Governo e PT temem nova safra de delatores

Crédito: Ed Ferreira/Folhapress Michel Temer e o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, durante apresentação das Mídias Digitais do PMDB, em Brasília (DF)
Michel Temer e o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha

WÁLTER NUNES
VENCESLAU BORLINA FILHO
DE SÃO PAULO

Michel Temer chegou ao topo do poder de mãos dadas com os amigos. Assinou o termo de posse como presidente interino, em 13 de maio do ano passado, graças a Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que comandava a Câmara e colocou em votação o processo de impeachment de Dilma Rousseff.

Aproveitou a tinta da caneta e nomeou o deputado federal Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) como ministro do Turismo e o suplente de deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) como seu assessor especial. O doleiro Lúcio Bolonha Funaro assistiu a tudo em liberdade.

Passado pouco mais de um ano, Cunha, Alves, Rocha Loures e Funaro acompanham de dentro da prisão a crise que se abate sobre o colega presidente, hoje não mais interino. Temer também está atento ao que se passa com seus bons companheiros.

Há entre os ocupantes do Palácio do Planalto o temor de que integrantes desse quarteto possam usar a delação premiada como atalho para abreviar o tempo de cadeia. Pelo menos dois deles já deram sinais de que podem falar.

Lúcio Funaro, responsável pela engenharia financeira dos esquemas dos pemedebistas, trocou de advogado. Cézar Bittencourt, que o defendia, abandonou o caso dizendo que a delação geraria conflito de interesses com outros clientes. Os atuais advogados de Funaro não desmentem nem confirmam o desejo do cliente em delatar. "Conversei com meu sócio [Bruno Espiñeira Lemos] e por enquanto nada a declarar", disse o advogado Victor Minervino Quintiere.

Nos bastidores, os pemedebistas temem que Funaro ensine aos procuradores o caminho das propinas pagas em diversos esquemas de corrupção envolvendo políticos do partido. Funaro é pivô, segundo o Ministério Público, de uma organização criminosa que cobrava propina de empresários que pleiteavam financiamentos administrados pela Caixa. O PMDB controlava postos-chave no banco.

Foi, segundo José Yunes, ex-assessor de Temer, o portador de R$ 1 milhão da Odebrecht em caixa dois entregue no escritório do presidente, em 2014. Estourou o escândalo da JBS e ele não ficou de fora. Segundo Joesley Batista, a empresa repassou R$ 170 milhões à dupla Cunha e Funaro.

Não bastasse todo esse histórico, nesta semana circulou entre políticos que o operador teria gravado parlamentares que teriam recebido propina das mãos dele.

Cunha também manda recados nada sutis. Em dois processos, um por corrupção na Petrobras e outro onde é acusado de chefiar um esquema de cobrança de propina na Caixa, arrolou Temer como testemunha.

Enviou a ele perguntas –as últimas na semana passada– que foram vistas como um aperitivo do que seria sua delação. "Eduardo tentou me fustigar", disse Temer a Joesley Batista, da JBS.

Os temas eram a relação de Temer com empresários investigados na Lava Jato, seu papel na nomeação de diretores da Petrobras que foram presos, o que ele sabe sobre episódios de pagamento de propina na Caixa e sobre arrecadação de campanhas.

Na cadeia Cunha passa o dia escrevendo e falando com advogados. Uma delação, no entanto, não seria para já. Segundo pessoa próxima a Cunha, o tempo de falar é quando o procurador-geral da República não for mais Rodrigo Janot.

Os dois travaram duras batalhas e ele considera impossível fazer um bom acordo com o atual chefe do Ministério Público Federal. Em setembro, vence o mandato de Rodrigo Janot, que será substituído por um nomeado de Temer.

Cunha e Funaro estão presos desde o ano passado. Já Rocha Loures e Alves, com poucos dias de prisão, permanecem em silêncio. O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, declarou que espera a continuidade desse "padrão ético".


QUEM É QUE DELATA?
Possíveis novos homens-bomba no caminho de governo, oposição e empresas

  • Eduardo Cunha

Quem é: ex-presidente da Câmara dos Deputados

Prisão: 19.out.2016

O que teria feito
Acusado de ser o pivô de vários esquemas de cobrança propina de empresas com contratos com a Petrobras e também interessadas em financiamentos com dinheiro do fundo do FGTS

O que pode delatar
Pode relatar como funcionava e quem se beneficiava desses esquemas. Era próximo a Temer. Enviou perguntas a ele questionando sobre doações de campanha e relações com empresários

  • Henrique Eduardo Alves

Quem é: ex-deputado federal e ex-ministro nos governos Dilma e Temer

Prisão: 6.jun.2017

O que teria feito
O ex-ministro é suspeito de ter recebido R$ 7,15 milhões em propinas de empreiteiras, entre elas uma parte repassada pela OAS relativa à construção da Arena das Dunas, em Natal

