Promotor critica volta do 'projeto de lei de abuso de autoridade disfarçado'

Proposta, que está com tramitação suspensa no Senado, prevê indenização a investigados

São Paulo

Em debate, o promotor Roberto Livianu criticou o que considera ser a volta do projeto de lei de abuso de autoridade desta vez "disfarçado e com maquiagem".

Ele se refere ao projeto chamado de Estatuto de Responsabilidade Civil, de autoria do deputado Hugo Leal (PSD-RJ), relatado no Senado por Antonio Anastasia (PSDB-MG).

O texto estabelece que "o Estado indenizará o condenado por erro judiciário e aquele que ficar preso além do tempo fixado na sentença". 

O promotor Roberto Livianu, durante lançamento de livro em São Paulo
O promotor Roberto Livianu, durante lançamento de livro em São Paulo - Eduardo Anizelli - 19.mar.2018/Folhapress

Anastasia incluiu no seu substitutivo o direito à indenização a quem for preso preventivamente se ficar provado que "o fato criminoso não ocorreu, não foi ele o autor ou tenha ficado preso além do prazo razoável para a conclusão do processo".

O senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) pediu vista e a tramitação foi interrompida. 

"Agora, os senhores congressistas se especializaram em falsificar projetos de leis. Eles disfarçam o projeto para que as pessoas não percebam as intenções nele contidas. O objetivo é vingança", disse o promotor.

"Nada contra atualizar uma lei sobre abuso de autoridade. Nada contra criminalizar maus juízes e maus membros do Ministério Público. Mas se você pega esse projeto, você não encontra nenhum crime de deputado ou senador. Autoridade é só juiz, é só procurador", protestou Livianu.

O projeto original de abuso de autoridade causou polêmica ao ser considerado por membros do Judiciário e do Ministério Público uma retaliação a juízes e investigadores, em especial na Operação Lava Jato.

Em nota, Hugo Leal disse que o seu projeto foi apresentado em 2011 e aprovado pela Câmara em 2015, antes, portanto, da polêmica. 

Segundo o deputado, "todos os entes públicos (Executivo, Legislativo, Judiciário, Ministério Público, Tribunal de Contas) e empresas concessionárias de serviços públicos são abrangidos pelo projeto. Nem o projeto original nem o texto aprovado pela Câmara têm como alvo policiais, procuradores ou juízes".

Leal afirmou que "continua a defender a necessidade de regulamentar a responsabilidade civil do Estado por tratar de mais tema de alta relevância: como os cidadãos podem obter, com celeridade, reparações em face de danos causados pelos agentes estatais".

LENIÊNCIA COM CORRUPÇÃO

O debate, realizado pelo Instituto Não Aceito Corrupção na terça (23), discutiu ética e partidos. O professor de ciência política José Álvaro Moisés, da USP, disse que há uma base social que nutre a corrupção.

"Nas minhas pesquisas, tem uma parte dos resultados que mostra que tem leniência social com a corrupção", relatou. 

"Quando você faz várias perguntas sobre o impacto da corrupção pelo lado dos políticos, quase a maioria é contra. Quando você diz, se você estivesse no lugar do político que pode contratar um parente, superfaturar, rouba mas faz, a crítica cai muito", disse Moisés. 

"Desse ponto de vista, a Lava Jato representou uma impacto, um susto e aos poucos as pessoas estão percebendo as consequências que a corrupção tem para as políticas públicas", concluiu.  

O professor de ética e filosofia Roberto Romano, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), falou da necessidade de democratização legal dos partidos políticos. 

"Ainda acredito nas forças dos movimentos", disse, brincando que ainda é um pouco ingênuo. "Uma série de iniciativas populares consegue arrancar um pouco de concessão para o lado mais ético da atividade política".

"Não é uma questão de entregar os pontos, isso é pior neste momento, eu diria, de pré-fascismo que nós estamos vivendo. Dizer que é tudo igual, não dá para mudar, é o pior, tanto na universidade quanto na imprensa", afirmou.

"Se você disser que não há possibilidade de mudança, você decreta que não há possibilidade de mudança", concluiu

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