11 de Setembro dos leitores teve limusine, festa de aniversário e dramas familiares

Relatos enviados à Folha frisam vazio de informações e incredulidade sobre atentados terroristas

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Americana (SP)

É um filme? Uma brincadeira de mau gosto? Só pode ser replay esse (outro) avião se chocando contra o prédio.

A incredulidade e o vazio de informações, em uma era em que a internet ainda engatinhava, predominam nos relatos dos leitores sobre o 11 de Setembro, que completa agora 20 anos.

A pedido da Folha, eles contaram onde estavam, o que faziam e como reagiram quando o maior atentado terrorista da história aconteceu.

Muitos temeram o início de uma Terceira Guerra Mudial e choraram. Alguns perderam amigos. Tinha gente fazendo aniversário. Outros viviam, paralelamente, intensos dramas familiares. Para a maioria, nomes e expressões como Talibã, Al Qaeda e "guerra ao terror" só então passaram a fazer parte de seus vocabulários.

Pessoas visitam o Empty Sky Memorial em Nova Jersey - Kena Betancur - 30.jul/France Presse

Naquele dia de 2001, terroristas ligados à Al Qaeda sequestram quatro aviões comerciais. Dois deles se chocaram contra as Torres Gêmeas do World Trade Center, em Nova York; o primeiro, às 8h46, e o segundo, às 9h03. O terceiro colidiu contra o Pentágono, em Arlington, Virgínia, nos arredores de Washington. Já o quarto avião caiu em um campo aberto próximo de Shanksville, na Pensilvânia.

Cerca de 3.000 pessoas morreram nos ataques.

"Exatamente há 20 anos estava na recepção de um Hospital do Câncer na capital capixaba, e uma pequena TV estava noticiando o ataque terrorista. Na verdade, imaginei somente um prédio em chamas até a colisão do segundo avião. Fiquei atordoado, e as pessoas não entendiam o acontecimento", contou Josias Barcelos Júnior, 40, procurador do município de São Paulo.

"Enquanto isso, no quarto do hospital, havia outro 11 de Setembro: a minha mãe identificou uma metástase no pulmão, após um longo tratamento do câncer de mama, falecendo meses depois. Assim, não há como dissociar esses fatídicos acontecimentos."​

Entre os leitores da região de Campinas, no interior de SP, muitos associaram o 11 de Setembro a uma notícia de grande impacto local: o assassinato do prefeito Toninho do PT, na véspera.

O jornalista aposentado Edmilson Siqueira, 70, havia chegado em casa às 4h30, depois de trabalhar na cobertura excepcional do crime pelo jornal Correio Popular.

"Um amigo ligou, por volta das 10h, querendo falar comigo. A mulher explicou porque eu estava dormindo e ele, então, pediu para ela ligar a TV e gravar o que estavam passando, para eu poder ver depois. Ela ligou e, quando viu, foi me acordar", contou ele.

"Foi assim que vi o terror assassinar inocentes, menos de 12 horas depois de viver o assassinato imbecil de um prefeito: com uma xícara de café na mão e os olhos arregalados de espanto, dor e raiva."

Leia a seguir uma seleção dentre os 131 relatos recebidos. Obrigado a todos pela participação.

Eu estava em uma academia. De repente, todos nós paramos de fazer exercícios e ficamos colados na TV, vendo tudo ao vivo. Desligaram a música que sempre tocava em volume alto e fez-se um silêncio sepulcral. Foi assustador.

Eduardo de Araújo Cavalcanti, 45, advogado (João Pessoa - PB)

Havendo me mudado de Natal para Madri, dois anos antes, com minha esposa e três filhos, tínhamos discutido, justo antes do meu primeiro dia no trabalho. Chateado, em vez de assumir o posto, dirigi-me a um parque da cidade e sentei-me num dos bancos para refletir.

Quase três horas mais tarde voltei para casa, e a esposa estava diante da TV. Como era dia de semana, os filhos estavam na creche e na escola. Ela me olhou e nos abraçamos, grudados às imagens terríveis e ao mistério dos acontecimentos. Havia um medo enorme em nossos corações. Aquilo nos uniu de algum modo.

Diógenes Carvalho Veras, 57, professor de história (Porto, Portugal)

Minha reação foi de incredulidade com sentimento que ali começaria a Terceira Guerra Mundial. Até aquele momento, nomes como Talibã e Al Qaeda me eram totalmente desconhecidos

Jimmy Wagner Galvão Mendes

41, administrador de empresa de Catolé do Rocha (PB)

Sou professor de literatura. Naquela manhã, eu tinha lido o poema Elegia 1938, de Drummond, em uma sala de aula de um cursinho pré-vestibular. Esse poema termina com uma referência à destruição da ilha de Manhattan. Depois da aula, fui ao centro da cidade e vi as imagens dos ataques nas TVs das lojas. No dia seguinte tive aula na mesma turma e todos comentaram muito a incrível coincidência.

