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Fernando Augusto Fernandes

Judiciário também pode evitar prisões desnecessárias

Distorções da Lei de Drogas podem ser minoradas com habeas corpus

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Fernando Augusto Fernandes

Advogado, doutor em ciências políticas (UFF) e mestre em criminologia e direito penal (Ucam) é autor de “Geopolítica da Intervenção” (Geração Editorial)

Esta Folha publicou o artigo "Carta ao novo presidente" (6/11), que abordou o número de encarcerados no Brasil (quase 1 milhão) e o fato de que um terço do total se relaciona à Lei de Drogas (lei 11.343/2006).

O tema é relevante, sem dúvida. Contudo, é preciso apontar que, entre os autores do texto, excepcionais humanistas, há dois ministros do Superior Tribunal de Justiça, dois desembargadores e dois juízes. Como apontam, o uso de entorpecentes não tem mais previsão de pena, mas as forças policiais alteram a tipificação do flagrante, autuando usuários como traficantes.

Lei de drogas ajudou a acelerar encarceramento no Brasil, segundo especialistas - Marlene Bergamo/Folhapress

Não podemos esquecer que o Ministério Público segue tais distorções e promove denúncias. E juízes as recebem, condenam e mantêm os réus presos. O papel não está, neste momento, com o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas nos tribunais superiores, que devem ampliar a concessão de liminares de habeas corpus e de ordens monocráticas —além de enquadrarem as distorções do sistema de Justiça que o jurista argentino Eugenio Raúl Zaffaroni chama de "criminalização secundária".

O tema é relevante, mas a missão de Lula agora é levar arroz, feijão e carne ao prato dos brasileiros e preparar o Brasil à prosperidade para todos.

Quanto à segurança pública, temos outros temas necessários; enquanto isso, o próprio Judiciário pode conter os abusos.

O Brasil registrou 47.503 homicídios em 2021, ou 130 assassinatos por dia. Levantamento mostra que há cerca de 4,4 milhões de armas de fogo em mãos de civis. Dessas, 1,5 milhão estão em circulação irregular em decorrência da campanha do governo Jair Bolsonaro (PL). Nesse ponto, o futuro presidente deve revogar os decretos armamentistas.

O Instituto Sou da Paz revelou que apenas 37% dos homicídios cometidos no Brasil em 2019 foram solucionados. Em 2022, esse índice cresceu para 44%. A média mundial, contudo, é de 63%.

A lei 13.964/2019 criou o Banco Nacional de Perfis Genéticos e o Banco Nacional Multibiométrico e de Impressões Digitais —este precisa entrar em vigor logo. Mas de nada servem esses dados se não forem integrados e usados para a solução de homicídios e estupros.

A Polícia Federal precisa ser estruturada para além das operações midiáticas, de forma a centralizar todos os dados de crimes violentos do país. É preciso estabelecer protocolos para cenas de crime. Não só condenados devem ser cadastrados, mas agentes do Estado e cidadãos.

É necessário que a atribuição para as investigações de homicídios sejam concorrentes, passando em um inquérito digital em 100% do território pelas polícias estaduais, acompanhadas pela PF. Quantos assassinos em série temos? Homicídios cometidos em mais de um estado e contra os direitos humanos devem ser federalizados.

Afinal, é preciso, sim, evitar prisões desnecessárias. E muitas delas podem ser impedidas pelo próprio Judiciário. Precisamos efetivar a investigação e a detenção de criminosos violentos. Aqui pode Lula estruturar a PF para esse combate, e o legislador conservador eleito apoiar a defesa da vida e de nossos filhos.

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