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Benito Salomão

O encaminhamento da questão fiscal

Para acalmar fiscalistas empedernidos, Lula deverá sinalizar com nova regra

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Benito Salomão

Doutor em economia (UFU)

Com o processo de transição de governo em curso, ganha relevância agora o encaminhamento da questão fiscal, dado o teor das promessas realizadas durante a campanha.

Em artigo publicado nesta Folha ("Os limites eleitorais do déficit público", 3/9), argumentei, com base em revisão da literatura empírica mais recente, que o manuseio eleitoral de expansões fiscais não seria suficiente para eleger o incumbente Jair Bolsonaro (PL). O alerta vale também para o governo que começará a partir de 2023, de forma que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) será tão mais bem-sucedido em seu terceiro mandato quanto mais capaz for de conciliar agenda social com responsabilidade fiscal.

A boa notícia é que responsabilidade social e fiscal não são agendas antagônicas. Lula foi eleito prometendo aumentar o salário mínimo e manter o valor de R$ 600 para o Auxílio Brasil, além de ampliar o benefício em R$ 200 para famílias com crianças de até seis anos. Todas as agendas com elevado impacto fiscal. Para encaminhá-las, além de outras promessas que irão demandar recursos, o governo está negociando com o Congresso mudanças no Orçamento de 2023, o que pode ser alvo de críticas de setores mais fiscalistas da opinião pública.

É importante salientar, no entanto, que o equilíbrio fiscal é um problema de otimização dinâmica. Ou seja: em modelos macroeconômicos dinâmicos, uma expansão fiscal de curto prazo das despesas públicas, a fim de fazer face a algumas necessidades, pode não ter efeitos duradouros no tempo e, portanto, não comprometer a sustentabilidade fiscal de longo prazo.

Nesses modelos, agentes formam expectativas acerca do comportamento futuro da economia. Se eles creem que uma expansão fiscal terá efeitos duradouros, passam a projetar juros e impostos mais altos, tomando posições defensivas quanto a consumo e investimento. Se, por outro lado, o governo é crível e sinaliza que a expansão fiscal estará contida em um momento do tempo, isso estimula a confiança dos agentes, que passam a cooperar com o governo em suas decisões de consumo e investimento.

Para que os fiscalistas empedernidos sejam convencidos de que o plano social de Lula não irá impor custos fiscais de longo prazo, o novo governo deverá sinalizar com uma nova regra. O teto de gastos foi a regra fiscal vigente até 2021, quando morreu após a PEC dos Precatórios. Isso custou uma sensível piora do ambiente macroeconômico brasileiro, com juros e inflação altas, além de câmbio depreciado.

Uma nova regra fiscal —sinalizada já na transição e com foco na contenção do gasto obrigatório a partir de 2024 (independentemente dos detalhes técnicos)— pode ser o ingrediente que falta para que Lula ponha em prática suas promessas de campanha, ganhando confiança, acomodando expectativas e permitindo a queda dos juros e da inflação, além do fortalecimento do real.

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