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A inteligência artificial (IA), como qualquer outra novidade tecnológica, é sedutora. Tem um imenso potencial de transformação de nossas vidas em todas suas dimensões. Em um futuro ideal, poderá nos ajudar a combater as mudanças climáticas, encontrar a cura para doenças, aumentar nossa eficiência agrícola e energética e viajar pelo espaço. Mas a IA não é o milagre que muitos vendem. É, antes de tudo, o produto de dezenas de anos de esforço coletivo ao redor do mundo. Ela é a soma dos erros e acertos que nos definem como sociedade.
O avanço das tecnologias de IA e sua aplicação em nosso cotidiano já é uma realidade há alguns anos. Ela está presente nos algoritmos que sustentam nossas redes sociais, que escolhem os produtos e os conteúdos que nos são apresentados com base em nosso histórico de comportamento. Está presente no catálogo de filmes, na oferta de notícias, nos sistemas de fronteira e migração. Está no sistema financeiro, nos veículos autônomos e nos equipamentos de segurança e defesa.
Com o avanço tão rápido impulsionado pela competição econômica, é fácil entender como os efeitos do uso de IA não foram exaustivamente estudados pela indústria, pelo comércio e pelos governos para garantir a nossa proteção de efeitos indesejáveis.
Alguns casos são notórios e revelam paradigmas que estão ocorrendo ao redor do mundo. Multiplicam-se denúncias de vieses raciais em algoritmo de reconhecimento facial aplicados sob a justificativa do aumento de segurança. Empréstimos, vistos e seguros são negados com base em uma visão distorcida sobre o histórico de grupos sociais. E as chamadas fake news se multiplicam sob o pretexto da liberdade de expressão.
É por isso que a regulação da IA é urgente. Não com o objetivo de criar impedimentos para o desenvolvimento econômico, mas para garantir a sua sustentabilidade e a proteção dos nossos direitos individuais e coletivos.
É preciso aprender com as experiências locais e traduzi-las em termos universais para que possam ser compartilhadas através de fronteiras. O treinamento correto da IA passa pelo despertar de uma consciência coletiva. Pesquisar e desenvolver IA para o interesse público revela-se imperativo, uma vez que as consequências são coletivas.
O interesse público necessita que as tecnologias de IA sejam projetadas, implantadas e regulamentadas a partir de uma abordagem interdisciplinar responsável e equitativa; e que sejam explicitamente consideradas as experiências de grupos historicamente alvos e negligenciados por essas e outras tecnologias.
Nesse sentido, a solução para esses desafios não está em uma abordagem focada no desenvolvimento de tecnologia para o bem, mas em sempre perguntar "em benefício de quem?"; além da questão crítica preliminar sobre se de fato há necessidade de se utilizar IA em determinado contexto.
O processo legislativo brasileiro deve levar em consideração a diversidade e os valores locais, em complemento ao debate internacional, e que veja na IA uma ferramenta de inclusão e promoção dos direitos humanos.
Gustavo Macedo
Pesquisador da InnSciD SP (Escola Avançada de Diplomacia Científica e da Inovação)
Ana Luísa Moraes, Lutiana Barbosa e Viviane Grossi
Defensoras públicas federais
Fernanda Carvalho
Doutoranda em direito (UFMG)
* Subscrevem este artigo os membros do Grupo de Pesquisa em Ética, Direitos Humanos e Inteligência Artificial (EDHIA) da Escola Nacional de Defensoria Pública da União (ENADPU)
TENDÊNCIAS / DEBATES
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