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O que a Folha pensa datafolha

Política envenenada

É preocupante cenário em que cidadãos deixam o debate de lado por medo de reação virulenta

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Broches do presidente Jair Bolsonaro (PL) e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à venda no Rio de Janeiro. - Ricardo Moraes/Reuters

Vai mal a política brasileira. Segundo o Datafolha, 49% dos eleitores no país deixaram de debatê-la com familiares e amigos para evitar que uma conversa tranquila se transforme em colérica discussão.

E não se diga que a atitude brota do vazio ou, o que dá no mesmo, do puro preconceito. Entre os entrevistados, 54% disseram já ter vivido nos últimos meses algum episódio de constrangimento, intimidação verbal ou ameaça física em razão de suas posições políticas.

Mesmo quem não enfrentou esse tipo de situação conhece motivos para temê-la. Não faz nem um mês que um militante petista foi assassinado por um bolsonarista, num crime precedido por gritos como "aqui é Bolsonaro" e "Lula ladrão".

Trata-se de caso extremo, e felizmente o único a chegar tão longe na escala da tragédia. Mas houve outros que, se não tiveram a mesma violência, também contribuem para certo recato que passou a encobrir as convicções políticas.

Para não ir longe nos exemplos, lembre-se que, dias antes do homicídio de um petista, um ato com a presença do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no Rio de Janeiro foi alvo de um artefato explosivo.

O clima radioativo em torno da política, contudo, não decorre apenas desses episódios. De maneira difusa, um radicalismo crescente acompanha discordâncias programáticas e preferências partidárias em toda parte, não só no Brasil.

Segundo especialistas que estudam crises de democracias, as redes sociais têm sua parcela de culpa no acirramento de ânimos.

Por meio de mecanismos diversos, mas sobretudo pelo estímulo às opiniões veementes, essas gigantes da tecnologia fomentam uma lógica de ressonância entre iguais e firme rejeição aos diferentes.

Transposto para a vida real, o ambiente das redes se traduz no oposto da política —em vez da discussão saudável sobre os rumos da cidade, do estado ou do país, tem-se a fúria facciosa dos que não aprenderam a conviver com a divergência.

A isso se soma a presença de Jair Bolsonaro (PL) na Presidência. O político que já incentivou seguidores a, nas suas palavras, "fuzilar a petralhada", é o maior divulgador da visão tacanha segundo a qual adversários políticos são inimigos.

Quando debater política deixa de ser normal e se torna um problema, a cidadania se retrai e o sectarismo se insinua no tecido social —um cenário que só interessa a quem não dispõe de bons argumentos para convencer a população.

editoriais@grupofolha.com.br

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