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Felipe Michel Braga

A reforma do ensino médio deve ser mantida? SIM

Há avanços, mas processo é longo e devemos resistir à tentação de retrocesso

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Felipe Michel Braga

Servidor público, é mestre em educação e presidente do Conselho Estadual de Educação de Minas Gerais; vice-presidente do Foncede - Região Sudeste (Fórum Nacional dos Conselhos Estaduais e Distrital de Educação), associado fundador da organização D³e e membro do Movimento pela Base

O "novo" ensino médio está na metade do primeiro ciclo de implementação (2022-24). Há evidências de que a direção está certa, com esforços já realizados por todas as unidades da Federação e resultados parciais.

Além disso, a mudança estrutural no ensino médio e o impacto da pandemia têm pesado mais sobre populações mais vulneráveis, e é essencial evitar os vieses de comportamento dos educadores e os vícios acumulados pelo sistema, marcado por desigualdades históricas de acesso e permanência. Por isso mesmo, é preciso resistir à tentação de ruptura ou de retrocesso. O sucesso depende de uma gestão da mudança, um processo sequencial de etapas e muita disciplina.

Professora do Colégio Novo Pátio, no bairro de Santana, em São Paulo, fala com alunos do terceiro ano do ensino médio sobre educação sexual - Jardiel Carvalho - 14.jun.22/Folhapress

Gestão da mudança. Os maiores problemas da implementação são a incompleta transição da mentalidade e a escassez de recursos. Estabelecer com os estudantes os seus projetos de vida, pensando nas suas trajetórias secundárias e pós-secundárias, de forma autônoma e diversificada, é algo inédito no país. Há ainda gargalos na formação inicial e continuada dos professores, na estrutura física e no parque tecnológico das escolas, na enturmação dos estudantes, na merenda, no transporte escolar, no uso do Enem como vestibular... Porque tudo fora pensado para atender o já obsoleto "velho" ensino médio. A reorganização exige grande investimento financeiro e acúmulo de conhecimento, ainda insuficientes. A experiência internacional, por exemplo, demonstra que reformas educacionais levam vários anos para se consolidar.

É um processo sequencial de etapas. No estudo "Implementação de reformas no ensino médio: experiências internacionais e aprendizados para o Brasil", da associação D³e, foram apreciadas as reformas desse nível de ensino no Chile, em Portugal e na Província de Ontário (Canadá). Os casos inspiram sobre o que fazer e o que não fazer, enquanto demonstram que as reformas são realizadas em processos, em fases.

A pesquisa sugere que o ensino médio funciona melhor quando há financiamento, o estudante é o centro da ação educativa, a formação continuada está presente, a orientação nacional acompanha as soluções locais e há muita atenção para a inclusão e equidade. Nenhum desses elementos é inédito. Todos são fundamentais e requerem monitoramento e ajustes.

Requer muita disciplina. Estamos falando de todas as redes de ensino reaprendendo a funcionar a partir de novos paradigmas, no contexto da crise política da última década. É mais complexo do que revogar uma lei. Os secretários estaduais de Educação são inequívocos quanto à necessidade de continuidade da política, cientes da sua importância, pois são responsáveis por atender em torno de 85% dos estudantes dessa etapa no país. Mais de 70% dos brasileiros com mais de 16 anos aprovam as principais diretrizes, a escolha dos itinerários e o novo currículo, segundo pesquisa recente do Sesi e Senai. Nas escolas, não há uma resistência cristalizada às mudanças, e a implementação da nova proposta depende da liderança dos gestores escolares, que estão se envolvendo e participando, como aponta pesquisa em desenvolvimento pela Universidade Federal de Juiz de Fora.

Os resultados, embora promissores, ainda são insatisfatórios, mas voltar com um ensino médio fracassado —que não entregou universalização do acesso, aprendizagem adequada, maior empregabilidade e empreendedorismo de jovens, nem satisfação ou felicidade para os estudantes— não pode ser a solução. A reforma do ensino médio deve avançar, com resiliência e criticidade, para melhorar de fato a educação que as juventudes do Brasil estão recebendo e, com protagonismo, têm o dever e o direito de construírem.

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