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Emanuel de Melo

Procuradores e suas responsabilidades diante de uma tentativa de golpe

Atuação dos membros do MPF pode balancear eventual inércia da cúpula

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Emanuel de Melo

Procurador da República e professor na UERN (Universidade do Estado do Rio Grande do Norte)

Quase diariamente o Brasil vivencia ameaças de golpe de Estado proferidas por parte do presidente da República, sendo as mais recentes relacionadas ao armamento da população como instrumento para uma pretensa proteção da democracia diante de uma alegada fraude eleitoral.

As insinuações cada vez mais graves alertam para a possibilidade de que algo semelhante à invasão do Capitólio nos Estados Unidos, ocorrida em 6 de janeiro de 2021, também aconteça no Brasil, despertando a atenção do próprio Tribunal Superior Eleitoral a partir de preocupações externadas pelo ministro Edson Fachin, presidente da corte.

Diante desse cenário, muitos indagam o que as instituições podem e devem fazer para evitar a concretização de tais crimes contra o Estado democrático de Direito, bem como promover a respectiva responsabilização daqueles que busquem subverter a democracia.

O Ministério Público Federal (MPF) é um dos atores importantes nesse contexto, já que, por expressa disposição constitucional, tem como missão funcional a defesa do regime democrático. No entanto, o debate público normalmente concentra-se no papel do chefe de tal instituição, o procurador-geral da República (PGR), circunstância que auxilia na invisibilização da responsabilidade dos agentes que devem atuar diante de possíveis atos difusos contra a ordem democrática —os procuradores da República.

Espalhados pelo Brasil, muitos dos 851 procuradores possuem atribuições cíveis cumuladas com atuação penal nas diversas procuradorias espalhadas pelos municípios, os quais podem muito bem serem palco de atos de violência autoritária por parte de parcela de polícias, milícias ou grupos civis armados, todos "empoderados" por eventual discurso oficial.

Se há diversos argumentos apontando para omissões por parte do procurador-geral quando diante de interesses sensíveis do presidente da República, tem-se uma necessidade ainda maior de se relembrar acerca da grave responsabilidade dos demais membros do Ministério Público Federal, cuja atuação pode, pelo menos, balancear eventual inércia da cúpula.

Essa análise difusa em torno da atuação funcional é pragmaticamente interessante, pois, ao não se concentrar unicamente na chefia da instituição, realça a considerável quantidade de procuradores capazes de atuar —mesmo diante da possível aceitação do autoritarismo por parte de alguns.

É importante consignar que já há experiência institucional no tema, pois o MPF na Bahia denunciara o ex-policial militar Marco Prisco e outros agentes no contexto do motim efetivado em 2012, no qual a sede da Assembleia Legislativa daquele estado fora ocupada, impedindo o funcionamento do Poder Legislativo, conduta então tipificada como crime na Lei de Segurança Nacional e hoje prevista como crime contra o Estado democrático de Direito.

O que se espera é que, caso seja necessário, tal precedente institucional seja também adotado por parte dos diversos procuradores da República atuantes pelo Brasil, eis que omissão em cenário no qual está em jogo o próprio regime democrático comporia grave traição constitucional.

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