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Alberto do Amaral Júnior e Maria Paula Bertran

Os clubes do clima

Brasil deveria querer ser sócio de um deles, até porque não admitirão penetras

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Alberto do Amaral Júnior

Professor de direito internacional da Faculdade de Direito da USP e diretor executivo da Sociedade Latino-Americana de Direito Internacional

Maria Paula Bertran

Professora de direito econômico da Faculdade de Direito da USP de Ribeirão Preto, professora visitante na Stanford Law School (2020) e titular da Cátedra Fulbright em Democracia e Desenvolvimento Humano (2018)

Quando era ministro das Finanças da Alemanha, o agora chanceler Olaf Scholz anunciou que a União Europeia deve se engajar com outros países para acordarem regras comuns e padrões de conduta que os unam, "como uma espécie de clube, de pessoas que desejam fazer coisas semelhantes e não competir entre si, mas lutar por um melhor desenvolvimento climático do mundo".

A criação dos "clubes do clima" tende a permitir que os países efetivamente interessados em diminuir as emissões globais de carbono se coordenem com mais facilidade do que nos grandes acordos, envolvendo muitos países.

Um exemplo recente é a iniciativa para a diminuição de liberação de metano encabeçada por União Europeia e Estados Unidos. Outra possibilidade é a ampliação dos mecanismos de taxação de carbono na fronteira (em inglês, "Carbon Border Adjustment Mechanism - CBAM"). A União Europeia foi vanguardista e anunciou sua proposta em julho.

A ideia é precificar o carbono de produtos fabricados em países sem o devido cuidado com a emissão de carbono, mas destinados aos mercados que não toleram a frouxidão regulatória ambiental.

A lista europeia de produtos inclui ferro, aço, cimento, fertilizantes, alumínio e geração de eletricidade. A relação expõe produtos que geram muitos gases de efeito estufa e cuja fabricação poderia ser transferida para países com baixo comprometimento para diminuição de emissão de carbono. Traduz, também, a preocupação de evitar o que se chama de "vazamento" ou "fuga" do carbono, expressão que descreve a situação em que empresas mudam de países por razões de custos relacionados às políticas climáticas. A expectativa é que essa lista seja ampliada no futuro.

O Brasil, entre outros países, criticou o CBAM europeu. A leitura local é de que a tributação dos produtos a serem consumidos na União Europeia pode representar uma medida discriminatória, sem legitimidade internacional e violadora do princípio das responsabilidades comuns e diferenciadas estabelecido no Acordo de Paris. Nesse sentido, os clubes do clima podem ser lidos como grupos que concedem benefícios especiais a seus membros, em detrimento da neutralidade econômica dos não sócios.

Há um precedente ruim de 2012, ano em que a União Europeia estabeleceu diretiva exigindo que empresas de aviação comercial internacional, chegando ou partindo de um aeroporto da UE, cumprissem as obrigações decorrentes de seu sistema de comércio de emissões. À época, vários países não europeus reagiram, e a União Europeia foi obrigada a suspender sua diretiva.

Mas o contexto agora é outro. A urgência de medidas ambientais eficazes tende a fazer impotentes os argumentos clássicos de proteção comercial. Há expectativas de que a China aceite ser sócia regular de diferentes núcleos com propósitos ambientais.

Se a lógica de taxação de carbono na fronteira puder ser alargada para um "clube" maior, grande o bastante para impedir as vias tradicionais de escoamento da produção brasileira, o país será forçosamente obrigado a aderir a padrões mais rígidos de emissão de carbono.

Os clubes do clima não admitirão penetras.

TENDÊNCIAS / DEBATES
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