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Violência oculta

Pandemia dificulta denúncias e embaralha dados escassos sobre agressão à mulher

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Em Belém, Milena (nome fictício), 20, conta como se casou com 14 anos com um homem de mais de 22 - Mathilde Missioneiro/Folhapress

Todos os dias, centenas de brasileiras entram para as estatísticas de casos que são comuns mesmo subnotificados —os de mulheres submetidas a diferentes expressões da violência de gênero.

Especialistas consideram tais episódios hiperendêmicos no país, tomando emprestada a definição aplicada a doenças persistentes e de alta incidência.

São agressões psicológicas, físicas, sexuais, que acontecem também dentro das casas das vítimas, motivadas ou agravadas por sua condição feminina. Algumas delas assim foram descritas nesta Folha com a série de documentários e reportagens Gênero: Feminino.

Há poucos dados, por exemplo, sobre adolescentes e mulheres aliciadas por traficantes para fins de exploração sexual. O medo de retaliação se soma à baixa integração das informações coletadas por diferentes órgãos públicos e à própria dificuldade das vítimas de identificarem esse tipo de violência.

Também é complexo dimensionar o índice de brasileiras envolvidas em casamento infantil (quando uma das partes tem menos de 18 anos, sendo que as meninas são 94% dos registros). Sabe-se que os casos conhecidos colocam o Brasil num vergonhoso quinto lugar no ranking mundial, atrás de Índia, Bangladesh, Nigéria e Etiópia.

A tragédia sanitária provocada pela pandemia contribuiu para isolar parcela importante dessas vítimas, que deixaram a escola e o trabalho presencial, ficaram ainda mais distantes de delegacias e conviveram intensamente com seus agressores dentro de casa.

De acordo com uma pesquisa realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública com o Datafolha, 1 em cada 4 brasileiras diz ter sofrido algum episódio de violência (física, sexual, psicológica ou verbal) no primeiro ano da Covid.

Ainda assim, os dados mais recentes da entidade mostram uma queda nas ocorrências de agressão doméstica —o que se atribui à maior dificuldade de denunciar.

Por uma articulação de questões sociais e culturais, que fazem com que as meninas sejam consideradas propriedade dos pais, por exemplo, em várias regiões do país muitas vítimas têm dificuldade para enxergar a ilegalidade do que vivem.

Acabam submetidas a violências repetidas e silenciadas, nas mãos de pais, padrastos, maridos, tios, avós, primos, namorados, médicos e desconhecidos. Reconhecer a própria dor na dor de outras é uma saída possível para identificar e denunciar as agressões e tentar alterar esse cenário hostil.

editoriais@grupofolha.com.br

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