Descrição de chapéu
Sofia Débora Levy

'Solução final': 80 anos sem eufemismo

Conhecendo a história é que podemos combater o negacionismo e o revisionismo histórico

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Sofia Débora Levy

Representante para a Memória do Holocausto do Congresso Judaico Latino-Americano e diretora do Memorial às Vítimas do Holocausto do Rio de Janeiro

Evitar saber a verdade detalhada de uma situação brutal, de violação da dignidade humana, é uma reação que se repete como fuga de contato com o horror. Não seria diferente com a história do Holocausto, que a data de "Yom HaShoah", Dia de Lembrança do Holocausto, hoje nos conduz ao dever de retransmitir para que possamos nos posicionar com força e clareza contra as barbáries perpetradas pelos nazistas.

Ocorrido há 80 anos, 1942 foi marcado com episódios hediondos pela frieza institucional com que foram executados —a começar pela Conferência de Wannsee, em 20 de janeiro, que estabeleceu a "solução final", expressão eufemista para designar o extermínio em massa dos judeus. Em outras palavras: matar o maior número de pessoas no menor espaço de tempo. Aos judeus, se seguiriam os ciganos. Com isso, em março, Auschwitz passou de campo de concentração a campo de extermínio, com a abertura de Birkenau, onde cerca de 1,5 milhão de pessoas foram assassinadas.

Ainda em março, no âmbito da "solução final", foi implementada a "Operação Reinhard", outro eufemismo, alusivo a um dos organizadores da "solução final" e utilizado para não despertar reações em contrário, pois visava exterminar mais de 2 milhões de judeus e dezenas de milhares de ciganos. Para tanto, no território polonês ocupado pelos nazistas, foram construídos os campos de Belzec, Sobibor e Treblinka exclusivamente para extermínio. Eles começaram a funcionar respectivamente em março, maio e julho de 1942. Os deportados eram levados abarrotados em trens de carga, sem saber para onde seguiam, e assassinados em fuzilamentos e câmaras de gás logo ao chegar.

Na Bélgica, um decreto publicado no dia 27 de maio tornava obrigatório o uso da estrela de David amarela pelos judeus a partir de 7 de junho, para assim facilitar sua identificação, humilhação e prisão nas ruas para posterior deportação.

Nos dias 16 e 17 de julho, a "rafle du Vel d’Hiv" foi o maior aprisionamento em massa dos judeus na França durante o Holocausto. Confinados no Vélodrome d’Hiver (velódromo de inverno) de Paris, cerca de 13 mil judeus morreram por falta de alimento e higiene em quatro dias. Os que sobreviveram foram deportados para Auschwitz.

Em 5 de agosto, o médico e pedagogo judeu polonês Janusz Korczak foi deportado para Treblinka com as crianças do orfanato que manteve, com muita dificuldade, no confinamento forçado dos judeus no gueto de Varsóvia. No dia de uma das "Kinderaktions", ações de deportação em massa de crianças do gueto, mesmo com a opção de se salvar, por seu trabalho internacionalmente reconhecido em prol dos direitos das crianças, Korczak não abandonou seus órfãos e seguiu com eles nos trens para o já sabido final.

Para os que não foram atingidos pelos inúmeros traumas individuais e coletivos infligidos pelos nazistas a milhões de pessoas ao longo de 12 anos, é grande a dificuldade de conceber o grau com que o mal aplicado legalmente pelo governo nazista banalizou as estruturas democráticas europeias.

Mas conhecendo a história é que podemos combater o negacionismo e o revisionismo histórico, que só servem aos interesses de quem intenta reproduzir preconceitos e discriminações e, com isso, desestabilizar as sociedades democráticas. Não conseguirão.

TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.