Conta 'esquecida' no exterior vira argumento contra delator no Rio

Colaborador se comprometeu a 'abrir mão' de valores, mas disse não saber qual é o banco

Cesar Romero Vianna Junior, ex-subsecretário da Saúde do Rio e delator na Lava Jato
Cesar Romero Vianna Junior, ex-subsecretário da Saúde do Rio e delator na Lava Jato - Reprodução
Felipe Bächtold
Rio de Janeiro

O principal delator de uma das fases da Lava Jato do Rio se comprometeu em seu acordo de delação a "abrir mão de todos os valores mantidos no Bank of America" ilegalmente nos Estados Unidos.

O problema é que, na hora de depor à Justiça Federal, ele afirmou que não sabe detalhes dessa conta, nem mesmo se ela funcionava nesse banco mesmo.

O delator é César Romero Vianna Junior, que foi subsecretário da Saúde no governo de Sérgio Cabral (MDB) e que hoje acusa no acordo seu antigo superior, o ex-secretário Sérgio Côrtes, de obstrução de Justiça e corrupção.

Advogados de Côrtes e de outro alvo do delator mencionam a confusão para questionar a veracidade de seus relatos na Justiça.

Ao firmar um acordo de colaboração, em março do ano passado, Romero, além da menção à conta nos Estados Unidos, se comprometeu a pagar multa de R$ 3,5 milhões, em troca de não ficar preso em regime fechado.

A conta americana seria usada, segundo seu depoimento, por ele e por Côrtes para receber propina de fornecedores de equipamentos em licitações da secretaria estadual. Porém ela estaria, ainda de acordo com o relato de Romero na delação, em nome de Miguel Iskin, empresário acusado de pagar suborno na pasta e a Cabral.

Em depoimento ao juiz federal Marcelo Bretas, Romero disse que, na última ocasião em que acessou essa conta, ela tinha saldo de US$ 16 milhões, sendo que US$ 4 milhões eram seus.

Falou que tinha senha para acessar a conta pela internet e que chegou a enviar US$ 600 mil dela para o Brasil.

Mas não soube dizer com certeza se o banco era mesmo o Bank of America, conforme relatou em seu acordo de colaboração. 

"Posso estar equivocado. Lembro que, se não era Bank of America, era algum banco que tinha o logo com as mesmas cores", disse, a Bretas. A audiência foi em novembro.

Romero argumentou que destruiu as provas relativas à conta antes de ser alvo de buscas, ainda em 2010.

"Toda a documentação que eu tinha relativa a isso, inclusive cadernos de anotações, eu eliminei por ocasião da busca e apreensão no meu apartamento."

SEM DADOS

A defesa de Romero afirma que o assunto já foi esclarecido junto aos procuradores da Lava Jato, após a audiência de novembro, e que a conta era mesmo no Bank of America. Mas afirma que as explicações são sigilosas e que não pode detalhar.

O suposto "dono" da conta, Miguel Iskin, nega que ela exista. O acordo de delação não trazia dados, nem a agência. Iskin pediu que Bretas chamasse o Bank of America para elucidar o assunto, mas a solicitação não foi levada adiante pelo juiz.

As defesas de Iskin e de Côrtes dizem que o delator mente e defendem que o acordo seja rompido.

Os advogados de Côrtes consideram que seu cliente foi vítima de uma armação --ele foi preso em abril do ano passado após Romero apresentar ao Ministério Público Federal a gravação de uma conversa entre os dois sobre a possibilidade de delação. 

Os procuradores acusam o ex-secretário da Saúde de tentar direcionar o acordo do hoje delator e esconder episódios que seriam relatados.

A defesa de Côrtes diz que o ex-subsecretário omitiu trechos da gravação da conversa que o comprometiam.

O juiz federal está com uma das ações penais relativas ao caso, que trata de obstrução de Justiça, pronta para ser sentenciada e deve se manifestar a respeito.

O procurador da República Leonardo Cardoso de Freitas, da força-tarefa da operação no Rio, diz que a situação do delator está sendo avaliada, mas considera que "isoladamente" a questão da conta por ora é insuficiente para rever o acordo de colaboração.

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