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Carlos Américo Pacheco e Guilherme Ary Plonski

Bye Dole, Bayh-Dole

Lei criada por senadores dos EUA inspirou políticas de inovação e tecnologia

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Carlos Américo Pacheco

Diretor-presidente da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo)

Guilherme Ary Plonski

Diretor do Instituto de Estudos Avançados da USP

A derradeira homenagem ao ex-senador republicano Robert (Bob) Dole, 98, ocorrida neste mês na Catedral Nacional de Washington, contou com a presença de dois presidentes democratas, Bill Clinton e Joe Biden.

Em seu tributo, o atual presidente, que foi colega de Dole no Senado, acentuou o caráter honrado do veterano da 2ª Guerra Mundial, na qual foi gravemente ferido, e que se tornou um ícone do Capitólio.

Extensos obituários foram veiculados pela grande imprensa, tanto a local como a de outros países (inclusive esta Folha), acentuando a vigorosa atuação política de Bob Dole, assim como as suas principais realizações ao longo de quase três décadas no Senado. Curiosamente, ficou faltando a menção a uma das suas mais impactantes e duradouras contribuições, a lei Bayh-Dole, de 1980, comumente referida como Bayh-Dole Act. Do que trata e qual a sua importância?

O então candidato republicano à Presidência dos EUA, Bob Dole, em comício em 1996 - Rick T. Wilking - 2.nov.1996/Reuters

Os EUA emergiram da 2ª Guerra como líderes em tecnologia global. Uma luz vermelha acendeu em 1957, quando a União Soviética lançou o Sputnik. Os americanos reagiram, multiplicando o seu orçamento para a pesquisa e criando instituições como a Nasa. Passados alguns anos, uma luz mais forte acendeu após o sucesso da Alemanha na indústria de bens de capital e, surpreendentemente, do Japão em semicondutores. Com uma base científica comparativamente frágil, o Japão desenvolvera um sistema manufatureiro que lhe deu a liderança na eletrônica de consumo e, depois, em memórias e computadores.

A avaliação dos papéis do governo japonês e da pesquisa colaborativa entre institutos públicos e a indústria influenciou a política norte-americana a buscar a superação do que ficou conhecido como "vale da morte". Incontáveis leis foram aprovadas nos EUA, a partir de 1980, com o objetivo explícito de incentivar a comercialização de tecnologias desenvolvidas em suas universidades e laboratórios nacionais. O pioneiro Bayh-Dole Act, fruto da iniciativa conjunta dos senadores Birch Bayh (democrata) e Bob Dole, foi a mais conhecida e influente. Ela concedia a titularidade das patentes de pesquisas financiadas pelo governo federal para as universidades e as encorajava a transferir essas tecnologias para a indústria.

O então presidente Bill Clinton concede a medalha da liberdade a Bob Dole, em 1997 - 17.jan.1997/Reuters


O Bayh-Dole Act inspirou a política de tecnologia e inovação de numerosos países. Não foi diferente no Brasil, embora tenham se passados 20 anos até que tenhamos proposto, na Conferência de Ciência, Tecnologia e Inovação de 2001, a nossa Lei de Inovação, finalmente aprovada em 2004. Ela não copia o Bayh-Dole Act, mas nele se inspirou. Valoriza a parceria público-privada para inovação, estimulando diferentes formas de articulação entre ciência e indústria. Assim como havia ocorrido nos EUA, levou à multiplicação dos Núcleos de Inovação Tecnológica (NITs) nas universidades e institutos de pesquisa, que hoje são 220.

​Nenhuma das duas leis foi capaz de sozinha mudar o panorama da inovação —lá ou aqui. Mas é legítimo afirmar que o Bayh-Dole Act abriu um caminho de incentivo à cooperação entre diferentes atores dos sistemas de inovação. Adentramos esse caminho com duas décadas de defasagem. Oxalá possamos, nos próximos anos, reduzir o tempo de resposta ao que acontece no mundo. Assim, encurtaremos também a distância que nos separa da fronteira da inovação.

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