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'Sou apavorada pelo envelhecimento', diz leitora em evento com colunista da Folha

Grupo de mulheres participou de conversa com a antropóloga Mirian Goldenberg

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Americana (SP)

A antropóloga e colunista da Folha Mirian Goldenberg desenvolveu uma teoria para explicar por que o envelhecimento desperta tanta angústia nos brasileiros —talvez mais ainda nas brasileiras.

"Eu estudo o envelhecimento não porque fiquei velha, mas porque quero compreender por que na cultura brasileira envelhecer provoca tanto medo, tanto sofrimento, tantas representações negativas, e em outras culturas, não", afirmou Mirian, que tem 65 anos e em junho completa 12 anos como colunista da Folha.

Fotografia colorida de webconferência mostra mulher branca de cabelos castanhos claros em plano médio; ela veste blusa listrada preto e branca, oculos quadrados e fones de ouvido e sorri
A colunista da Folha Mirian Goldenberg participa de conversa com leitoras - Reprodução

Na última quinta-feira (19), ela se reuniu com um grupo de leitoras da Folha para conversar sobre seus achados em décadas de pesquisa sobre envelhecimento e o que chama de "velhofobia" —o medo e/ou preconceito de envelhecer.

"Por que no Brasil é tão difícil envelhecer? Porque no Brasil o corpo é um verdadeiro capital, principalmente para as mulheres. Corpo jovem, corpo bonito, corpo em forma", afirmou a professora da UFRJ, lembrando que estamos entre as maiores consumidoras mundiais de itens como cirurgia plástica, botox e tintura para cabelo.

Enquanto referências ao corpo eram onipresentes nas suas conversas com mulheres brasileiras, o mesmo não se repetia nas pesquisas que conduziu em Portugal e na Alemanha.

Numa cultura em que o corpo jovem é tão valorizado, envelhecer provoca muito sofrimento

Mirian Goldenberg

colunista da Folha

"Na Alemanha, em três meses em que passei conversando com as mulheres, elas falavam de projetos, de amigos, de viagens. Não falavam de corpo. Não falavam de idade. Não falavam nem de família", conta.

"Se nós queremos tanto ser jovens, o que significa o envelhecimento? Numa cultura em que o corpo jovem é tão valorizado, envelhecer provoca muito sofrimento. E não é aos 53 anos. Aos 30, 40, 45, as mulheres já estão com pânico de envelhecer. Nós temos medo porque nossa cultura valoriza que você fique jovem até morrer."

Já na velhice, diz ela, a importância passa a ser a de uma vida com autonomia. "O olhar de fora ganha menos valor quando você descobre o que é prioritário na sua vida. Quanto mais velho você fica, mais você valoriza seu tempo e suas relações."

Sou apavorada pelo envelhecimento

Claudia Alvarenga

empreendedora em São Paulo (SP)

Fotografia colorida de webconferência mostra mulher morena clara em plano fechado; ela tem cabelos e olhos castanhos escuros, os cabelos lisos na altura do pescoço e partidos ao lado; ela usa cachecol lilás e leva a mão direita à cabeça
A leitora da Folha Claudia Alvarenga, 53, em conversa com a colunista Mirian Goldenberg - Reprodução

"Mirian, não se assuste, mas sou apavorada pelo envelhecimento", disse a leitora Claudia Alvarenga, 53, empreendedora em São Paulo. Uma de suas principais preocupações é a construção de relacionamentos ao longo da vida.

Já Shirley Ruriko, 57, enfermeira aposentada de Campinas (SP), disse que sempre se interessou pela geriatria e acha a questão do envelhecimento fascinante.

A professora universitária aposentada Janetti Nogueira de Francischi, 67, de Belo Horizonte (MG), fez sua reflexão na conversa.

"A perda da beleza é uma coisa muito candente [no processo do envelhecimento]. É o que mais toca a gente. E a gente precisa colocar o córtex frontal para funcionar e ativar toda a consciência e entender de que cada momento é seu momento e tem o seu valor".

