Esquema atribuído a aliados de Temer existe há 20 anos, diz Barroso

Empresa de coronel amigo de Temer teve crescimento exponencial com contrato na Eletronuclear

Fábio Fabrini Letícia Casado
Brasília

Na decisão em que autorizou a prisão de pessoas ligadas a Michel Temer nesta quinta (29), o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Luís Roberto Barroso citou suspeitas de que o esquema de pagamento de propina ao presidente e seus aliados funcione há duas décadas. As hipóteses foram levantadas pela Polícia Federal.

De acordo com o ministro, há “indícios que demonstram a possibilidade de se estar diante de um esquema contínuo de concessão de benefícios públicos, em troca de recursos privados, para fins pessoais e eleitorais, que persistiria por mais de 20 anos no setor de portos, vindo até os dias de hoje”.  

Barroso afirmou que, dos documentos colhidos na investigação, destaca-se planilha contábil em que aparecem as siglas MT, MA e L como recebedores de recursos das empresas Libra, Rodrimar e Multicargo. Para ele, isso permite “supor sejam o excelentíssimo senhor presidente da República, Michel Temer, Marcelo Azeredo, presidente da Codesp [companhia Docas de São Paulo] entre 19995 e 1998, indicado por ele, e o amigo pessoal do senhor presidente João Baptista Lima Filho”.

 

O ministro determinou as prisões temporárias de 13 pessoas, entre elas Lima e o advogado José Yunes, ambos amigos de Temer. Também foram presos empresários dos grupos Rodrimar e Libra, do setor portuário, além de sócios da Argeplan, uma das empresas de propriedade de Lima.

Na decisão do STF, obtida pela Folha, Barroso indica que o esquema sob investigação vai além da edição de um decreto relacionado ao setor portuário e também envolve benesses no setor de energia.  

No despacho, o ministro cita o “crescimento exponencial” da empresa Argeplan —pertencente ao coronel João Baptista Lima Filho, amigo do presidente— como um dos fundamentos para a deflagração da operação Skala, da Polícia Federal, nesta quinta (29).

Barroso argumentou que a Argeplan teve um crescimento exponencial nos últimos 20 anos, recebendo R$ 160 milhões de um contrato com a Eletronuclear para as obras da usina de Angra 3. Há suspeitas de que a contratação só ocorreu por conta da ligação entre Lima e Temer, mediante favorecimento. A decisão cita depoimento do empresário José Antunes Sobrinho, investigado na Lava Jato.

“A obtenção [do contrato], segundo José Antunes Sobrinho, só teria ocorrido por ser a Argeplan ligada a Temer e precisou subcontratar a Engevix porque não tinha capacidade para o serviço”, escreveu Barroso. 

Reforma

Para a PF, segundo o ministro, a empresa do coronel “tem se capitalizado por meio de recebimento de recursos provenientes de outras empresas – as interessadas na edição do denominado decreto dos portos – e distribuído tais recursos para os demais investigados”.

A Argeplan foi responsável por uma reforma na casa de uma das filhas do presidente, Maristela Temer. O caso foi revelado pela Folha.  A decisão de Barroso também determina a intimação da arquiteta Maria Rita Fratezi, mulher de Lima, que foi responsável pela obra.

O ministro também citou depoimentos de Joesley Batista, um dos sócios da JBS, segundo os quais o ex-ministro da Agricultura Wagner Rossi, aliado de Temer também preso nesta quinta, teria recebido um “mensalinho”.

Além disso, acrescentou que o grupo Libra e pessoas da família Torrealba, que controla a empresa beneficiada com a medida provisória dos portos, teriam feito elevadíssimas doações eleitorais entre os anos de 2010 e 2014 para o PMDB.

“Tudo o que é relatado pela autoridade policial, e corroborado pela Procuradoria-Geral da República, impõe que se devam obter nesta investigação documentos que estejam na posse de pessoas físicas e jurídicas relacionados com os crimes investigados, bem como novos esclarecimentos de pessoas envolvidas nos fatos”, afirmou Barroso.

A decisão data da última terça-feira (27). Inicialmente, a Polícia Federal havia requisitado ações de busca e apreensão, além de conduções coercitivas dos envolvidos. As coercitivas, no entanto, estão proibidas desde dezembro por uma liminar do ministro Gilmar Mendes do STF.

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, entendeu que cabia determinar as prisões temporárias (até cinco dias) dos envolvidos, para viabilizar a coleta de depoimentos, sem a possibilidade de combinação de versões, e impedir a destruição de provas.

“Especificamente quanto às prisões temporárias requeridas, destaco que essa medida processual, excepcional e invasiva, tem como requisitos […] ser imprescindível ao sucesso das investigações e à constatação de indícios de autoria ou participação nos crimes previstos na lei”, justificou o ministro.

Ele destacou que o coronel Lima tem sido intimado a prestar depoimentos desde maio de 2017, sem comparecer, alegando problemas de saúde.

 
 

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