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O que a Folha pensa Auxílio Brasil

Meios péssimos

Restrição orçamentária não vai sumir só porque teto de gastos foi dinamitado

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Filas para recadastramento no Auxílio Brasil, em Salvador - Mauro Akiin Nassor/Fotoarena/Agência O Globo

A boa notícia é que começou nesta sexta (10) o pagamento do auxílio de no mínimo R$ 400 às famílias brasileiras inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais que faziam jus ao extinto Bolsa Família. Para a grande maioria dos 14,5 milhões de beneficiários, isso equivalerá a um aumento em relação ao recebido em novembro.

Nada justificava deixar ao relento da carestia e à espreita da indigência tantos concidadãos altamente vulneráveis. Faz-se urgente, também, a incorporação nos pagamentos de mais 2,5 milhões de famílias na mesma situação de risco.

Se o fim é desejável e premente, os meios empregados por governantes e legisladores federais para atingi-lo foram desnecessários e deploráveis. Vão deixar sequelas.

Os efeitos nefastos dão-se a ver no cotidiano. A inflação ao consumidor galgou mais um degrau em novembro, foi a maior em seis anos e acumulou-se num índice já próximo de 11% em 12 meses. A soma que há um ano comprava 10 litros de gasolina agora só adquire 6,6.

A contrapartida da disparada de preços é a cavalgada dos juros básicos, que já desponta como a mais veloz em duas décadas. O alvo da taxa de curto prazo, determinado pelo Banco Central, passou a 9,25% ao ano e é certo que continuará a ser elevado nos próximos meses.

Os dois fatores —inflação e aperto no crédito— agem no sentido de frear a atividade econômica, que mal se recuperou do tombo da pandemia, num país com 13,5 milhões de pessoas que procuram um emprego, mas não encontram.

A desídia do presidente Jair Bolsonaro (PL) e da maioria dos congressistas com as contas públicas contribui decisivamente para a deterioração do horizonte econômico. A aparente mágica de fabricar dinheiro orçamentário reverte-se depressa na evaporação do poder de compra dos mais pobres e das oportunidades de crescimento.

O teto de gastos federais, atropelado, não inventou a restrição orçamentária. Apenas a expôs de modo que os representantes da sociedade pudessem escolher que despesas deveriam ser realizadas ou elevadas e quais deveriam ser reduzidas ou cortadas. Acabar com o teto, portanto, não vai solucionar o problema da escassez financeira.

As dívidas cristalizadas na Justiça, os precatórios, tampouco sumirão porque a Carta será emendada para dar calote em parte delas. O Supremo Tribunal Federal poderá declarar, com sólidos argumentos, inconstitucional a manobra.

Espera-se do próximo presidente e da próxima legislatura que despertem do mundo de fantasia e restituam, como bem intangível do cidadão brasileiro, a sobriedade orçamentária. Democracias maduras não fogem de seus impasses varrendo-os para debaixo do tapete.

editoriais@grupofolha.com.br

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