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Risco paternalista

Na campanha, poder de censura de juízes eleitorais deve ser usado com parcimônia

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O ministro Alexandre de Moraes, que presidirá o TSE na campanha - Foto: Carlos Moura/SCO/STF.

Ante a agenda autoritária do presidente da República, ressalta-se no pleito deste ano a principal virtude do sistema de votação brasileiro, a de ser conduzido pelo Tribunal Superior Eleitoral —um árbitro nacional, constitutivamente neutro e distanciado das tarefas de governar e aprovar as leis.

Já entre os aspectos desafiadores desse modelo está o padrão excessivo das intervenções da Justiça nas liberdades de partidos e eleitores.

O labirinto de restrições e minudências parte da própria legislação e se acentua pela atuação dos juízes, dentro da prática pouco moderna de considerar o eleitor alguém hipossuficiente, a ser protegido das artimanhas dos candidatos.

A campanha começa oficialmente apenas nesta terça-feira (16), mas o TSE já proibiu a veiculação de vídeos porque considerou que continham pedidos de votos antes do período permitido, utilizavam termos ofensivos, faziam conexões indevidas ou valiam-se de canais oficiais para elogiar o combate federal à Covid-19.

Se depender da Procuradoria que atua na corte, vai para o índex dos vídeos proibidos a investida infame do presidente Jair Bolsonaro (PL) contra o sistema eleitoral brasileiro diante de embaixadores estrangeiros. Essa documentação histórica de um dos pontos mais baixos já atingidos pela diplomacia nacional jamais deveria ser apagada.

Sob o impacto da máquina de falsificações e ameaças catapultada pelas redes sociais e manejada com gozo pelo bolsonarismo, que com ela alvejou autoridades judiciárias, o maior resguardo dos magistrados neste pleito é compreensível.

Ampliou-se o escopo hermenêutico dos juízes eleitorais, que terão o poder de suspender o compartilhamento e a veiculação de fatos "sabidamente inverídicos". Esse dispositivo, contudo, deveria ser utilizado com parcimônia.

Será mais efetivo e justo se for reduzido aos casos em que a concretude verificável dos acontecimentos não permitir a menor dúvida sobre tratar-se de uma inverdade. Se ultrapassar essas fronteiras para interpretações mais abstratas, vai cercear o debate político.

A eleição também tem um caráter de batalha encenada que, paradoxalmente, ajuda a suprimir a violência real na disputa do poder. Linguagem agressiva, críticas severas, promessas impossíveis e mentiras, desde que não criminosas, integram o seu repertório comum.

Do entrechoque entre ataques e contra-ataques no plano do discurso se forja parte da matéria que ajuda os eleitores a decidirem o voto.

Não cabe, afinal, a magistrados o papel de árbitros de fato da eleição. Esse poder exercem dezenas de milhões de cidadãos responsáveis e capazes de fazer as suas escolhas em meio à algazarra cívica.

editoriais@grupofolha.com.br

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