproveitamento das águas subterrâneas do Urucuia para a promoção do desenvolvimento econômico sem prejuízos ao reservatório ou às bacias hidrográficas da região.

Hidrólogos afirmam que o aquífero Urucuia está diminuindo e que os rios do oeste baiano estão secando - Dado Galdieri - 23.set.2021/Hilaea Media

Há também uma série de produções científicas que indicam as décadas de 1980 e 1990 como anos de chuvas acima da média histórica do oeste baiano. Os anos seguintes, por sua vez, foram de redução desses índices pluviométricos, inclusive por efeito de eventos como a Oscilação Multidecadal do Atlântico, fenômeno que faz as águas do Atlântico Norte aquecerem mais que as do Atlântico Sul e, com isso, acarretam a redução do regime de chuvas em todo o Nordeste brasileiro.

Para ir além de uma disputa midiática, importa que argumentos e contextos técnicos ganhem presença na discussão sobre o uso dos recursos hídricos na Bahia e no Brasil como um todo. Não há, por parte do agronegócio, vantagem em rivalizar com quem quer que seja. Pelo contrário, o principal interesse é fortalecer o diálogo com a sociedade e, com isso, garantir o desenvolvimento econômico sem abrir mão da preservação dos nossos mananciais.

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