Celebridades e tiktokers são cabos eleitorais dos jovens em 2022; ouça podcast

Cabo Eleitoral é uma parceria entre a Folha e o InternetLab; seis episódios explicam a intersecção entre política e redes sociais

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São Paulo

Em 2022, o jovem parece não ter vontade de votar: apenas 854 mil pessoas com até 18 anos tiraram o primeiro título de eleitor até o fim de março. Há uma década, o registro era superior a 4 milhões.

Para trazer os mais novos para a política, as candidaturas precisam ser aliadas de influenciadores digitais, que já na pré-campanha se mostram capazes de mobilizar jovens nas redes e fora delas –como mostrou o festival Lollapalooza.

A Justiça Eleitoral também está atenta às celebridades de internet e, desde 2019, proíbe a publicação paga com conteúdo eleitoral —o que faz do pleito de outubro a primeira eleição presidencial com essa regra.

O segundo episódio do Cabo Eleitoral, um podcast que é uma parceria entre a Folha e o centro de pesquisas InternetLab, mostra o papel político das figuras públicas com milhões de seguidores nas redes sociais e apresenta a primeira eleição presidencial com o TikTok entre os adolescentes.

Ouça o episódio:

Segundo a pesquisadora Camila Rocha, autora de "Menos Marx, Mais Mises: o Liberalismo e a Nova Direita no Brasil", os influenciadores não se ligam à política institucional, mas a causas que são caras entre os jovens.

"Todos os jovens, independentemente da posição ideológica, dizem se interessar muito por questões relacionadas a direitos humanos, meio ambiente, direito dos animais e desigualdade social", afirma. Ela coordenou uma pesquisa sobre o tema junto com a socióloga Esther Solano em quatro países.

Assim, adolescentes não precisam ouvir o voto declarado de Juliette, com quase 34 milhões de seguidores no Instagram, para serem influenciados politicamente. E, cada vez mais, a figura pública é estimulada e cobrada pelos fãs para se posicionar no debate público.

O último Datafolha mostrou que a rejeição a Jair Bolsonaro (PL) é maior entre os eleitores de até 24 anos: 62% disseram que não votariam de jeito nenhum no atual presidente. À medida que a idade avança, a rejeição cai, chegando a 47% entre as pessoas com mais de 60 anos.

No TikTok, os jovens se dividem entre #RightTikTok e #LeftTikTok (hashtags que se associam à direita e à esquerda) para debater política. Já existe até quem vá disputar a primeira eleição após uma trajetória bem-sucedida de viralização de vídeos e engajamento na plataforma.

O segundo episódio de Cabo Eleitoral ouve Fabio Malini, professor da Universidade Federal do Espírito Santo; a publicitária Têca Falcão, da equipe digital de Juliette durante o BBB; Camila Rocha, autora de "Menos Marx, Mais Mises: o Liberalismo e a Nova Direita no Brasil"; Caio Machado, diretor-executivo do Instituto Vero, que conduz pesquisa sobre compra de seguidores; Heloisa Massaro, diretora no InternetLab; e Carolline Sardá, ativista política com quase 800 mil seguidores no TikTok.

Quem conduz o podcast é a jornalista Paula Soprana, repórter na Folha desde 2018. O podcast tem edição de som de Luan Alencar e coordenação de Magê Flores.

O Cabo Eleitoral é uma série de seis episódios que vai ao ar às quartas, às 7h.

Podcast Cabo Eleitoral, uma parceria entre a Folha e o centro de pesquisas InternetLab
Podcast Cabo Eleitoral, uma parceria entre a Folha e o centro de pesquisas InternetLab - Catarina Pignato

Transcrição do segundo episódio:

Título de Eleitor

Quando o Tribunal Superior Eleitoral botou no ar uma campanha para estimular jovens a tirarem o título de eleitor, não imaginava que a coisa ia se alastrar pelas redes sem nenhum pedido explícito de repostagem.

Anita: "Vamos lá, pelo amor de Deus. Vamos tirar esse título. Cansada de ser a única alegria do brasileiro!"
Felipe Neto: "Se você tiver 16, 17, 18 anos, se você fizer 16 anos até o dia 2 de outubro, que é o dia das eleições, você já pode tirar seu título de eleitor!"

Uma coisa puxa a outra e a mensagem foi parar nos palcos de um festival de música com algo a mais…

Emicida [no Lollapalooza]: Se você tem de 15 a 18 anos, tira o título de eleitor. Bolsonaro, vai tomar no c*!
Djonga [no Lollapalooza]: Fora, Bolsonaro!
Pablo Vittar [no Lollapalooza]: Fora, Bolsonaro!

