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Decisão do STF sobre papel de polícias mostra que instituto da colaboração tem saído fortalecido

Tribunal rejeitou ação que questionava legitimidade de delegados para promover acordos

Parte central da Lei de Organizações Criminosas (Lei 12.850/2013), as colaborações premiadas se tornaram uma das principais engrenagens da Operação Lava Jato e de dezenas de ações penais que tramitam no próprio Supremo e nas instâncias ordinárias. Desde então, os dispositivos legais que tratam dos acordos e dos termos das colaborações premiadas têm sua constitucionalidade questionada, impondo ao Supremo a delimitação jurídica do instituto.

A primeira grande decisão do Supremo no tema se deu no âmbito de investigações ancoradas nas colaborações premiadas dos sócios da J&F, envolvendo o presidente Michel Temer. 

Os citados nas colaborações premiadas questionaram a validade dos acordos, sobretudo os benefícios concedidos aos irmãos Joesley e Wesley Batista, como o não oferecimento de denúncia criminal e possibilidade de sair do país.

Naquela oportunidade, um Supremo dividido decidiu que a atuação do juiz frente a acordos de colaboração premiada deve ocorrer em dois momentos: primeiro na homologação, onde caberá ao juiz apenas analisar a regularidade, legalidade e voluntariedade do acordo, ou seja, se ele foi feito de acordo com os requisitos legais e sem vícios de vontade; e ao final do processo, para verificar se as promessas feitas pelo colaborador foram cumpridas para receber os benefícios.

Nesse ponto, caso o acordo de colaboração premiada tenha sido plenamente cumprido, não caberia ao juiz entrar no mérito da extensão dos benefícios concedidos, por uma questão de lealdade e segurança jurídica; porém, caso o colaborador não tenha cumprido com os termos, os benefícios poderiam ser revogados, sem prejudicar as provas obtidas por meio da colaboração.

O acordo de colaboração de Joesley e Wesley Batista foi homologado. Mas, algum tempo depois, diante de provas de que ambos os colaboradores teriam omitido informação relevante, os seus benefícios foram revogados. 

As provas obtidas ainda dão suporte a uma série de investigações em curso, como o inquérito conhecido como “Quadrilhão do MDB”, sobre venda de medidas provisórias e leis.

 

Agora, o Supremo decidiu outra ação, também sem unanimidade, sobre o papel que delegados de polícia podem desempenhar nos acordos de colaboração premiada.

A lei dispõe que delegados, com manifestação do Ministério Público, podem celebrar acordos. O Ministério Público queria essa atribuição apenas para si. Para a maioria do Supremo, a possibilidade de composição institucional entre polícias e Ministério Público pode ser benéfica para as investigações. A lei, então, resistiu ao ataque.

O instituto da colaboração premiada tem saído, assim, fortalecido. Porém, a forma como as instituições têm agido segue sendo problemática. O uso excessivo de prisão provisória para instigar a celebração de acordos, a seletividade do sistema de Justiça sobre os alvos das operações e apoio apenas em colaborações nas condenações estão entre as principais críticas feitas pela advocacia, e o tribunal poderá ser instado a se posicionar sobre elas.

É notável, entretanto, que o julgamento tenha exposto uma posição particular de cada um dos ministros sobre o tema: para uns, a manifestação do Ministério Público deveria ser vinculante; para outros, a polícia não poderia recomendar perdão judicial ou redução de pena; outro grupo via a concordância do Ministério Público como condição de procedibilidade. 

Frente a múltiplas posições sobre como a lei deveria ser, prevaleceu como ela é.

Eloísa Machado de Almeida é professora e coordenadora do Supremo em Pauta FGV Direito SP

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