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Marcelo Kfoury Muinhos

A política de preços dos combustíveis deve mudar? NÃO

Tentar controlar preços isoladamente sempre deu errado, aqui e em todo lugar

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Marcelo Kfoury Muinhos

Doutor em economia pela Cornell University (EUA), é professor de macroeconomia da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV/Eesp)

Mudar a política de preços dos combustíveis é um retrocesso em vários aspectos. Seria subsidiar o consumo de um produto altamente poluente —e também é regressivo, pois dá o mesmo benefício ao pobre e ao rico que tem o seu carrão, além de desobedecer à sinalização dos preços, que mostram que há escassez dessa commodity em nível mundial.

O aumento do petróleo internacional ao longo de 2021 foi de cerca de 60%, sinalizando que há problemas derivados dos efeitos provocados pela Covid-19, por questões geopolíticas e em razão da rápida mudança da matriz energética para gás natural na Europa. Não obedecer a tal sinalização é erro de política econômica —mais comum às vésperas de eleições.

O aumento do preço do petróleo, quando traduzido em reais, foi ainda maior. As commodities energéticas foram elevadas em mais de 70%, segundo o IC-Br energia, série do Banco Central. No Brasil, no ano passado, a alta da gasolina atingiu 47,49%, e do botijão de gás, 36,99%.

Se a política de preços rompe a paridade do preço da gasolina doméstica com a internacional, a Petrobras incorre em prejuízo, pois compra derivados a preços internacionais, dado não conseguir atender toda a demanda doméstica pela característica do petróleo que produz. No governo Dilma Rousseff (PT), essa paridade foi violada e quase houve quebra da Petrobras. Desde então, se essa paridade não for mantida, há a necessidade de subsídio direto à empresa. Por isso, discute-se diminuir os impostos cobrados no consumo de combustível. É crucial afirmar que dar subsídio ou diminuir impostos é exatamente a mesma coisa, sendo nos dois casos péssimas ideias de política fiscal. Seria usar dinheiro dos pagadores de impostos para subsidiar os consumidores de gasolina, em vez de gastar dinheiro com educação e saúde.

Se for para revisar impostos, isso deve ser feito na reforma tributária, não de uma maneira casuística e eleitoreira em apenas um setor.

A ideia de que diminuir o preço da gasolina combaterá a inflação também é equivocada. Há uma sinalização mundial de que o petróleo ficou mais caro, isso é uma mudança de preços relativos. Mudança de preços relativos, por si só, não gera processo inflacionário —este acontece se o choque passar para todos os outros preços. Para evitar que isso ocorra, já temos o Banco Central subindo os juros. Essa é a receita mundial para combater a inflação —e não tentar controlar preços isolados, política essa que sempre deu errado aqui e em todo lugar em que foi tentada.

Outro ponto falacioso é defender controlar o preço do diesel por causa dos caminhoneiros. Também não faz sentido. Isso é custo que deveria ser repassado para o frete. Se não está acontecendo, é porque há excesso de oferta no setor, que provavelmente se deveu aos empréstimos com juros negativos que o BNDES fez há alguns anos para a renovação de frota.

O que poderia ter amenizado o aumento da gasolina no ano passado era o câmbio. Em geral, quando há aumento das commodities, o real se fortalece, devido ao Brasil ser exportador desses produtos. Porém, houve ainda depreciação do câmbio de cerca de 9% em 2021. A piora da perspectiva fiscal com os vazamentos ao teto de gastos impediu a apreciação do câmbio. Toda a discussão sobre o Orçamento e como seria pago o Auxílio Brasil minou a credibilidade da política fiscal, provocando saída de recursos. Na verdade, em janeiro, a gasolina baixou de preço no IPCA, mesmo com o petróleo subindo lá fora, o que pode ter ocorrido devido à apreciação recente do real.

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