E o que veio disso, você deve lembrar…

Locutor de TV: "O PL, Partido Liberal, do presidente Jair Bolsonaro, acionou o TSE para evitar propaganda eleitoral no Lollapalooza".

Locutor de TV 2: "Jair Bolsonaro determinou que o PL retire a ação que proibiu manifestações políticas no festival Lollapalooza no fim de semana".

Quando o TSE criou a campanha, que é feita em todo ano de eleição, não calculava que a ação ia repercutir tanto de um dos lados da corrida eleitoral: o lado esquerdo. E isso incomodou quem está do lado direito.

"Temos aí, cantores, artistas como a Anitta que estão fazendo propaganda política contra o atual presidente Bolsonaro, e até se dirigindo aos ministros do TSE com palavrões. Eu acho engraçado artistas e a oposição falarem em censura quando aplaudiram a prisão de um deputado federal, também do Roberto Jefferson".

Essa é a deputada bolsonarista Bia Kicis depois da onda de publicações pelo voto do jovem, que começou com uma cara de contestação ao governo.

Dias depois, uma nova leva de adolescentes declarou voto ao presidente nas redes sociais.

Bolsonaro [em entrevista no cercadinho]: "Essa campanha dos 16 anos… Você vê o jovem dizendo que vai votar em mim, agora não diz, não mostra a cara dizendo que vai votar no… [Lula]".

A disputa pelo voto jovem e a história do Lollapalooza sintetizam uma faceta estratégica da eleição de 2022: os influenciadores são super cabos eleitorais e quando eles decidem participar de um debate, o assunto reverbera de modo inesperado, incontrolável.

O TSE está tentando atrair essa faixa etária porque nunca viu um índice tão baixo de pessoas com até 18 anos querendo participar da eleição.

O último registro mostra que 1,5 milhão de pessoas de 16 e 17 anos emitiram o documento. Para você ter uma ideia, há dez anos, 4 milhões de adolescentes pretendiam votar.

Não dá para bater martelo sobre o impacto no resultado da eleição deste ano. Mas tem uma coisa que a gente sabe: entre jovens, a rejeição a Jair Bolsonaro é maior.

De acordo com o último Datafolha, 62% dos eleitores de até 24 anos não votariam no atual presidente de jeito nenhum. À medida que a idade avança, a rejeição cai, chegando a 47% entre as pessoas com mais de 60 anos.

Dois mil e dezoito já mostrou que, em uma campanha eleitoral, é melhor contar com aliados que tenham muitos seguidores, curtidas e engajamento. E desde então, o capital social do influenciador só cresceu.

Tiago Leifert [em locução no BBB]: "E você nunca mais vai se sentir sozinha na sua vida, e isso quem tá dizendo não sou eu, são os quase 24 milhões de seguidores que você tem nas redes sociais. Juliette, você é um fenômeno".

Se em 2022 não só as autoridades, mas também os políticos estão mirando os jovens, eles precisam olhar para o TikTok. O aplicativo chinês é um dos que mais cresce no mundo e é o preferido entre adolescentes.

A rede social diz ter 1 bilhão de usuários ativos. Projeções do mercado indicam que o Brasil tenha até 70 milhões de usuários.

Essa vai ser a primeira eleição presidencial com TikTok. E também a primeira eleição com candidatos que nasceram no TikTok.

No episódio de hoje, a gente vai falar sobre o papel político dos influenciadores neste ano.

Eu sou a Paula Soprana, repórter da Folha, e esse é o Cabo Eleitoral, podcast que explica a campanha na internet, e que é uma parceria entre a Folha e o centro de pesquisa InternetLab.

– Alô
– Oi, Carol, tudo bem?

Essa é Carolline Sardá, de Joinville. Ela tem 24 anos e mais de 700 mil seguidores no TikTok. Segundo marqueteiros, um perfil com 50 mil seguidores já chama atenção das campanhas.

"As pessoas chegam e aprendem rapidinho com você; 15 segundos, 30 segundos ou no máximo três minutos você tem para explicar o conteúdo. Então a pessoa está num momento rápido, de ver conteúdo rápido."

Carolline publica conteúdos didáticos que precisam ir direto ao ponto para captar a atenção das pessoas já nos segundos iniciais. Às vezes, ela nem fala. Só faz expressões faciais e interage com pequenos textos e com músicas que viram tendência na plataforma.