Elci Rocha de Resende , 48, professor (Divinópolis - MG)

Estava no Ceagesp comprando plantas com uma amiga quando fui avisada por um amigo. Fomos para a casa dela e ainda chegamos a tempo de ver o segundo avião bater e o prédio desabar! Me arrepio até hoje em lembrar! A sensação de estar vendo algo surreal acontecer ao vivo e a cores e duvidar do que está acontecendo diante dos olhos. Inesquecível horror.

Uma amiga que estava lá num dos prédios faleceu nesse dia. A maldade humana não tem limites.

Maria Isabel L. R. Romero, 62, artista visual (Lisboa, Portugal)

Foto enviada pela leitora Lenilde da Silva Ramos mostra a capa do disco Breakfast in America, do Supertramp
Foto enviada pela leitora Lenilde da Silva Ramos mostra a capa do disco Breakfast in America, do Supertramp - Lenilde da Silva Ramos

Em 2001 eu trabalhava com música. Naquela manhã, estudava o repertório do Supertramp, até ser chamada para ver o que acontecia na TV. Parei tudo e fiquei o dia todo grudada ali, até porque tinha um amigo que trabalhava no WTC.

Naquela noite cantei "New York, New York" como nunca tinha feito antes. No outro dia, fui arrumar as capas dos discos e, mesmo já tendo olhado um monte de vezes o Breakfast in America, só naquele momento vi realmente as imagens que até hoje me fazem pensar.

Meu amigo, o arquiteto Robert Eisenstat, sem entender o que estava acontecendo, resolveu descer os 74 lances de escada. Seus amigos preferiram esperar a chegada dos bombeiros. Nenhum sobreviveu.

Lenilde da Silva Ramos, 69, escritora (Campo Grande)

Um de meus alunos percebeu pessoas pulando da torre em chamas! Todos começamos a chorar! Foi a pior sensação que tive em minha vida. Muitos pais começaram a chegar para buscar os filhos, foi uma comoção geral. Nunca me esquecerei desse dia!

Tereza C. P. C. Torres da Silva

56, professora de ensino fundamental, do Rio de Janeiro (RJ)

Estava chegando ao aeroporto de Dallas, nos EUA, para iniciar um ano de estudos de pós-doutorado na Universidade do Texas. O aeroporto foi fechado, não conseguimos recuperar as malas e não havia conexão para Austin, meu destino final.

Aliás, não havia transporte e tive que alugar junto com outros passageiros uma limusine para nos levar à cidade próxima ao aeroporto para alugar um carro e rumar para Austin. Somente na limusine vi pela televisão o ataque, achando que não era real. Um dia infelizmente inesquecível. Cheguei a Austin somente no final da tarde graças à solidariedade de duas pessoas. Um grande caos!

José Marcos Pinto da Cunha, 62, professor universitário (Campinas - SP)

Difícil esquecer esse dia, mesmo com apenas 7 anos, já que meu irmão mais novo completava 4 anos. Estávamos planejando a festinha dele. Aquela festa "raiz", com bolo de clara de ovo e lembrancinhas para os convidados. Meus pais tinham até comprado aqueles balões que quando estourados fazem chover balas e pirulitos.

Naquela época entendia nada de política. Lembro apenas de meu pai fixado na TV assistindo ao noticiário, atento e preocupado. Hoje me pergunto se alguém pensou mal dos meus pais por realizarem a festa. Nunca vi problema, não estávamos comemorando aquele horrível ataque. Era apenas a tradicional e memorável festa que os Silva realizavam todo ano. Uma festa de uma criança de 4 anos.

Samuel dos Santos Silva, 27, açougueiro (Itatinga - SP)

A jornalista Monica Kulcsar amamentava a minha primeira filha, Gabriela, quando o 11 de Setembro aconteceu
A jornalista Monica Kulcsar amamentava a minha primeira filha, Gabriela, quando o 11 de Setembro aconteceu - Monica Kulcsar

Em licença maternidade, eu amamentava a minha primeira filha, Gabriela, nascida em junho, quando as primeiras imagens surgiam na televisão. Já trazia comigo o medo e a insegurança naturais do puerpério. A cada explosão, minhas dúvidas sobre o futuro não apenas da minha filha, mas de toda a humanidade, se multiplicavam. Que mundo era aquele e onde estaríamos em 20 anos? Ainda hoje não tenho essas respostas.

Monica Kulcsar, 47, jornalista (São Paulo - SP)

Estava dentro do metrô, em Londres, quando recebi uma ligação do meu pai, do Brasil, me informando dos atentados e me pedindo que eu tomasse muito cuidado. Fiquei muito preocupada e com muito medo que pudesse acontecer algo parecido em Londres. Naquela época, não tínhamos acesso às informações como hoje. As notícias passavam de boca em boca e foi só no fim do dia, quando cheguei em casa, que eu fiquei sabendo das proporções da catástrofe que tinha ocorrido nos EUA.

