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O que a Folha pensa

Jô Soares

Multiartista soube unir a comédia de costumes e a crítica política para divertir e fazer o Brasil pensar

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Jô Soares no cenário do programa de entrevistas que apresentou durante anos na TV Globo. - Zé Paulo Cardeal/TV Globo/AFP

"Seu talento é tão vasto quanto sua circunferência", disse certa vez o crítico de teatro Décio de Almeida Prado sobre José Eugênio Soares, o Jô, cuja morte nesta sexta (5), aos 84 anos, entristece o Brasil.

A brincadeira com o tipo físico era endossada, como se sabe, pelo próprio artista, numa atitude de autoironia que sublinhava seu senso de humor sofisticado e irresistível.

Do teatro ao cinema, passando pela literatura, pelas artes plásticas e pela crônica jornalística, Jô Soares se projetou durante um ciclo marcante da história brasileira, que vai do final da década de 1950 à redemocratização dos anos 1980.

Do Brasil das chanchadas, da bossa nova, de Pelé e da construção de Brasília até o Brasil que lutou para se reconciliar com suas aspirações democráticas após os anos difíceis da ditadura militar.

Ao longo desse período, a televisão absorveu parte da tradição dos programas de rádio e do teatro e adquiriu inédito protagonismo no campo da comunicação social.

Na vida cotidiana, sobretudo por meio das novelas, dos programas musicais e dos humorísticos, a TV funcionou como uma espécie de arena comunitária, ponto de encontro no qual se encenava uma determinada sociabilidade brasileira —com sua graça, suas crueldades e seus conflitos.

Jô Soares, assim como seu brilhante colega Chico Anysio (1931-2012), teve papel relevante na criação de uma afiada galeria de tipos que, com bordões e características variadas, divertiam gente de todas as classes e grupos sociais.

Em seus programas, a crítica de costumes e a crítica política caminhavam juntas, muitas vezes driblando restrições, estabelecendo um padrão de humor a um só tempo popular e refinado, que talvez não tenha encontrado herdeiros.

O multiartista se notabilizou, ainda, por ser um pioneiro do talk show no Brasil, gênero que importou da televisão americana e transformou em enorme sucesso, após ter abandonado a carreira de humorista. Também suas entrevistas, que marcaram época, reuniam um vasto mosaico de interesses e personagens.

Os contornos daquele país em que Jô Soares brilhou já se dissolviam muito antes de sua morte, nesses tempos de novos desencontros, novas demandas e novos embates. Sua contribuição, contudo, para o entretenimento, o diálogo e a cultura no Brasil permanecerá viva com o amplo reconhecimento que fez por merecer.

editoriais@grupofolha.com.br ​ ​

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