Descrição de chapéu
Marco Antonio Carvalho Teixeira

É hora de repensar o modelo de escolha nos tribunais de contas

Não é razoável que sejam sete indicações políticas ante apenas duas técnicas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Marco Antonio Carvalho Teixeira

Cientista político, é doutor em ciências sociais pela PUC-SP e professor e coordenador do Mestrado Profissional em Gestão e Políticas Públicas da FGV-Eaesp

O Tribunal de Contas da União (TCU), assim como os demais tribunais de contas (TCs) estaduais e de municípios, são órgãos de Estado. As chamadas cortes de contas não pertencem a nenhum dos Poderes e desempenham o papel constitucional de fiscalizar os gastos e a integridade do patrimônio público em auxílio ao Poder Legislativo.

Tais instituições contam com um quadro de carreira altamente qualificado responsável pela realização de auditorias do uso do dinheiro público, emitindo pareceres técnicos para que seu corpo dirigente —ministros no TCU e conselheiros nos demais TCs— tome decisão definitiva, podendo inclusive contrariar recomendações advindas da fiscalização.

O senador Antonio Anastasia (PSD-MG), durante sabatina de indicados do Senado para o TCU (Tribunal de Contas da União) - Edilson Rodrigues/Agência Senado

O cargo de dirigente dos TCs é estratégico por pelo menos três razões. A primeira é de ordem política. São eles que podem oferecer munição para um processo de impeachment. Dilma Rousseff (PT) não teria sido cassada pelo Congresso Nacional caso o TCU não tivesse concluído que ela cometeu irregularidades fiscais. Ter uma boa relação com o colegiado de dirigentes dos tribunais de contas tem sido um instrumento de governabilidade.

A segunda, ainda de ordem política, tem a ver com o próprio Legislativo, de quem os tribunais de contas também são fiscais. Foram raros os momentos na história recente em que os TCs questionaram a gestão orçamentária das casas Legislativas.

A terceira interessa sobretudo ao ganhador do cargo. Ser ministro ou conselheiro implica ocupar uma função vitalícia, com garantias e vencimentos semelhantes aos mais altos cargos do Poder Judiciário, além de ter cargos e recursos à disposição.

Quais são os requisitos para se tornar dirigente de TCs? Ter ao menos 35 anos e não mais que 65, reputação ilibada e experiência na administração pública. Os dois últimos requisitos são passíveis de interpretação. Em 2014, a ONG Transparência Brasil revelou que, durante suas nomeações, alguns dirigentes respondiam processos por peculato e improbidade administrativa, dentre outros. Quanto à experiência, não se exige formação superior específica, analisa-se apenas a trajetória profissional.

Quem recruta tais dirigentes? Cabe ao Executivo indicar um terço (corresponde a 3 no TCU) e ao Legislativo dois terços (6 dos 9 membros do colegiado). Das três indicações do Executivo, uma é feita exclusivamente entre membros do Ministério Público de Contas (MPC) e outra dentre a carreira de ministros substitutos —a terceira é de livre escolha. Todos passam por sabatina no Senado e depois terão seus nomes submetidos ao plenário, como ocorreu recentemente com o mais novo ministro do Supremo, André Mendonça.

Na vaga que esteve em disputa no TCU coube ao Legislativo indicar o senador Antonio Anastasia (PSD-MG) como novo dirigente do órgão. O apoio do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), foi decisivo para a vitória de Anastasia e representou duas conquistas para ele. Demonstrou força ao derrotar o candidato do governo e, na vaga de Anastasia no Senado, assume alguém próximo —Alexandre Silveira (PSD-MG)—, que é diretor jurídico e funcionário da presidência da Casa.

Por que os TCs possuem um corpo dirigente predominantemente político? Tal situação já foi bem pior. Até a Constituição de 1988, todos eram indicados pelo Executivo, cabendo ao Legislativo sabatiná-los e se posicionar sobre a nomeação. A Carta avançou em dois sentidos. O primeiro foi o compartilhamento de indicações. O segundo foi a inclusão de carreiras técnicas aqui já mencionadas no colegiado dirigente dos TC.

Manter esse desbalanceamento de sete indicações políticas, ante apenas duas de carreiras técnicas, não parece adequado. Com a chegada de Anastasia, o colegiado do TCU mantém sua composição: três indicados pela Câmara dos Deputados, três pelo Senado, um ex-ministro indicado por Jair Bolsonaro e dois quadros técnicos, padrão seguido pelos demais 32 TCs.

A resposta em termos de reforma precisa ser dada pelo principal interessado no tema e também nos cargos: o Congresso Nacional. Existem PECs que tratam da revisão da composição do colegiado dos TCs, bem como do perfil de seus dirigentes que, inclusive, estão em condição de discussão no plenário. Falta apenas colocá-las em debate público. Entretanto, sem pressão social é praticamente impossível esperar que o Congresso, por iniciativa própria, possa alterar algo que representa um ativo político e de poder para seus membros.

TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.​

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.