Twitter de general do Exército vai de posts sobre Constituição a elogios a Sabrina Sato

Postagem sobre julgamento de Lula no STF foi a que gerou maior repercussão 

Anna Virginia Balloussier
Brasília

Gratidão aos apresentadores Luciano Huck e Sabrina Sato, um tanto de proselitismo verde-oliva e reiteradas garantias de que o Brasil, não importa o tamanho da crise que atravesse, não escorregará para um caminho fora da Constituição.  

Os dias eram assim no Twitter do líder maior do Exército brasileiro, general Eduardo Villas Bôas, nos 420 dias desde que estreou na rede social. A história não se repetiu na noite desta terça-feira (3).

Na véspera do julgamento no Supremo Tribunal Federal que decidirá se Lula pode ou não ir preso, o general fez dois comentários na rede social que suscitaram uma onda de apoio e outra de suspeita de que o Alto Comando da instituição esteja tramando nova intervenção militar.

O primeiro deles: "Nessa situação que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do país e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais?".

O segundo foi ambíguo o suficiente para despertar dúvidas sobre o que exatamente Villas Bôas quis dizer ao falar que ao menos esta costela das Forças Armadas estava "atenta às suas missões institucionais".

O tuíte falava de assegurar à nação que o Exército "julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à Democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais".

De longe seu maior sucesso de audiência: a dupla de comentários somava até a manhã desta quarta-feira (4) 77 mil curtidas, 29 mil compartilhamentos e fez o número de seguidores do militar disparar para 150 mil.

A Folha fez uma varredura no perfil de Villas Bôas, que tuitou pela primeira vez no dia 7 de abril de 2017. No mês seguinte, ele estaria reforçando o "compromisso perene" do Exército "com a Constituição".

À beira de grave crise política, o general procurava então serenar ânimos de um país que já acumulava dois presidentes destituídos em três décadas de democracia. "A Constituição Federal Brasileira há de ser sempre solução a todos os desafios institucionais do país. Não há atalhos fora dela!", escreveu.

Era 19 de maio de 2017, dois dias após o noticiário ser encharcado a delação de Joesley Batista. Na época, encorpava-se a ideia de que o presidente Michel Temer, atingido em cheio por um grampo do dono da JBS, não duraria no cargo.

Se há 10 meses um tuíte de Villas Bôas afugentou quaisquer receios de um nova ditadura militar num país politicamente fragilizado, a repercussão foi outra na terça ---quando a direita tratou de se alinhar ao "repúdio à impunidade" do general ("estamos juntos!", disse Jair Bolsonaro), e a esquerda o acusou de novo complô militar ("estamos em abril de 1964 ou de 2018?", questionou Guilherme Boulos).

O general, ao menos até agora, não era afeito a arroubos verborrágicos.

Em 19 de agosto de 2017, usou a internet para agradecer ao "soldado Luciano Huck", que à época ainda constava no bolão de presidenciáveis, por uma reportagem em seu "Caldeirão do Huck" sobre o trabalho de militares brasileiros no Haiti: "Caro @LucianoHuck - nós soldados da paz agradecemos seu apoio às tropas no Haiti. Vc é um dos nossos. #ObrigadoSoldado!".

Um mês antes, ainda sobre a presença verde-amarela no país da América Central, questionou seus seguidores: "Vc sabe o q significa Bon Bagay? As tropas de paz no Haiti eram bem recebidas pelo haitianos e eles assim nos chamavam".

Villas Bôas também se disse grato a Sabrina Sato: "Que belo programa você nos brindou a partir de suas experiências com nossas jovens cadetes na Academias Militar das Agulhas Negras. Estou seguro que você despertou o interesse de muitas jovens pela carreira militar no @exercitooficial. Valeu! #ObrigadoSoldado".

Em novembro passado foi a vez de prestigiar o fotógrafo Sebastião Salgado, que havia lhe apresentado "seu projeto de preservação da Amazônia".

Dias depois, evocou palavras de um cientista político norte-americano com boa acolhida em círculos militares conservadores. "Samuel Huntington [1927-2008] nos instiga: 'A lealdade e a obediência são as mais altas virtudes militares; mas quais serão os limites da obediência?' O Estado, ao nos delegar poder p/ exercer a violência em seu nome, precisa saber q agiremos sempre em prol da sociedade da qual somos servos".

Villas Bôas, 66, assumiu a liderança do Exército em 2015, durante o governo Dilma Rousseff. Passado um ano do impeachment da petista, ele criticou no Twitter "o 'politicamente correto', entranhado na nossa sociedade, que pressupõe a supremacia do direito individual sobre o coletivo. Isso funciona?".

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