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Ricardo Sayeg

A saída temporária de presos deve ser revista? SIM

Enfraqueceu-se demasiadamente a resposta penal sem contrapartida efetiva

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Ricardo Sayeg

Professor livre-docente e doutor em direito, é presidente da Comissão Nacional Cristã de Direitos Humanos do Fenasp (Fórum Evangélico Nacional de Ação Social e Política)

O crime, ato individual de abuso de liberdade humana, é o maior inimigo dos direitos humanos. Basta ver que não temos na cidade de São Paulo o direito de andar a pé tranquilamente, com razoável segurança e paz.

No necessário combate ao crime, sempre conforme a Constituição Federal e dentro da lei, a resposta é a pena, sendo reservada para os delitos graves a restrição da liberdade, conhecida socialmente como prisão.

Lembrando-se sempre que o juiz é um magistrado, não um carrasco, devendo atuar conforme a Constituição e dentro da lei, a punição dos criminosos é, convenhamos, um instrumento de efetivação dos direitos humanos, tanto que é comum se testemunhar a sua militância exigindo a punição de pessoas.

Em decorrência, a pena de prisão deve concretamente significar a resposta penal quanto ao crime grave que vier a ser cometido; e também, simultaneamente, como a pessoa humana não é descartável, um meio de ressocialização.

É dessa forma que o criminoso condenado por crime grave, sob a perspectiva do direito da vítima e da sociedade, pode ir para a prisão, ser encarcerado; porém, por outro lado, o apenado tem legítimos direitos que asseguram sua dignidade e ressocialização.

O encarceramento, conquanto seja a resposta social reservada ao crime grave, não pode aviltar a dignidade do preso e deve manter-se de tal modo que o leve a ressocializar-se.

É inadmissível constatar que o sistema prisional brasileiro se encontra em "estado de coisas inconstitucional", como declarado pelo nosso Supremo Tribunal Federal.

A prisão não é apenas para punir: é também para reincluir; daí porque o preso é chamado de reeducando.
Nesse jogo de pesos e contrapesos emerge como direito do preso a saída temporária, mais conhecida como "saidinha". Então, a "saidinha" é direito do preso fundado no propósito de sua ressocialização, sendo razoável dar-se um voto de confiança em razão da dignidade que é inerente a toda pessoa humana.

Entretanto, a saída temporária não pode representar o enfraquecimento da resposta penal, o que violaria os direitos humanos da vítima e da sociedade como um todo, devendo haver um juízo de ponderação consoante à proporcionalidade e razoabilidade.

Do jeito que está, a lei, em tese, permite a saída temporária quatro vezes ao ano e em favor também do reincidente. A prática demonstrou que a legislação foi leniente e não funcionou porque enfraqueceu demasiadamente a resposta penal sem uma contrapartida efetiva de resultados de ressocialização.

A população reclama, e com certa razão, porque é fato que os criminosos saem da cadeia no meio do cumprimento da pena nessas "saidinhas" e praticam crimes, muitos deles violentos, como roubos e latrocínios.

Foi nesse cenário que o Senado Federal deu início ao processo legislativo e aprovou projeto de lei reduzindo a saída temporária a uma vez por ano, reservando-a a presos sentenciados que sejam primários. Todavia, devolvendo o projeto de lei ao Senado, a Câmara dos Deputados aprovou o fim da saída temporária.

Ora, por conta de todo o exposto, a sociedade civil, através de sua representação parlamentar, pode sim rever a saída temporária para assegurar a firmeza e a efetividade da resposta penal. No entanto, bani-la totalmente, desprezando a dignidade do preso e o objetivo de ressocialização, me parece excessivo. Recrudesceria demais.

É por isso que a versão aprovada pelo Senado é a mais apropriada e em consonância com os direitos humanos, levando-se todos os fatores em consideração: o preso, a vítima e as pessoas da sociedade civil.

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