Dia D de Lula começou sem polícia e terminou com feridos em Curitiba

PM paranaense não preparou nenhum plano de policiamento para evitar conflitos entre manifestantes

Apoiadores do ex-presidente Lula em frente ao prédio da Polícia Federal em Curitiba - Rodolfo Buhrer / Reuters
Curitiba

O sábado (7), dia que ficará marcado pela prisão do ex-presidente Lula, começou em Curitiba com quase nenhum esquema de segurança nos arredores da Polícia Federal, para onde ele seria levado, e terminou com uma ação de dispersão de apoiadores dele pela polícia no instante em que o petista chegava de helicóptero.

Ao longo do dia, havia uma tensão permanente nas proximidades do prédio, seja por episódios de hostilidade a jornalistas ou pelo risco de enfrentamento entre os grupos pró e contra Lula.

Apesar de a ida do ex-presidente ao local ter sido decidida na quinta-feira (5), a PM paranaense não preparou nenhum plano de policiamento para evitar conflitos entre manifestantes. Foi uma situação surpreendente diante do forte esquema que foi articulado, por exemplo, em maio do ano passado, quando o petista esteve na cidade para depor ao juiz Sergio Moro. Na ocasião, não houve incidentes graves.

Neste sábado, a PM só chegou às proximidades da sede da Polícia Federal no início da tarde, após as primeiras confusões entre apoiadores favoráveis a Lula e alguns poucos opositores que já compareciam ao local.

Reforço policial só havia mesmo dentro da sede da PF, com agentes de uma unidade especial chamado Grupo de Pronta Intervenção.

No meio da tarde, depois de uma conversa às pressas com representantes dos manifestantes, a polícia formou um setor de isolamento e destinou uma área para a ala pró-Lula e outra, em frente ao prédio, para os opositores.

Com a chegada de mais antipetistas, imperou um clima de disputa de torcidas organizadas de futebol, com xingamentos de uma parte a outra e manifestantes expulsos ao entrar no lado "adversário". A ala pró-Lula fazia batucada, enquanto os opositores respondiam com cornetas e buzinas. Ao lado do prédio, apoiadores cantam o jingle "Olê, olá, Lula, Lula" e os rivais gritavam de volta "Lula na cadeia".

O grupo vestido de verde e amarelo fazia panelaço, símbolo do impeachment de Dilma Rousseff, e tentou levar um carro de som ao local, mas acabou barrado pela polícia. Mesmo contra as ordens, usou um alto-falante e tocou o Hino Nacional.

Profissionais da imprensa se posicionavam no cordão de isolamento ou no espaço destinado ao simpatizantes de Lula, onde já tinham trabalhado desde os dias anteriores.

À noite, uma jornalista de um site do Amazonas que gravava um vídeo foi confundida com repórter da Globo, e acabou cercada e hostilizada por esses manifestantes, que chegaram a discutir se deveriam atacar ou não jornalistas no local.

Equipes de TVs foram alvos de ovos e desistiram de fazer entradas ao vivo na sacada de uma casa ao lado da superintendência. Policiais militares e seguranças chegaram a escoltar os jornalistas que precisaram sair desse imóvel em meio à manifestação.

 
 

BOMBAS

Por volta das 22h, antes da chegada de Lula, havia clima de festa entre as centenas de pessoas presentes nas duas manifestações, apesar da lamentação entre os favoráveis ao ex-presidente. Os antipetistas soltavam fogos para comemorar a prisão.

Simpatizantes do PT dançavam em ciranda na rua e trouxeram líderes religiosos para discursar a favor do ex-presidente. Barracas de lanches foram levadas para a área e tendas para uma vigília durante o período da prisão já estavam armadas.

Pouco antes da chegada do helicóptero com o ex-presidente, os manifestantes pró-Lula cantaram "Pra não dizer que não falei das flores", hino da resistência na ditadura militar. No instante do pouso no terraço do prédio, os opositores do ex-presidente tocaram "Polícia", dos Titãs, em um carro de som em um ponto da vizinhança em que era possível enxergar melhor a chegada do petista.

Nesse mesmo momento, uma ação de agentes da Polícia Federal provocou grande tumulto no acesso oposto à superintendência.

Policiais federais dispersaram a multidão com bombas de gás lacrimogêneo, e a PM paranaense também entrou em ação atirando com balas de borracha em direção aos manifestantes. 

Segundo o tenente-coronel da PM Mario do Carmo, os policiais federais viram duas explosões de bombas entre os manifestantes pró-Lula e então decidiram reagir. Também afirma que manifestantes avançaram contra um dos portões da superintendência, que estava fechado.

A reportagem da Folha estava próxima ao local onde começou a ação dos policiais federais e não observou nenhum tumulto antes da deflagração da ação policial.

A inesperada medida da polícia deixou ao menos sete manifestantes pró-Lula e um policial feridos, entre eles três crianças. Uma delas e outros três adultos foram levados a um hospital da capital paranaense.

Houve correria e muita tensão diante da possibilidade de novos enfrentamentos. Pertences dos grupos a favor de Lula e até de vendedores ambulantes ficaram espalhados em meio a um dos acessos da PF.

O presidente do PT paranaense, o ex-deputado federal Doutor Rosinha, precisou convencer remanescentes da dispersão a desistir de permanecer em frente a uma fileira de policiais militares. 

Ele criticou a ação e disse que não houve nenhum ato dos apoiadores de Lula que justificasse a atuação policial. Também contou que negociou pouco antes do tumulto a desocupação da área com a PF como forma de cumprir uma decisão judicial e afirmou que tinha chegado a um acordo.

Com o tumulto, a maioria dos manifestantes, dos dois lados, decidiu ir embora. Alguns simpatizantes de Lula voltaram a se reunir em um ponto mais afastado da superintendência, onde havia autorização para ficar. Parte decidiu passar a noite nesse local.

Já era madrugada quando a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, se reuniu com representantes da Polícia Federal para pedir explicações sobre o ocorrido e avisar que os apoiadores de Lula farão vigília nas redondezas até que Lula seja solto.

Gleisi disse que a Polícia Federal não é acostumada a atuar em manifestações e pediu ao superintendente no Paraná que não participe mais dessas ações.

Pelas ruas, era possível ouvir ainda muitas buzinas em comemoração da prisão do petista.

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