"E tu explica rapidinho para ela o que é uma prestação de contas, o que é uma cota parlamentar, o que é uma cota feminina dentro da política, como é que funcionam os três Poderes, o que é o Legislativo, o que é o Judiciário. Elas não querem coisa difícil, elas querem entender tudo rápido com um vídeo engraçado no TikTok."

Ela é muito ativa na internet desde os 18 anos, mas foi só no TikTok que o conteúdo que ela produz viralizou.

"Eu comecei realmente a me conectar aos movimentos sociais, ao movimento feminista, de 2016 para 2017, que foi quando eu sofri uma violência sexual e eu não pude denunciar numa delegacia. Acabei sofrendo com a impunidade e foi aí que eu entrei na internet para procurar maneiras de tentar obter justiça."

A audiência de um vídeo dela vai de 10 mil a 7 milhões de visualizações. Carolline diz que a maioria do público é jovem. Ela calcula, por cima, que mais de 80% são mulheres que endossam as ideias dela.

Talvez você já tenha ouvido falar sobre bolhas ou câmaras de eco, conceitos que passaram a ser usados para descrever o efeito dos algoritmos na nossa vida.

Quanto mais a gente interage com determinado assunto, mais fica exposto a opiniões que reforçam nossos pontos de vista. E a realidade social fica limitada a pessoas com as quais a gente tende a concordar.

Essa ideia já foi contestada e revisitada. Alguns pesquisadores argumentam que fora das redes as pessoas também fazem isso: ficam mais perto dos seus iguais. Mas o conceito serviu pra ajudar a conscientizar as pessoas sobre o funcionamento básico das redes sociais.

No TikTok, o usuário não precisa ser amigo de ninguém ou mesmo ter uma conta pra acessar vídeos. Se ele começar a curtir um tipo de conteúdo, a plataforma sugere outros ligados à mesma temática. Antes que esse processo fique repetitivo, o algoritmo fura a bolha e oferece um vídeo diferente.

Com o deslizar do dedo, dá pra ir de uma cartomante tirando a sorte a transmissões da guerra feitas por moradores da Ucrânia.

O tiktoker –quem produz os vídeos– é incentivado a manter um alto padrão de publicação. Se postar mais, tem mais chance de viralizar. Se viralizar, mira novas fronteiras de audiência. É um ciclo vicioso por engajamento.

Essa tática não é uma exclusividade do TikTok. Mas o alcance que esse aplicativo dá aos conteúdos chama a atenção:

Carolline: "Dez pessoas viram o seu vídeo… se elas gostarem disso, [o vídeo] vai para mais cem, e ainda vai para mais mil, daí vai crescendo. O Instagram não tem esse algoritmo que permite que você vá para outras bolhas. Lá, quem te segue, recebe o seu conteúdo. No TikTok, quem não te segue, recebe. Às vezes você recebe um 'hate' da galera que discorda completamente de você, mas em grande parte o algoritmo joga para o público que tem o mesmo pensamento que o teu".

No Tik Tok, eu não esperava topar com adolescentes falando sobre liberalismo, marxismo, Lula, Bolsonaro e terceira via.

Quando fui olhar para a política brasileira no TikTok, queria entender como as figuras tradicionais estavam se comportando.

Entre os pré-candidatos à Presidência, Bolsonaro lidera em número de seguidores, com 1,2 milhões. Em segundo, mas bem distante, vem Ciro Gomes, do PDT, com 82 mil.

Além de presidenciáveis, há vários parlamentares na plataforma. Boa parte deles não parece confortável. De uma hora para outra, tiveram que sair do palanque e começar a fazer dancinhas para se comunicar com o adolescente.

Carolline: "É muito cringe, muito cringe. Dá muita vergonha alheia..."

Dentro dessa mesma rede, mas em outro algoritmo, jovens eleitores se dividem entre: #RighTikTok, à direita, e #LeftTikTok, à esquerda.

Tem até o centrão do TikTok, mas ele aparece menos.

Não dá para ser muito profundo em 30 segundos ou três minutos de vídeo. Mas quem usa muito a rede aprendeu a otimizar o tempo. Eles usam prints de notícias para complementar ideias, fazem dublagens e pequenas encenações.

Existem várias fórmulas de comunicação rápida, produzidas com manipulação de imagens que já existem, cortes rápidos, remixagens, dublagens, filtros sobrepostos às pessoas, é um jeito novo de comunicar.

