Descrição de chapéu

O carioca precisa ser estudado

Os detalhes que identificam o carioquismo raiz

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Foi uma cena esquisita para a minha prima, que mora em Goiânia e passava uns dias no Rio. "Tinha um cara só de sunga na fila da farmácia". Pensei na hora: era um cariocão roots. Como eu sei? Porque só o carioca passeia seminu pela cidade assim. E aposto um chope (o garotinho, por favor, para não esquentar) como ele levava uma nota de uns 20 reais amarrada no cordão do calção. Mais nada. Por mais estranho que possa parecer, este é um ser muito comum por aqui.

Bloco Prata Preta desfila no Rio de Janeiro. Alerta aos turistas: nunca chamar de bloquinho - Tércio Teixeira - 23.abr.22/Folhapress

Curioso é que com as mulheres o mesmo raciocínio não se aplica. Se estiver só de biquíni fora da água ou da faixa de areia, é batata: carioca não é. Por quê? Não sei. Descarto a hipótese de puritanismo, já que saímos praticamente peladas nos blocos de carnaval. Aliás, promete que quando estiver no Rio nunca mais vai falar ‘bloquinho’? A gente acha bizarro esse diminutivo. É mais ou menos como o nosso "rolé" no "rolê" de São Paulo. Minha cidade, minhas regras.

Ficar só de biquíni no calçadão talvez seja a atitude mais bandeirosa possível para quem quer se passar por local no Rio (a gente fala só Rio mesmo, raramente Rio de Janeiro, com nome e sobrenome). Torço para que essa dica preciosa faça parte do repertório de "How to be a Carioca", série do Star+ já filmada, mas ainda sem data de estreia. É uma adaptação do best-seller de mesmo nome lançado no início dos anos 1990, e tem Seu Jorge como protagonista —cá pra nós, difícil imaginar uma escalação mais certeira.

O livro foi escrito pela americana Priscilla Ann Gosling, a gringa que entendeu o espirito da coisa como ninguém, tanto que conseguiu captar minúcias do nosso comportamento como a clássica ajeitada no biquíni antes do mergulho e até aquela jogadinha da cabeça para trás e para a frente ao sair do mar, para ajeitar o cabelo. "Três vezes", ela ensina, com toda propriedade, ao ditar a fórmula para evitar o aspecto boi-lambeu. Gênia.

Ah, sim. É verdade: não paparicamos artistas. São gente como a gente, brother. Sem caô. Juro que há uns dez anos alguém ouviu um "Lá vem aquele chato do Vincent Cassel de novo", numa mesa do Baixo Gávea, quando o astro francês passou uma longa temporada por aqui. Cassel, na real, é o que chamamos de "um querido". Todo mundo gosta dele, foi só uma piada.

Nós levamos cadeira de praia para onde sabemos que vai ter fila, comemos o "cuscuz da larica" oferecido em tom de voz baixinho e sedutor nos arredores do Posto 9, mas temos resistência àqueles camarões fritos, lindos e cheirosos que nos oferecem nas areias. "É atestado de turista", diz o agitador cultural William Vorhees —o cara tão malandramente carioca que foi contratado pela HBO em 2012 para ser o "consultor de carioquice" de uma série que se passava em Ipanema. Sim, consultor de carioquice.

Entendeu agora?

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.