Lava Jato no Rio prende delegado e ex-secretário de Cabral suspeitos de desvios em presídios

Operação "Pão Nosso" estima prejuízo de R$ 44,7 milhões no fornecimento de lanches a detentos

Felipe Bächtold
Rio de Janeiro
Uma nova fase da Lava Jato do Rio deflagrada nesta terça-feira (13) levantou suspeitas sobre a segurança pública do estado e prendeu mais um ex-secretário do ex-governador Sérgio Cabral (MDB) e um delegado da Polícia Civil fluminense que chefia uma das mais importantes áreas da corporação.
 
A operação, batizada de "Pão Nosso", apura suspeitas de desvios estimados em R$ 44,7 milhões no fornecimento de alimentação em presídios administrados pela Secretaria de Administração Penitenciária do estado. Pela primeira vez, o Ministério Público Estadual participa da operação.
 
Um dos alvos de mandados de prisão é o ex-secretário da pasta César Rubens de Carvalho, que é coronel da Polícia Militar. Ele foi comandante de batalhões na região metropolitana e esteve à frente da secretaria também durante o início do mandato do atual governador, Luiz Fernando Pezão (MDB).
 
Secretário falando ao microfone durante evento
O então secretário estadual do Rio César Rubens Monteiro de Carvalho, em 2011 - Critiane Carvalho - Divulgação/Governo do Rio de Janeiro
 
Outro suspeito preso é Marcelo Martins, que hoje chefia o Departamento de Polícia Especializada da Polícia Civil fluminense. O setor engloba importantes delegacias estaduais, como a do aeroporto internacional e a de crimes contra a Fazenda.
 
Segundo o Ministério Público do estado, o empresário Carlos Felipe Paiva comandava um esquema de desvios em contratos de lanches no sistema penitenciário do Rio que beneficiou o ex-secretário.
 
A investigação apontou que Carvalho era sócio do pai de Marcelo Martins em uma empresa suspeita, chamada Intermundos, e que o patrimônio do ex-secretário aumentou dez vezes enquanto esteve à frente da pasta.
 
Delator da operação, Carlos Emanuel Miranda disse que o ex-governador Sérgio Cabral recebia parte da propina, mas sem um percentual fixo. Também acusou o delegado de receber uma mesada de R$ 5.000 de um outro operador, Ary Ferreira.
 
O juiz federal Marcelo Bretas, responsável pela Lava Jato no Rio, e a 35ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do estado determinaram 17 prisões. A Polícia Federal não informou quantas foram cumpridas. Segundo a Procuradoria, Carlos Felipe Paiva tem cidadania portuguesa e não foi encontrado.
 

PECULATO E FRAUDE

Paralelamente à operação, promotores do estado apresentaram uma denúncia acusando o ex-secretário e outras 25 pessoas da prática de crimes como peculato e fraude em licitação no caso. O delegado não é alvo dessa peça.
 
A apuração começou a partir do projeto Pão-Escola, de ressocialização de detentos. Os procuradores afirmam que a empresa Induspan, de Carlos Felipe Paiva, que também teve a prisão pedida, fornecia lanches acima do valor de mercado e ainda recebia insumos do estado para a produção de pães. 
 
O contrato foi rescindido, mas Paiva continuou atuando como fornecedor na secretaria por meio de uma organização civil chamada Iniciativa Primus, ainda de acordo com a investigação.
 
Os investigadores afirmam que essa organização não deveria ter fins lucrativos, mas fazia pagamentos em série a laranjas e a empresas indicadas por Paiva. Um dos beneficiários era a companheira do doleiro Sérgio Pinto, que já tinha sido alvo da Operação Farol da Colina, da Polícia Federal, em 2004. A ela foram repassados R$ 6,7 milhões.
 
Quanto ao ex-secretário, os procuradores da Lava Jato afirmam que uma outra empresa do qual ele é sócio, a Precisão Indústria e Comércio de Mármore, realizou movimentações de altas somas em espécie, o que também indica participação em irregularidades, e que ele prorrogou os contratos lesivos aos cofres públicos, mesmo com todos os indicativos de problemas.
 
Marcelo Martins, diz o Ministério Público Federal, era sócio da empresa Finder, citada por delatores como beneficiária de pagamentos indicados por Ary Ferreira.
O delegado Marcelo Martins, ao centro, chega à sede da Policia Federal após a operação Pão Nosso, desdobramento da Lava Jato
O delegado Marcelo Martins, ao centro, chega à sede da Policia Federal após a operação Pão Nosso, desdobramento da Lava Jato - José Lucena/Futura Press/Folhapress

Bretas afirmou em sua decisão que a Finder e a Intermundos têm o mesmo endereço e apenas uma e mesma funcionária.

 
A Polícia Civil vai instaurar um processo administrativo para apurar a conduta do delegado. 
 
A defesa do ex-secretário diz que ele não cometeu irregularidades e que o próprio Ministério Público do estado já afirmou que a variação patrimonial dele é compatível com seus rendimentos. Também afirma que a prisão preventiva viola o princípio da presunção da inocência e que ele sempre se colocou à disposição das autoridades.
 
A defesa de Sérgio Cabral disse que ele desconhece irregularidades na Secretaria de Administração Penitenciária e que nunca "compactuou com ilícitos na sua vida pessoal ou como gestor públicos". A reportagem não conseguiu localizar os advogados dos outros alvos.
 

OUTRAS INVESTIGAÇÕES

César Rubens de Carvalho é mais um secretário da gestão de Sérgio Cabral a ser preso na Lava Jato. Antes dele, já tinham sido detidos Régis Fichtner (Casa Civil), Sérgio Côrtes (Saúde), que foram soltos, Hudson Braga (Obras) e Wilson Carlos (Governo).
 
Em meio à intervenção federal no Rio, esta é a maior investigação da Lava Jato fluminense na área da segurança, que está desde fevereiro sob o comando das Forças Armadas. 
 
Contratos antigos da Secretaria de Administração Penitenciária já vinham sendo objeto de investigação de promotores e da nova direção da pasta.
 
Em janeiro, a Justiça mandou afastar o então secretário estadual Erir Ribeiro Costa Filho após a divulgação de supostos privilégios ao ex-governador Sérgio Cabral (MDB) na cadeia pública de Benfica, no Rio.
 
Assumiu David Anthony, que é delegado da Polícia Civil fluminense, e que foi mantido no cargo mesmo com a intervenção federal na área da segurança no estado.
 

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