Daqui um tempo, a gente vai saber se a lábia dos tiktokers virou voto. Mas um estudo recente mostrou que o jovem brasileiro está se politizando por meio dos influenciadores.

Uma pesquisa coordenada pela socióloga Esther Solano, professora da Unifesp, e pela cientista política Camila Rocha entrevistou jovens no Brasil, na Argentina, na Colômbia e no México para entender de onde vinham as posições políticas deles.

Uma das pessoas mais citadas foi a Juliette, que ganhou a última edição do Big Brother Brasil e que tem 33 milhões de seguidores no Instagram.

"A influência de pessoas famosas, que vêm de reality show ou do mundo do entretenimento, está muito mais ligada a causas do que propriamente à política institucional. Uma influenciadora como a Juliette, que se posiciona mais no espectro do empoderamento feminino e feminismo, influencia nesse tocante. E existe uma tendência de grandes influenciadores dialogarem com causas, não com candidaturas políticas."

Aqui falou a Camila Rocha, que também é autora do livro "Menos Marx, mais Mises: o liberalismo e a nova direita no Brasil".

A política tradicional não costuma aparecer nos discursos da ex-BBB. No Twitter dela, a campanha para que o jovem tire o título é a manifestação que mais se aproxima disso.

O influenciador não precisa falar explicitamente de um candidato para que o seguidor entenda em que espectro político ele está, ou melhor, em qual ele não está. Por exemplo, no meio de março, Juliette lembrou dos quatro anos da morte de Marielle Franco.

Esse estudo que eu citei mapeou vários canais de influência mencionados pelos jovens nas redes sociais: o do mercado financeiro e do empreendedorismo, o das celebridades e artistas, o do pessoal do rap, o do humor, o dos games.

Na ala conservadora, estão figurões como Allan dos Santos e Ana Campagnolo e os canais cristãos, como o de Deive Leonardo e o de Isadora Pompeo.

E mais à esquerda, estão perfis como Mídia Ninja e Quebrando o Tabu. Eu adiciono a influência do 342 Artes, coletivo da produtora Paula Lavigne, que ajuda a levar a política para a rua.

Daniela Mercury [em evento]: "Salve todos os movimentos que vieram de todos os lugares do Brasil. Todo mundo. Frente Antirracista, MST. Esse país é nosso. Não ao marco temporal! Love suas tranças de mel, Rapunzel!"

Esse é um trecho do Ato pela Terra, um evento convocado por Caetano Veloso. Em Brasília, eles protestaram contra um pacote de medidas que flexibilizam o licenciamento ambiental e aumentam o uso de agrotóxicos. O ato foi organizado nesses canais de esquerda e teve cobertura do canal do Mídia Ninja no YouTube.

Também não dá pAra deixar de lado uma máquina de influência, que movimenta muita paixão, e que vem se deslocando da TV para internet nos últimos anos.

Galvão: "Bem amigos, rola a bola no tiktok, ela vai virar meme, o companheiro tá livre, vai arriscar, haja coração!"

Aqui você ouviu um comercial do TikTok. O Galvão Bueno, que vai se despedir das narrações na TV na Copa do Mundo deste ano, está prometendo se dedicar a projetos digitais depois disso.

"Eu diria que futebol ou entretenimento é o coração da internet."

Esse é Fabio Malini, professor da Universidade Federal do Espírito Santo, que estuda a internet desde o fim dos anos 90.

"Hoje os clubes já negociam as transmissões. Há uma geração que já não assiste mais ao futebol por televisão. Você também tem um movimento quase natural de locutores que vão sair da televisão e vão ao streaming porque é onde está chegando a audiência. Boa parcela das pessoas que acompanham o futebol é fanática por seus times e fazem qualquer coisa. Então baixam aplicativos que são submetidos a novos atores da publicidade."

Imagina o potencial de influência do Casimiro, que tem mais de 2 milhões de seguidores na Twich, onde comenta futebol.

Tem mais uma tendência que é o que o Malini chama de "fofocariado": "perfis com um volume muito grande de audiência têm uma decisão política a tomar. Na verdade já tomou essa decisão política, que é um 'Fora Bolsonaro'. Aí há uma repercussão do mercado financeiro e do mundo sertanejo que também é muito massivo".

São os sites Hugo Gloss e Choquei e os perfis que eles têm no Instagram, com mais de 15 milhões de seguidores.

