RUBENS VALENTE
DE BRASÍLIA

A investigação da Aeronáutica sobre a queda do avião que matou o ministro do STF Teori Zavascki em janeiro de 2017 concluiu que um dos fatores que contribuíram para o acidente foi desorientação espacial do piloto Osmar Rodrigues, 56, que também morreu no acidente.

Os dados sugerem, segundo a Aeronáutica, que, viajando sob chuva e depois de arremeter duas vezes perto da pista de Paraty (RJ), o piloto se confundiu sobre a verdadeira altitude do avião e acabou atingindo a água ao fazer uma curva. Após bater com a asa direita na baía de Paraty, o avião "capotou", deixando destroços num raio de 150 metros. Os ocupantes morreram de politraumatismo.

Outros fatores que colaboraram para o acidente, segundo a investigação, foram as condições meteorológicas, com "chuva contínua" no momento do acidente, o que provocou uma visibilidade horizontal de 1.500 metros, quando o mínimo para operação, segundo a Aeronáutica, seria de 5.000.

O piloto decidiu fazer o pouso mesmo com baixa visibilidade, o que contrariou as normas aceitas para voos visuais e que, segundo a Aeronáutica, devem ser seguidas por todos os pilotos. Sem equipamentos eletrônicos de auxílio aos pilotos, o aeródromo de Paraty só opera com voos visuais.

Não foram encontrados sinais de sabotagem. A análise técnica dos equipamentos e do motor do avião indicou que estavam em condições normais de funcionamento.

TEORIAS CONSPIRATÓRIAS

A queda do avião turboélice King Air, prefixo PR-SOM, no mar perto do aeroporto de Paraty (RJ) completou um ano na sexta-feira passada (19). Na época do acidente, Zavascki era o relator, no Supremo Tribunal Federal, dos casos derivados da Operação Lava Jato.

A morte violenta do ministro deu origem a dúvidas de familiares e teorias conspiratórias. Além de Zavascki, que viajava de férias, e do piloto morreram o proprietário do hotel Emiliano de São Paulo e dono do avião, Carlos Alberto Fernandes Filgueiras, 69, a massoterapeuta Maíra Panas, 23, e sua mãe, Maria Hilda Panas Helatczuk, 55.

A investigação da Aeronáutica durou um ano e seu resultado foi divulgado nesta segunda-feira (22) em entrevista à imprensa no Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos) em Brasília. Duas horas, o resultado foi passado aos familiares dos mortos.

O investigador encarregado, coronel-aviador Marcelo Moreno, disse que "as condições de voo enfrentadas pelo piloto favoreceram a ocorrência da ilusão vestibular [um dos sistemas de orientação humana, na região do ouvido] por excesso de [aceleração da gravidade] 'G' e da ilusão visual de terreno homogêneo".

"O piloto, muito provavelmente, teve uma desorientação espacial que acarretou a perda de controle da aeronave", concluiu o relatório da Aeronáutica.

CONDIÇÕES METEOROLÓGICAS

O relatório também concluiu que houve, por parte do piloto, uma avaliação "inadequada" sobre as condições meteorológicas "mínimas requeridas para a operação no aeródromo", considerando as duas tentativas de pouso frustradas.

O avião estava equipado com um EGPWS (do inglês, Sistema Avançado de Aviso de Proximidade com o Solo) dotado de alarme sonoro e visual. Os investigadores detectaram que o piloto desligou o sistema para que os alertas não ficassem disparando.

Como fatores contribuintes para o acidente, a Aeronáutica também apontou a possibilidade de "uma pressão autoimposta, atuando de uma maneira sutil" sobre o piloto, pois havia uma "cultura" entre os pilotos frequentadores da pista de Paraty de tentar os pousos mesmo em condições meteorológicas adversas. "A pista é completamente segura, desde que os mínimos meteorológicos estabelecidos, de cumprimento obrigatório, sejam respeitados", disse o coronel Moreno.

O piloto tinha 7.464 horas de voo. No modelo acidentado, quase 3.000 horas de voo. "Posso chamar de um piloto experiente, era piloto já 30 anos, operava aeronaves multimotoras em voos privados desde 1994. Operava no avião acidentado desde 2010. Nos últimos 12 meses, realizou 33 voos com destino a Paraty. Realizava a revalidação periodicamente", informou o coronel.

A Aeronáutica também analisou os registros de áudio da cabine feitos por aparelho de gravação. Poucos minutos antes da queda, o piloto informou por rádio, que aguardava a chuva passar para tentar o pouso.

"Verificou-se que, durante as tentativas de pouso, o piloto apresentava traços de apreensão, ansiedade e temor, indicando um estado emocional compatível com indícios de estresse. Estudos demonstram que o estresse pode interferir na percepção do piloto e contribuir para a desorientação espacial."

A investigação militar não aponta "culpados" nem "causas", mas sim os principais fatores que contribuíram para a queda do avião. O objetivo maior é prevenir futuros acidentes.

Em paralelo à apuração do Cenipa, a Polícia Federal e o Ministério Público Federal investigam o caso para saber os responsáveis pelas mortes, ainda que de forma involuntária, por exemplo, uma falha do piloto ou do serviço de manutenção da aeronave. O inquérito policial ainda não tem prazo para ser encerrado, mas a direção da PF, em reunião no último dia 10 com a presidente do STF, Cármen Lúcia, informou que a hipótese mais provável é a desorientação espacial do piloto.

A Folha não conseguiu localizar os familiares do piloto.

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