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Alexandre Nigri

A crise mundial e a desglobalização

Cresce o temor de um distúrbio financeiro nos EUA

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Alexandre Nigri

Economista e administrador de empresas com especialização no mercado imobiliário, é CEO do Grupo Maxinvest e ex-professor do curso de finance & real estate da pós-graduação do Ibmec

A maioria dos analistas de Wall Street tem a percepção de que algo muito errado está prestes a acontecer na economia norte-americana.

Jamie Dimon, CEO do JPMorgan Chase, o maior banco dos Estados Unidos, veio a público há algumas semanas dizer que "um furacão está chegando" naquele mercado. O mítico gestor de "hedge funds" (fundos de investimento de alto risco) e investidor Jeremy Grantham, que previu duas das últimas bolhas, também vem professando um distúrbio financeiro.


Dimon e Grantham, além de outros importantes nomes, como Larry Summers (ex-secretário do Tesouro americano) e o lendário bilionário e investidor Ray Dalio, formam uma corrente uníssona que bate bumbo ao defender o fato de que uma abrupta correção nos preços de ativos, como ações e títulos, pode acontecer a qualquer momento —e inclusive se estender para o mercado imobiliário. Tudo isso em razão de um processo que entendemos como "desglobalização".

Sabemos que a bonança mundial, logo após a revolução chinesa de Mao Tse Tung, entre 1949 e 1976, veio das altas taxas de industrialização dos tigres asiáticos a custo de mão de obra barata e êxodo rural. Algumas décadas mais tarde, entre 2005 e 2016, os salários por hora na indústria da China triplicariam.

A ascensão de classe do trabalhador asiático, combinada à política compulsória de fertilidade chinesa, levou a uma diminuição da oferta de trabalho não especializada. Recentemente, ainda como agravante, tivemos o incremento do custo do frete diante da guerra entre Rússia e Ucrânia.


Mas tais eventos ainda não resultam por si só no fator desglobalização, que vinha despercebidamente tomando a economia global como um novo paradigma de comércio internacional e que culminou com a pandemia e a guerra na quebra das cadeias de produção, reposicionando assim a nova lógica industrial e do protecionismo.

Nos últimos anos, é fundamental observar o excesso de liquidez pelo expansionismo fiscal dos governos e dos bancos centrais enquanto agentes econômicos, principalmente pelos americanos e europeus, considerando o pandemônio vivido na crise do subprime, em 2008.

Grantham, em entrevistas recentes, tem sido enfático ao dizer que, nos últimos quatro anos, nenhum presidente do Fed (o banco central dos EUA), incluindo o atual, Jerome Powell, foi suficientemente cauteloso em sua política de contenção monetária. O megainvestidor demonstra que, por essa razão, o índice de mercado Russel 2000, que mede as 2.000 maiores empresas americanas, já apresentava queda de 25% do pico de suas cotações em novembro de 2021, o que denota uma defasagem real dos ativos em relação a Standard & Poor’s e ao Dow Jones.


Em fevereiro de 2019, em um artigo que escrevi e cujo título era "A iminente crise econômica americana", mencionei sobre esse mesmo expansionismo fiscal, do exagerado corte de impostos no sistema e das barreiras migratórias que trariam escassez e inflação de mão de obra. Já em abril de 2020, no ápice da pandemia que começara em janeiro, o governo americano envidaria em um processo jamais visto de injeção de trilhões de dólares na economia (flexibilização quantitativa) —que até arrefeceu a crise naquele momento, mas que procrastinaria o problema, hoje agravado por incremento de inflação e desvalorização cambial.

Importante dizer que até pouco tempo atrás os juros eram menores que 0,25%, o que produziria um impacto pequeno sobre a dívida do governo norte-americano.


Por último, vale refletir que, enquanto analistas falam de alta esperada da FFR (a selic americana) de até 3%, é importante que nós, brasileiros, sejamos cuidadosos com nossas perspectivas. Há exatos 40 anos, o então presidente do Fed, Paul Volcker, elevou o FFR a 20%. O efeito foi desastroso para países do terceiro mundo e levou Brasil e México, por exemplo, a uma crise econômica e consequente moratória.

Não se espera, desta vez, tal furacão por aqui. Somos hoje uma economia mais forte e mais estruturada do que éramos no passado —mas, definitivamente, são tempos desafiadores.

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