Nos canais de mercado financeiro –e aí a gente está falando de Telegram, YouTube e Instagram– predomina um discurso de apoio a privatizações, leis trabalhistas mais flexíveis e menos dependência do Estado.

Malini: "Aquela pessoa tem uma certa visão política porque ela está falando de como é importante a privatização da Eletrobras, aumentar o valor das ações da Eletrobras, e aí a sua dívida ou a sua renda passiva vai aumentar mais."

Como grande parte da audiência tem pouca experiência em investimento, o influenciador vira um guru, capaz até de impactar a renda das pessoas.

A gente fala tanto de influenciador que parece um conceito que tá há anos no dicionário. Mas assim como o termo fake news, a definição de influenciador não é tão objetiva.

Costumam ser pessoas que produzem conteúdos para as redes sociais e que tem um engajamento significativo. Essa definição, por exemplo, é usada num guia para influenciadores digitais nas eleições feito pelo InternetLab e pelas Redes Cordiais.

Uma pesquisa do Ibope Inteligência mostra que metade dos internautas brasileiros segue algum tipo de influenciador digital. Desses seguidores, 75% têm entre 16 e 24 anos e 56% são da classe A.

O mercado de marketing de influência movimenta cerca de US$ 3 bilhões no Brasil, segundo uma estimativa da Mediakix, que faz um levantamento anual do setor.

"No final do ano passado, as pesquisas já apontavam que 67% das empresas elas já iriam investir em influenciadores, né? As marcas iam investir em influenciadores."

Essa é a publicitária Têca Galvão, da agência Suba. Ela foi uma das responsáveis por cuidar da reputação da Juliette nas mídias sociais durante o BBB.

"É um mercado muito grande. As marcas ao investirem na influência, falam muito mais próximas com o público delas do que se investissem em uma mídia comum, porque o influenciador passa a verdade nas coisas que ele fala das coisas que eles estão falando."

Como a relação entre o influenciador e o público é muito próxima, existe uma expectativa de que essas figuras se posicionem politicamente.

"Se o influenciador resolve se posicionar, ele vai ter que aguentar o que ele está dizendo e ele vai entender esse preço que ele vai pagar. A pessoa não pode ser neutra, a gente está em 2022 e não dá para ficar em cima do muro."

Já está bem nítido que a Justiça Eleitoral entendeu a importância do influenciador. Entendeu tanto que mudou a legislação: neste ano, está proibido fazer o chamado publipost com conteúdo eleitoral.

O influenciador pode participar do debate público, pode entrevistar candidato e pode participar de live –desde que não seja um livemício, que é a versão digital do showmício.

O que o influenciador não pode é se envolver com dinheiro ou outra espécie de remuneração nos conteúdos de suas redes sociais. A lei eleitoral já vedava qualquer verba pro compartilhamento de conteúdo político. Mas agora o TSE deixou isso mais claro.

O artigo 57 C da Lei das Eleições veda todo e qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet. A única exceção é para o chamado impulsionamento de conteúdo: o dinheiro para promover publicações no Facebook e no Google.

Qualquer outra ação envolvendo algum tipo de publicidade paga na internet está vedada, e o TSE decidiu esmiuçar isso diante da quantidade de ferramentas de marketing digital.

"Todo ano ímpar que não tem eleições o TSE atualiza as resoluções sobre propaganda eleitoral."

Essa é Heloísa Massaro, diretora no Internet Lab.

No ano passado, o instituto submeteu em uma consulta pública do TSE a sugestão para tornar expressa essa vedação ao publipost.

"Os influenciadores são nós importantes nessa rede para aumentar o alcance e o engajamento de certas publicações. Eles têm um alcance grande, têm certa credibilidade. Quando esses nós apoiam a campanha, conseguem levar essa propaganda e essa mensagem mais longe, porque também funcionam como amplificadores pelo alcance que têm."

Influenciadores são capazes de levar o discurso político às bolhas de assuntos não-políticos. Para as redes sociais, as métricas como curtidas e outras ligadas à popularidade digital importam: se sua transmissão ao vivo reunir um público gigante, ela vai aparecer pra mais gente ainda.

E como os números importam, já existe um mercado vasto de venda de likes, de seguidores, engajamento.

O Caio Machado, diretor do Vero, um instituto cofundado por Felipe Neto para combater a desinformação, falou comigo sobre isso.

