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Daniel Todtmann Montandon

As dark kitchens devem ter regulamentação própria? NÃO

Externalidades podem e devem ser sanadas com a adequada aplicação da lei

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Daniel Todtmann Montandon

Arquiteto, é mestre e doutor em planejamento urbano e regional (FAU-USP) e diretor de Arquitetura, Urbanismo e Design e professor colaborador do programa de pós-graduação em Cidades Inteligentes e Sustentáveis da Uninove; ex-coordenador da elaboração da lei de zoneamento (2016)

As cozinhas para delivery (nome mais adequado ao que se atribuiu "dark kitchen") surgiram recentemente na cidade de São Paulo, no período da pandemia, como empreendimentos voltados à produção e entrega de refeições na moradia dos paulistanos. Afinal, quem não quer que um pedido chegue rápido e quente à sua casa?

Do ponto de vista da regulação urbana, as cozinhas para delivery são totalmente compatíveis com o Plano Diretor Estratégico (PDE; lei municipal 16.050/14) e com o zoneamento (lei 16.402/16), pois tais normas incentivam a mescla de usos nos bairros, buscando aproximar a moradia dos serviços e também dos empregos.

E, para fazer com que essa mistura de usos ocorra de forma harmônica, a legislação existente já definiu um conjunto de regras que estabelecem limites e controle das incomodidades que podem ser geradas em relação à vizinhança.

Hoje, para aprovação de um empreendimento de cozinhas para delivery, é necessário adotar pelo menos os seguintes procedimentos e obedecer às seguintes regras que constam da lei de zoneamento e de diversos decretos regulamentadores (além de outras normas a serem observadas, como o Código de Obras e Edificações):

1 - Para a construção da edificação, é necessário solicitar alvará de aprovação e execução da obra, observando todos os parâmetros de parcelamento, uso e ocupação dos lotes que constam da lei de zoneamento;

2 - A atividade "cozinhas para delivery" pode ser enquadrada em dois grupos de atividade, conforme o porte: nR1-1 (comércio de abastecimento de âmbito local com dimensão de até 500 m2 de área construída computável) ou nR2-3 (comércio de abastecimento de médio porte, com dimensão de mais de 500 m2 até 2.000 m2 de área construída computável);

3 - A partir do enquadramento feito, devem ser observadas as condições de instalação dos usos: vagas para veículos, vagas para bicicletas, espaço de carga e descarga, vestiário para usuários de bicicleta, largura da via etc. Por exemplo, devem ser previstos espaços internos para estacionamento das motocicletas dos entregadores;

4 - Após a obra realizada, devem ser providenciados os equipamentos e instalações do sistema de segurança e solicitado o AVCB (Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros) e também deve ser solicitada uma licença de funcionamento para a atividade de administração das cozinhas e uma licença para cada empresa se instalar numa cozinha individual;

5 - É no pedido da licença de funcionamento que são avaliados os parâmetros de incomodidade e solicitada solução técnica para o atendimento da legislação pertinente e das normas técnicas aplicáveis para fins de controle de ruído, vibração associada, radiação, odores, gases, vapores e material particulado;

6 - Também deve ser solicitada a licença junto à Vigilância Sanitária.

Como se vê, a legislação urbanística já dispõe de elementos suficientes para proporcionar o adequado controle das cozinhas para delivery, dispensando a elaboração de regulamentação específica. As eventuais externalidades negativas geradas em alguns empreendimentos já realizados podem (e devem) ser sanadas com a adequada aplicação da lei e das regras já existentes.

Inclusive sobre esse aspecto, é importante ainda esclarecer que a legislação vigente dispensou as cozinhas para delivery da elaboração do Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) e do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) justamente porque não possuem o porte necessário para tal exigência.

Enfim, a cidade de São Paulo não precisa de mais leis e de mais burocracia para aquilo que já está suficientemente regulamentado.

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