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Erika Hilton

'Gente é pra brilhar, não pra morrer de fome'

Insegurança alimentar exige das gestões públicas políticas permanentes

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Erika Hilton

Vereadora (PSOL-SP) e presidenta da Comissão Extraordinária de Direitos Humanos e Cidadania da Câmara Municipal de São Paulo

Quando seu Robson, um senhor de quase 70 anos, se acorrentou ao portão da Câmara Municipal de São Paulo e anunciou uma greve de fome, demonstrou a revolta daqueles que tentam diminuir o sofrimento de quem não tem o que comer. Naquele momento, o presidente do Movimento Estadual da População em Situação de Rua protestava contra o corte no programa Cozinha Cidadã, que distribuía 10 mil marmitas por dia. Era mais que evidente que a cidade precisava de uma política permanente de combate à fome.

A conversão do projeto 465/21, que institui o Fundo Municipal de Combate à Fome, em lei é uma conquista dos movimentos sociais e do povo de rua. O projeto de minha autoria, que teve pedidos de coautoria de colegas vereadores e foi aprovado por unanimidade, é inédito e histórico, pois crava no orçamento da maior cidade da América Latina a obrigação desta e de futuras administrações de terem políticas concretas de combate à fome.

A vereadora Erika Hilton (PSOL) na Câmara Municipal de São Paulo - Nelson Almeida - 25.nov.20/AFP

É urgente e necessário, pois vivemos um aumento da pobreza e insegurança alimentar —não só em São Paulo, mas em todo o Brasil. Os recursos do fundo devem ser empregados exclusivamente em programas e ações de garantia à alimentação adequada, ações de proteção à criança e ao adolescente e de incentivo à agricultura familiar.

Combater a fome é prioridade. Essa construção começa com a audiência pública "Quem tem fome, tem pressa: políticas de segurança alimentar na cidade de São Paulo", em abril de 2021, organizada pela Comissão Extraordinária de Direitos Humanos e Cidadania, a qual presido. Dali, surgiu a criação do Observatório Contra a Fome da Cidade de São Paulo.

Meses depois, em julho, o PL 465/21 foi elaborado, como parte de um conjunto de iniciativas inspiradas na trajetória da escritora Carolina Maria de Jesus —mulher negra, migrante, favelada, que enfrentou a fome e a miséria. Em seu livro mais famoso "Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada", Carolina registrou: "No dia 13 de maio de 1958 eu lutava contra a escravatura atual: a fome!".

O relato de Carolina continua atual. Dados recentes da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) mostram que a insegurança alimentar moderada afeta 11,5% dos lares brasileiros e que 9% deles são afetados por insegurança alimentar grave. Um outro estudo, da Rede PenSSAN, destacou que o direito humano à alimentação adequada está em risco em quase metade dos domicílios brasileiros (44,8%) desde o início da pandemia de Covid-19. Some-se a isso o aumento da população de rua, que passou dos 31 mil, de acordo com o censo divulgado recentemente.

Garantir comida para todas essas pessoas é proporcionar um direito básico e o mínimo de humanização, para que a partir daí possamos lutar por uma efetiva cidadania. Afinal, como cantou Caetano Veloso, "gente é pra brilhar, não pra morrer de fome".

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