A perda da beleza é uma coisa muito candente, é o que mais toca a gente

Janetti Nogueira de Francischi

professora universitária aposentada

Por outro lado, ela disse que adora quando a colunista escreve sobre o sexo no envelhecimento.

"Isso é um tabu sem tamanho, e quando você fala aquelas coisas às vezes cabeludas eu acho ótimo, porque é a vida da gente", disse, aos risos.

Fotografia colorida de webconferência mostra mulher idosa branca em plano médio; ela tem olhos e cabelos castanhos escuros e óculos levemente redondos de aros escuros; os cabelos são lisos e partidos ao meio; ela veste blusa de manga longa cinza e uma blusa verde por baixo
A professora universitária aposentada Janetti Nogueira de Francischi, 67 - Reprodução

"Não escrevo sobre isso sempre porque não tem tanto assunto assim", respondeu Mirian, mantendo o bom humor do papo. Ela conta que sua coluna mais lida foi justamente a intitulada "O sexo das mulheres mais velhas", de 2019.

"Você deu muita ênfase à questão do corpo, e eu entendo isso perfeitamente, vivo também esses dilemas da cultura focada na beleza e no corpo. No Rio a gente vive isso muito intensamente, por causa da questão da praia", afirmou Desiê Ribeiro, 57, do Rio de Janeiro (RJ).

Fotografia colorida de videoconferência mostra mulher em primeira plano; ela é branca, tem olhos e cabelos castanhos escuros, cabelos lisos na altura do ombro; ela tem olhar de supresa e uma das mãos apoiada no rosto
A leitora da Folha Desiê Ribeiro, 57, participa de conversa com a colunista Mirian Goldenberg - Reprodução

A profissional de recursos humanos aposentada vê outros aspectos que preocupam em relação à velhice.

"Três aspectos que foram importantíssimos na minha decisão de me aposentar e dar vazão aos meus projetos pessoais: tempo, autonomia e relacionamentos. No entanto, eu tenho plena consciência de que eu só pude fazer essa escolha aos 55 anos porque me preparei para isso ao longo da vida", contou.

Ela menciona que o Brasil está entre os países com menor índice de poupança do mundo e que terminamos 2021 com 7 entre 10 brasileiros endividados. "A gente tem uma maior longevidade, um prolongamento da velhice, e nós não estamos preparados financeiramente para isso. A nossa realidade é que vemos as pessoas envelhecendo com pouco acesso a saúde, com custos altíssimos e uma acessibilidade horrível", acrescentou.

A gente tem uma maior longevidade, um prolongamento da velhice, e nós não estamos preparados financeiramente para isso

Desiê Ribeiro

profissional de recursos humanos aposentada

Para Desiê, é na coletividade e na colaboração que os brasileiros vão poder mudar a realidade do nosso envelhecimento. "É debater isso nos nossos pequenos núcleos."

Mirian vê aí um problema: ela citou pesquisa que coloca o Brasil no último lugar em nível de confiança: apenas 4,7% dos brasileiros confiam nos demais. "Significa que 95,3% não confiam nem no companheiro."

"Introjetar a importância dessa relação de confiança, de apoio, de real amizade e amor é muito difícil em um cultura da desconfiança", opinou.

Conversa com Leitores é uma iniciativa da editoria de Interação para realizar um papo periodicamente com leitores sobre assuntos em evidência, seja política, economia, internacional, sociedade, cultura, dentre outros. Fique de olho no site e nas redes sociais da Folha para participar dos próximos. ​

Para esta edição, foram convidadas participantes do Projeto Leitoras, uma iniciativa da Folha para se aproximar de seu público feminino. Elas se reúnem a cada 15 dias em um grupo de WhatsApp para discutir temas os mais diversos, de literatura a política, passando por filmes com temática feminista.

Para participar, mande uma mensagem para interacao@grupofolha.com.br, informando seu nome completo, idade, cidade e temas de interesse.

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