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Rodrigo R. Soares

A economia brasileira deve melhorar em 2022? NÃO

Desmonte da responsabilidade fiscal amplia risco de crise grave

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Rodrigo R. Soares

Professor titular da Cátedra Fundação Lemann no Insper

De acordo com o Ibre-FGV, o PIB per capita cresceu 3,8% em 2021, alcançando um nível ainda 1% inferior àquele observado em 2019. Combinados com o mercado de trabalho desaquecido e a recente expansão da economia mundial, esses números sugeririam um forte crescimento do país neste ano que começa. No entanto, instituições de mercado preveem um crescimento abaixo de 1% para 2022.

As sementes dessa perspectiva desanimadora foram plantadas ao longo de 2021. Depois de um início de ano com expectativa de recuperação acelerada, previsões começaram a ser revistas repetidamente para baixo, particularmente quando ficou claro que a retomada da agenda de reformas era ilusória.

Terminamos o ano com recessão técnica, Bolsa de Valores com um dos piores desempenhos globais, taxa de câmbio com uma das maiores desvalorizações do mundo e inflação na casa dos dois dígitos. Isso tudo enquanto o planeta observava uma retomada vigorosa do crescimento.

O economista e professor Rodrigo R. Soares, da Cátedra Fundação Lemann no Insper - Folhapress

Instabilidade e incerteza dominam o cenário para 2022. O desmonte intencional das instituições de responsabilidade fiscal aumenta significativamente o risco de uma crise grave e do início de um retorno ao cenário dos anos 1980. O comportamento recente do Legislativo e do Executivo, enquanto demandas por indexação começam a se manifestar, sugere que essa possibilidade não pode ser descartada.

Além disso, as eleições presidenciais adicionam tempero ao caldo. A corrida eleitoral intensifica a pressão por medidas populistas, que, dada a incapacidade de resistência do Executivo, devem deteriorar ainda mais o quadro fiscal. A indefinição eleitoral, por sua vez, aumenta a incerteza em relação ao compromisso fiscal futuro.

Níveis elevados de instabilidade e incerteza política inibem investimentos de longo prazo. A perspectiva de uma política monetária apertada, função da própria instabilidade, tende também a reduzir as perspectivas de crescimento. A retomada paulatina da economia pode garantir algum crescimento no início de 2022, num cenário onde o impacto local da variante ômicron seja limitado e o esforço continuado de vacinação assegure a saída da pandemia. Mas esse crescimento refletiria muito mais uma recuperação cíclica, ainda buscando os níveis de atividade de 2019, do que uma tendência de longo prazo.

A possibilidade de retomada robusta do crescimento em 2022 depende agora de fatores externos ao Executivo e à própria economia doméstica. A promoção de uma agenda séria de reformas certamente contribuiria para a estabilização do cenário econômico. Mas a falta de compromisso do governo com a agenda de reformas sugere que essa possibilidade é inexistente (vide a perversão, promovida com apoio do governo, dos projetos das reformas administrativa e tributária). Portanto, mais uma vez ficamos a reboque dos efeitos da expansão mundial sobre os preços de commodities e reféns dos ventos políticos.

Se a economia mundial experimentar uma expansão acelerada no próximo ano, o Brasil será beneficiado. De modo semelhante, se a corrida eleitoral começar a se definir, com compromisso claro dos principais candidatos com a sustentabilidade fiscal, o cenário deve melhorar. Mas a influência final da economia global e do quadro eleitoral pode ser tanto positiva quanto negativa, tendo em vista o avanço da variante ômicron, a possibilidade de aperto monetário nos EUA e a indefinição eleitoral.

Contar com a sorte nunca é boa perspectiva econômica. No melhor dos casos, seguiremos como tem sido corriqueiro: na rabeira do crescimento mundial.

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