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Ocidente na mira

Aliança Xi-Putin tem limites, mas sinaliza desgaste da ordem pós-Guerra Fria

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O presidente da Rússia, Vladimir Putin, e o líder da China, Xi Jinping, em Pequim - Alexei Druzhinin/AFP

Em relações internacionais, estabelecer grandes marcos de eras é um esporte fútil e, usualmente, dado a imprecisões. Isso dito, a sexta-feira passada (4) tem chances de ingressar na história como um ponto de inflexão formal do período que sucedeu a Guerra Fria.

Aquele conflito, iniciado dos escombros da Segunda Guerra Mundial pela disputa entre Estados Unidos e União Soviética, acabou na prática com a ascensão de Mikhail Gorbatchov ao Kremlin em 1985.

Oficialmente, contudo, foi no Natal de 1991 que o império soviético deu seu último suspiro. De lá para cá, houve uma história com diversas fases da dominância do Ocidente vitorioso na contenda, com Washington à sua frente.

Claro, houve desafios de diversas ordens, como o 11 de Setembro e suas guerras ou a crise de 2008, mas até aqui essa foi uma canção entoada por seus vencedores.

A formalização da aliança entre Xi Jinping e Vladimir Putin contra os narradores ocidentais da história, ocorrida sexta em Pequim, apresenta considerável potencial de influir nessa linha do tempo.

É, antes de tudo, uma resposta à percebida prepotência americana, em momento de declínio relativo da influência política de um país cada vez mais esfacelado entre facções internas rivais.

Há também ressentimentos em jogo, principalmente em Moscou.

Os russos dizem que, em vez de terem sido aceitos como iguais pelos EUA após 1991, foram espoliados na farra liberal que quebrou os restos do seu país nos anos 1990 e tiveram suas áreas de contenção geopolítica tomadas a partir dos 2000, com a expansão a leste da Otan, o braço armado ocidental.

Já os chineses buscam ser reconhecidos como atores políticos de quilate proporcional a seu peso econômico, o segundo maior do mundo, fruto de uma parceria com o mesmo Ocidente que hoje teme a musculatura asiática.

Há, por certo, limitações à aliança entre Putin e Xi, de resto ironicamente baseada em um discurso libertário de soberania e multilateralismo —que não se aplicam às suas audiências domésticas, claro.

Não se antevê ainda uma aliança militar, dadas as desconfianças mútuas entre países historicamente rivais e com largas fronteiras. O gigantismo econômico chinês, ademais, faz o Kremlin temer a ideia de virar uma província energética de Pequim —um sócio minoritário.

A ditadura chinesa também não tem ainda como suplantar a Europa como mercado principal da Rússia, e há fatores culturais em jogo.

Ainda assim, a possibilidade de cooperação contra interesses de um Ocidente dividido, seja na Ucrânia ou em Taiwan, coloca o arranjo sino-russo no centro da moldagem deste pedaço do século 21.

editoriais@grupofolha.com.br

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