O que pode delatar
Próximo de Temer, trabalhou como arrecadador do PMDB. Manteve influência na área internacional da Petrobras e tinha relação próxima com as construtoras. Foi responsável por nomeações na Caixa

Crédito: Lula Marques / Folha imagem Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das ONGs, no Senado Federal, ouve Lúcio Bolonha Funaro, corretor de câmbio que intermediou operações para dirigentes da Cooperativa Habitacional dos Bancários (Bancoop)
  • Lúcio Funaro

Quem é: doleiro e operador do PMDB

Prisão: 1.jun.2016

O que teria feito
Acusado de lavagem de dinheiro e de operar um esquema de cobrança de propinas em financiamentos do fundo do FGTS. Apareceu nas delações da Odebrecht e da JBS

O que pode delatar
Pode revelar o caminho do dinheiro recebido por pemedebistas em vários esquemas de corrupção, como JBS, Caixa Econômica Federal e Odebrecht, além de caixa dois de campanhas eleitorais

Crédito: Rodolfo Buhrer/Reuters Antonio Palocci, ex-ministro da Fazenda e da Casa Civi. Curitiba, Paraná, 26.set.2016
  • Antonio Palocci

Quem é: ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil, respectivamente nos governos Lula e Dilma

Prisão: 26.set.2016

O que teria feito
Réu por lavagem de dinheiro e corrupção passiva e ativa. É apontado como captador para as campanhas do PT e teria facilitado a tramitação de leis que beneficiaram bancos e outros setores

O que pode delatar
É peça-chave para decifrar o caminho do dinheiro que a Odebrecht destinava ao ex-presidente Lula. Seria ele quem operava a "conta amigo", reservada ao ex-presidente. Era o elo do PT com o o mercado financeiro

Crédito: Marcus Leoni/Folhapress O ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega
  • Guido Mantega

Quem é: ex-ministro da Fazenda dos governos Lula e Dilma Rousseff

Prisão: preso e solto no mesmo dia, em 2016

O que teria feito
É acusado pelo dono da JBS de ter distribuído propina da empresa para parlamentares petistas. Também é acusado de ter pedido R$ 5 milhões a Eike Batista para saldar dívidas de campanha

O que pode delatar
Teria demonstrado disposição em detalhar como funcionavam os vários esquemas de caixa dois das campanhas petistas, incluindo as campanhas presidenciais de Dilma Rousseff

Crédito: Marcelo Camargo / Agência Brasil Ex-diretor da Petrobras, Renato Duque depõe à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga irregularidades na estatal. 19.mar.2015
  • Renato Duque

Quem é: ex-diretor de engenharia e serviços da Petrobras

Prisão: em novembro de 2014 e em março de 2015

O que teria feito
Recebia propina das empresas que mantinham contratos com a área de serviços da Petrobras. Era considerado o elo do PT no esquema de corrupção desvendado na Lava Jato

O que pode delatar
Pode detalhar o caminho dessa propina paga pelas empresas que contratavam com sua diretoria. Duque era considerado um diretor da cota do PT e promete delatar Lula

Crédito: Zanone Fraissat/Folhapress Henrique Constantino no Lançamento do livro "Inconsciente e Responsabilidade - Psicanálise do Século XXI", de Jorge Forbes
  • Henrique Constantino

Quem é: acionista da Gol Linhas Aéreas

Prisão: nunca foi preso

O que teria feito
Teria subornado políticos do PMDB, incluindo o ex-deputado Eduardo Cunha, para conseguir financiamento do Fundo de Investimentos do FGTS para a Via Rondon, uma de suas empresas

O que pode delatar
Já contou aos procuradores episódio em que pagou uma propina de R$ 10 milhões de propina a Eduardo Cunha, Lúcio Funaro e à campanha de Gabriel Chalita à Prefeitura de São Paulo

  • OAS

Quem é: empreiteira implicada na Lava Jato

Prisão: Léo Pinheiro, ex-presidente, foi preso em 2014 e 2016

O que teria feito
Teria distribuído propina a diretores da Petrobras, agentes públicos e políticos para obter e manter contratos com a Petrobras. Também é investigada, por exemplo por desvios em estádios da Copa

O que pode delatar
Executivos e acionistas da empreiteira pretendem detalhar aos procuradores pagamentos de propinas a políticos, membros dos fundos de pensão e membros do Judiciário

  • Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa

Quem é: empreiteiras flagradas pagando a políticos e diretores da Petrobras

Prisões: vários executivos

O que teria feito
Já fecharam acordo de delação premiada admitindo o pagamento de propina a políticos e agentes públicos no âmbito da Lava jato. Apesar do acordo, agora vão ampliar os temas

O que pode delatar
Estão refazendo os depoimentos aos procuradores. A Andrade relata suborno em troca de contratos no setor elétrico. A Camargo, propinas em obras em de São Paulo


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