Nos meses seguintes, em Londres, havia muita tensão no ar; muitas pessoas diziam que um novo atentado poderia ocorrer a qualquer momento, e eu vivi todo esse período com medo de um inimigo invisível.

Ana Paula De Bonis, 45, historiadora (Veneza, Itália)

O que eu fazia no dia anterior ou no dia seguinte ao 11 de Setembro? Não faço ideia! Só posso acreditar que ver a História acontecer na sua frente numa idade tão jovem faz seu cérebro grudar o que sentimos naquele momento

Mariana Póvoa de Almeida Corrêa

37, médica, do Rio de Janeiro (RJ)

Estava em uma reunião na Rede Gazeta de Televisão com um executivo da emissora capixaba. No meio da reunião, alguém entrou na sala e chamou nosso interlocutor. A pessoa estava calma, com um sorriso enigmático no rosto que depois entendi ser um riso nervoso. Disse-me para acompanhar também e nos conduziu a uma sala de edição de vídeos.

Em uma TV sem som vimos a imagem do primeiro avião se chocando contra a torre. Perguntei, fascinado, como ele tinha feito aquela incrível trucagem em sua mesa de edição de vídeos. Demorei uns bons minutos para acreditar que não estava vendo efeitos especiais cinematográficos.

Saí de lá e telefonei para meu pai de um orelhão para noticiar: "o século 21 começou!".

Flávio Lofêgo Encarnação, 52, professor universitário (Rio Branco - AC)

Tinha ido passar a lua de mel em NY. Na noite do dia 10, viajamos de ônibus para Nashville para visitar uns amigos. Ao chegar à rodoviária na manhã do dia 11, o motorista de táxi perguntou se eu não tinha visto as notícias. Meu inglês não é muito bom, mas deu para entender que algo grave tinha acontecido.

Então ligamos imediatamente para o Brasil para tranquilizar nossas famílias. Já haviam inclusive mentido ao meu pai que já tinham falado conosco. Inicialmente achei que fechariam as fronteiras, que uma guerra seria declarada em solo americano. Foram dias de muita tensão.

Carmen Maria Medeiros Fabricio, 51, gestora de condomínios e estudante de direito (Porto Alegre - RS)

Eu estava trabalhando no IPT, em São Paulo. Estávamos em uma sala onde trabalhavam cerca de 15 pessoas. Uma delas tinha celular e recebeu um telefonema avisando sobre o "acidente". Na hora em que disseram que um avião havia batido no WTC eu achei que era no WTC de São Paulo, no bairro do Brooklin.

Fomos até a sala que tinha um computador ligado na internet, na época discada, mas os sites já estavam fora do ar, congestionados.

Ligia Helena Sales Nunes, 39, designer (São Paulo - SP)

Eu estava em casa preparando almoço e vendo TV antes de ir pro cursinho. As imagens eram chocantes. Quando cheguei no cursinho à tarde, o professor disse para a turma: “Que é que vocês vieram fazer aqui hoje? Não vai mais ter vestibular. Os EUA vão explodir tudo”. A gente riu, mas de nervoso. Era uma sensação tensa de não saber o que estava acontecendo no mundo e quais seriam as consequências.

Bruna Buch, 39, bióloga (Piracicaba - SP)

Eu era muito pequena, tinha somente 5 anos de idade, mas lembro-me perfeitamente de como aconteceu. Eu tinha acabado de almoçar e estava me arrumando para ir à escola. Meu pai telefonou para a minha mãe e ela ligou a TV na mesma hora, e eu me lembro de estar de uniforme, parada em pé em frente à tela, vendo um dos aviões atingindo a torre e ela desabando logo em seguida. E eu chorei.

Fiquei bastante abalada. É uma das poucas memórias vívidas e claras que tenho dessa época da vida.

Michelle Villaça Andry, 25, professora (São Roque - SP)

Naquele dia, há 20 anos, minha mãe no telefone falava: 'filha, seu aniversário nunca mais será esquecido'. Outrora, era motivo de festa; hoje, quando falo a data, lembram a triste data americana

Rosane Passos Oliveira

62, enfermeira, de Salvador (BA)

Eu estava em Araraquara, no interior de São Paulo, e nesse estava agendada a minha defesa da dissertação do mestrado. Lembro que eu acordei mais tarde do que o normal e vi na televisão os atentados. Demorei um pouco para entender o que estava acontecendo. Fiquei chocada. Também recordo a preocupação da minha orientadora, pois o filho dela estava no EUA (em algum momento eles conseguiram se falar, e ele estava bem).

Sempre que escuto sobre 11/9, lembro dos atentados e da minha defesa.

Naila Lourenco, 45, bióloga, (São Paulo - SP)

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