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José Carlos Dias e Ivo Herzog

Os presidenciáveis e os direitos humanos

Atentem para a desumanidade que consome o país

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José Carlos Dias

Presidente da Comissão Arns e ex-ministro da Justiça (1999-2000, governo FHC)

Ivo Herzog

Presidente do conselho do Instituto Vladimir Herzog

A tragédia brasileira tem origem certa e sabida. A fome, a violência, o discurso do ódio, jogando uns contra os outros, e a insensibilidade social que vitimiza e pune os mais frágeis, brotam da mesma raiz: o descaso do Estado brasileiro com os direitos humanos. Autoridades que aí estão não compreenderam que democracia é sinônimo de assegurar e aperfeiçoar os direitos da pessoa humana. E, por não terem compreendido o óbvio, atiram nossa gente aos sofrimentos mais atrozes. Nossa tragédia tem a ver com governantes que desprezam a vida, o bem-estar e a felicidade das pessoas.

Ao nos aproximarmos das eleições gerais de outubro, precisamos ter olhos para a grande desumanidade que consome o país. Por isso, a Comissão Arns e o Instituto Vladimir Herzog se unem para alertar o espírito da nação. Estamos lançando neste domingo (7) a nossa "Carta Aberta a Candidatas e Candidatos à Presidência da República" para que inscrevam, no alto de seus programas de governo, e com o conhecimento público, os princípios e as bandeiras que norteiam os direitos humanos. Sem isso, não haverá democracia. Não haverá justiça. Não haverá paz.

A carta, cujo conteúdo está disponível nos sites das duas entidades (comissaoarns.org/pt-br e vladimirherzog.org), começa por exortar a realização pacífica de eleições livres, o respeito à legislação e às urnas eletrônicas, ao mesmo tempo em que repudia qualquer tentativa golpista de ruptura democrática. A hora é de afirmar, em cada programa e em cada voto, o fortalecimento dos direitos humanos como base segura da nossa democracia.

Esses direitos fundamentam a nossa ordem constitucional. Na carta aberta, lembramos que a melhor forma de celebrar o bicentenário da Independência será "reafirmar, por meio de palavras e ações, a adesão incondicional aos princípios republicanos e democráticos que embasam a Constituição de 1988".

Propomos, nessa linha, a implementação das diretrizes dos Planos Nacionais de Direitos Humanos, bem como de todas as recomendações do relatório final da Comissão Nacional da Verdade (CNV), "cujo trabalho legou à sociedade brasileira o esclarecimento de graves violações ocorridas durante a ditadura".

Exigimos que o Estado assuma o enfrentamento ao racismo, não só um problema estrutural, mas chaga aberta na sociedade, através da qual vazam o preconceito, a discriminação e a permissão para matar gente trabalhadora e pobre, como se vê em sucessivas chacinas. Quantas vidas negras ainda serão necessárias para saciar tanta desumanidade? Essa pergunta não pode ser ignorada por aqueles que almejam a Presidência da República.

Cobramos de candidatas e candidatos o compromisso com os direitos dos povos originários, indígenas, quilombolas e ribeirinhos, na defesa de suas terras e modos de vida, com a impugnação definitiva do marco temporal, uma tese jurídica não só descabida como profundamente injusta.

Propomos que os direitos humanos figurem na base curricular das escolas para semear entre nós a cultura da paz e não o discurso de ódio com que se tenta capturar os nossos jovens. Não nos esqueçamos dos grupos LGBTQIA+, alvos da intolerância e da discriminação, cuja dignidade é aviltada a cada dia. A eles, o nosso respeito e reconhecimento.

Direitos humanos são tão diversos quanto diversa é a própria sociedade. Em cada pessoa, cabe a humanidade. Em cada biografia anônima, encontra-se o universo. Por isso, em nome do legado de dom Paulo Evaristo Arns e de Vladimir Herzog, conclamamos os postulantes à Presidência da República a firmar esse compromisso central. Enquanto instituições dedicadas à causa, cumprimos aqui a nossa missão com a responsabilidade social que nos cabe. Esperamos que candidatas e candidatos façam o mesmo.

Superar a tragédia brasileira depende da decisão que tomaremos nas urnas. Que as eleições de 2022 sejam as eleições dos direitos humanos.

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