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Vinicius Sassine

Generais aceitam comandos como puxadinho de golpistas e validam atos por silêncio ou indiretas

Ocupação da porta de quartéis, com pedidos de intervenção, revela pouco apreço à democracia por militares

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Manaus

O general Achilles Furlan Neto aceitou que a fachada principal da entrada de seu comando, onde antes estavam visíveis as letras garrafais do Comando Militar da Amazônia, fosse tomada por lonas pretas e azuis, por caixas de isopor improvisadas como prateleiras e lotadas de suprimentos e por fogões industriais.

Uma ampla cozinha foi improvisada na calçada. Um reservatório de água garante o cozimento de alimentos. Um cano leva a água suja para a rua. Sacos com lixo são empilhados todos os dias, o que provoca mau cheiro. Mais fétidos são os dez banheiros químicos rentes à mureta da unidade militar, numa avenida movimentada de Manaus.

 Entrada principal do Comando Militar da Amazônia obstruída por manifestantes e cadeiras de praia
Entrada principal do Comando Militar da Amazônia obstruída por manifestantes e cadeiras de praia, em Manaus - Vinicius Sassine/Folhapress

O comando, ao qual estão vinculados 20 mil militares, admitiu ainda 57 barracas, 20 carros estacionados na calçada, cones bloqueando uma faixa da avenida e a presença de manifestantes –com suas cadeiras de praia dispostas bem na frente da entrada principal– interditando o fluxo. Eles passam os dias entoando hinos militares e louvores.

O ato golpista –salpicado por paranoia e informações falsas na tela do celular– já dura um mês. É protagonizado por eleitores de um derrotado Jair Bolsonaro (PL), que pedem intervenção das Forças Armadas. A cena se repete nos principais comandos e batalhões do Exército país afora.

Fachada principal do Comando Militar da Amazônia tomada por lonas, caixas de isopor e material para cozinha improvisada
Fachada principal do Comando Militar da Amazônia tomada por lonas, caixas de isopor e material para cozinha improvisada, em Manaus - Vinicius Sassine/Folhapress

O ânimo golpista só perdura porque existe conivência por parte dos militares em posições de comando, especialmente no Exército. E essa conivência produz situações insólitas, como no Comando Militar da Amazônia, onde a Justiça Federal desistiu de se fazer presente em razão do bloqueio da entrada central –as tratativas passaram a ser virtuais.

A legitimação a esses atos ocorre pela inação. Ou por recados e dubiedades expressos em textos mal escritos, como a nota "às instituições e ao povo brasileiro" dos comandantes das três Forças, divulgada no dia 11, num tom de aceitação do golpismo inerente a essas manifestações.

Militares em posição de comando se acostumaram à comunicação por entrelinhas e indiretas. Tanto que nem percebem que, após quatro anos de alinhamento ao bolsonarismo e de politização dos quartéis, já não há sutileza nas mensagens.

A correia de transmissão dessas mensagens inclui generais da reserva desimportantes, como Braga Netto, o vice de Bolsonaro também derrotado nas urnas, e Villas Bôas, o ex-comandante que ganhou um cargo e uma agenda vazia no Palácio do Planalto.

Os atos na frente de quartéis revelam muito mais do que delírio. Eles explicitam o pouco apreço de militares à democracia e às regras do jogo, o alinhamento ideológico a Bolsonaro, o apego a benesses e a insistência em interferir numa harmonia mínima entre os poderes.

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