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BC acerta ao não tergiversar sobre a inflação, mas há mais fatores a considerar

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Sede do Banco Central, em Brasília l - Marcello Casal Jr./Agência Brasil

Com um comunicado incisivo, o Banco Central subiu novamente a taxa básica de juros em 1,5 ponto percentual, para 9,25% ao ano. A preocupação com os repetidos ataques às contas públicas e a renitente tendência altista das expectativas de inflação foram as justificativas, mesmo num contexto de clara desaceleração econômica.

A contundência da autoridade monetária não pode ser considerada extemporânea, pois o quadro de fato é preocupante. As projeções para o IPCA chegam a 10,2% neste ano e 4,7% em 2022, muito acima da meta de 3,5% —o cenário utilizado pelo BC considera que a taxa Selic subirá até 11,75%, caindo a 11,25% no final do próximo ano.

Mesmo que não se chegue a tanto, já está configurado o maior aperto monetário em mais de duas décadas, considerando a variação em pontos percentuais, o que reforça os riscos recessivos adiante.

Os sinais de piora na atividade já são evidentes. No terceiro trimestre, o Produto Interno Bruto caiu 0,1%, e as expectativas mais comuns entre analistas de mercado já apontam para crescimento abaixo de 1% em 2022, o que não exclui projeções de retração.

Diante da absoluta incúria do governo Jair Bolsonaro, que patrocina uma farra com dinheiro público com objetivos eleitorais, o país se vê com poucos instrumentos para conter as pressões de preços e retorna aos juros escorchantes.

A piora na gestão do Orçamento, resultante da aprovação da proposta de emenda constitucional que altera o teto de gastos e dá um calote nas dívidas judiciais, é o que eleva as expectativas de inflação.

Com mecanismos de indexação operantes como sempre, os repasses aos preços tendem a ser rápidos e persistentes, dificultando a tarefa de trazer o IPCA de volta à meta.

Há atenuantes, por certo. Nas últimas semanas houve queda das cotações de commodities. O índice de preços no atacado recuou 0,6% em novembro, e tal dinâmica poderá em breve chegar ao varejo.

Outros fatores são a desaceleração da demanda, que poderá conter altas nos serviços e outros itens. Por fim, há possibilidade de algum arrefecimento em combustíveis e energia, dois vilões no ano.

São sinais incipientes de que o BC poderá em breve retomar o controle da inflação, o que recomenda cautela nas próximas deliberações. Com a Selic próxima dos dois dígitos, menos dinamismo interno e possível acomodação global da demanda por matérias-primas e bens de consumo, é preciso dar mais peso à letargia da atividade.

Ancorar as expectativas em torno das metas é fundamental, mas a esta altura também se mostra relevante considerar os impactos da desaceleração do crescimento econômico na evolução dos preços.

editoriais@grupofolha.com.br

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