"A compra de métricas das redes sociais que definem o alcance e definem o tamanho do megafone é algo extremamente fácil, baratíssimo. Você pode comprar dezenas de seguidores por valores tão baixos quanto R$ 10. Então dá para comprar likes, seguidor, comentário. Tudo o que você puder imaginar é possível comprar de uma forma extremamente disponível, acessível, barata."

O Caio conduz uma pesquisa sobre a compra de métricas no Instagram. Ele compartilhou alguns dados na nossa conversa.

De 13 perfis analisados, nenhum possui CNPJ. Quem negocia, pode escolher seguidores brasileiros ou internacionais –o brasileiro é mais caro: 5.000 pessoas custam R$ 120. Você pode comprar seguidores-robôs ou o like de pessoas reais.

"Nesse processo, a gente achou a venda de seguidores e funcionalidades de outras plataformas. Eu posso postar stories no meu Instagram de 50 seguidores e receber 10 mil visualizações, e isso tudo é computado."

Eu também fui atrás de algumas empresas. Tentei ligar para quatro, nenhuma atendeu. Elas responderam que a comunicação precisava ser por texto, por WhatsApp.

Conversei com um atendente de uma marca chamada Turbine Digital. Perguntei se dava para comprar engajamento para rede de políticos, e a resposta imediata foi: "Pode sim".

Disse que desconfiava que essa compra era ilegal, mas a resposta foi que os serviços estavam de acordo com as diretrizes do Instagram.

A atendente de outra empresa disse que os perfis da base são de pessoas reais que estão lá para ganhar dinheiro. Ou seja, são remunerados para ceder o perfil no Instagram.

"Tem centenas de negócios, você tem cursos que ensinam as pessoas a se tornarem vendedores de likes, tem sistemas automatizados. Se isso acontece para qualquer coisa no mundo comercial, isso vai acontecer também no mundo político. Você pode criar, portanto, influenciadores na base do investimento em números muito artificiais."

O Instagram diz que serviços de engajamento falso violam os seus termos de uso. A empresa afirma que dedica recursos para combater esse tipo de abuso e que pode remover contas.

A compra de seguidores não está expressa na lei, mas advogados eleitorais dizem que o ato pode configurar propaganda paga.

No episódio anterior, a gente falou sobre como o conceito de propaganda eleitoral depende de interpretação e como vai ser desafiador para a Justiça controlar a campanha antecipada neste ano. O caso Lollapalooza só confirmou a complexidade da questão.

A influência acontece dentro das redes, mas vai para rua, vai para os palcos e vai para a urna.

Carolline: "Às vezes eu fico um pouco de mãos atadas por ser só ativista e não conseguir gerar tudo que eu gostaria estar gerando para as mulheres".

A Caroline, a tiktoker feminista que você ouviu no começo do episódio, decidiu concorrer a deputada estadual pelo PSOL de Santa Catarina.

Ela vai disputar com a principal antagonista dela no Estado e na pauta: a Ana Campagnolo, aluna de Olavo de Carvalho e que está tentando a reeleição pelo PSL.

"Ela é autora de um dos primeiros livros de antifeministas e é a partir dela que muitas pessoas criticam o feminismo, que lutam contra o feminismo e que se denominam antifeministas. A gente nunca teve a oportunidade de debater. Não porque eu não quero, né? Eu aceitaria um debate com ela sobre isso, até para entender de onde ela tirou a maioria das coisas ela fala. Mas acredito que do lado de lá não exista tanto interesse assim. Ela tenta muito ocultar quem eu sou. Ela fala bastante da minha franja mas não me cita [risos]."

Além de concorrer a um cargo, Carolline vai precisar entrar em outras redes sociais.

Enquanto os políticos mais velhos migram para o TikTok para falar com gente da geração dela, a pré-candidata diz que vai abrir uma conta no Facebook para conversar com a geração deles.

"Você percebe que a galera mais à direita tem um público um pouco mais velho. A galera da esquerda tem um público mais jovem."

Este foi o segundo episódio do Cabo Eleitoral, uma parceria entre a Folha e o InternetLab.

Segue o podcast no seu aplicativo favorito para não perder os próximos episódios.

Eu sou a Paula Soprana, fiz a produção e o roteiro desse podcast. A edição de som é de Luan Alencar e a coordenação é de Magê Flores.

Você ouviu áudios de Multishow, BIS, CNN, Rede Globo e Jovem Pan.

Na quarta-feira que vem a gente vai mostrar como está a engrenagem de conspirações na disputa de 2022. Até mais!

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