Descrição de chapéu centrais sindicais

Mensagens indicam propina de R$ 300 mil por registro sindical, diz PF

Consultor de central chega a ameaçar ir a Temer; governo diz que investiga

Fábio Fabrini Letícia Casado
Brasília

A Polícia Federal sustenta que entidades em disputa por registros sindicais pagaram propinas de R$ 300 mil e até ameaçaram recorrer ao presidente Michel Temer para conseguir fraudar processos no Ministério do Trabalho.

Mensagens trocadas entre os investigados na Operação Registro Espúrio mostraram que o presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, pressionava autoridades da pasta para impedir a oficialização do Sindicato dos Trabalhadores no Comércio Atacadista e Varejista de Material de Construção de SP (Sintramac). Ele comanda o Sindicato dos Comerciários de SP (SEC-SP), que perderia filiados nesse caso.

Conforme as investigações, após combinação prévia de Patah e outros integrantes da UGT com o então assessor da Secretaria das Relações de Trabalho Renato Araújo, o pedido do Sintramac foi indeferido.

O sindicato prejudicado, então, teria se articulado com outros servidores —o então coordenador de Registro Sindical, Leonardo Cabral, e o então secretário das Relações de Trabalho, Carlos Lacerda—, que emitiram nota favorável a recurso da entidade. Araújo, Cabral e Lacerda foram alvos de mandados de prisão preventiva, decretados pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal.

Agentes da Polícia Federal deixam o gabinete da liderança do PTB na Câmara após cumprirem mandado de Busca e Apreensão no âmbito da operação Registro Espúrio, que apura irregularidades em registros de sindicatos
Agentes da PF deixam o gabinete da liderança do PTB na Câmara após cumprirem mandado de Busca e Apreensão no âmbito da operação Registro Espúrio, que apura irregularidades em registros de sindicatos - Pedro Ladeira - 30.mai.2018/Folhapress

Em reação, representantes da UGT avisaram que Patah recorreria ao presidente da República. "Foi facadas nas costas. Ataque direto ao presidente da UGT", escreveu em janeiro de 2017 o consultor da central sindical, Eduardo Pavão. "Será revertido, nem que a ordem venha do Temer."

O inquérito sobre o caso não é conclusivo sobre eventual tratativa com o presidente a respeito. No mês seguinte, contudo, o sindicalista conseguiu reverter a situação, suspendendo o registro da entidade rival por um recurso.

Com mais esse revés, integrantes do Sintramac teriam mudado de estratégia e pago R$ 300 mil em propina. Um servidor da pasta, Daniel Vesely, passou a receber mensagens de um suposto interlocutor do sindicato, não identificado nas investigações, cobrando a publicação de uma decisão favorável em contrapartida a R$ 300 mil já pagos.

"Faz o que nós combinou, pô! Publica aquela nota técnica lá. Pra não dar problema. Senão, segunda-feira eu tô aí. Devolve o que eu dei pra você e já era, tio", diz um áudio enviado ao servidor.

Ele repassa as cobranças a Araújo, que também recebeu ameaças por telefone.

Fachin decretou a prisão temporária de Vesely. A partir das ameaças, Araújo passou, segundo as investigações, a orientar o Sintramac a apresentar um mandado de segurança contra o próprio ministério para reverter a decisão.

Em outro caso investigado, a PF aponta que a UGT atuou para liberar, via propina, o registro do Sindicato dos Empregados em Restaurante e Empresas do Comércio e Serviço de Alimentação Preparada e Bebida a Varejo de São Paulo e Região (Sintraresp).

O pedido foi feito pela entidade em 26 de dezembro de 2016 e, em 27 de abril do ano seguinte, o registro foi publicado no "Diário Oficial".

Uma ação de improbidade administrativa, ajuizada pelo procurador da República Federico Paiva contra os responsáveis pelo processo, diz que o pedido não foi analisado pelas instâncias técnicas adequadas. A entidade aguardou apenas dois dias entre o deferimento da carta sindical e a publicação, enquanto em outros casos a espera pode superar dois anos.

A PF constatou que, no mês seguinte à publicação do registro, a UGT transferiu R$ 300 mil para a conta do sindicato, valor que foi sacado em espécie dois dias depois. Para os investigadores, a quantia foi usada para o pagamento de propina a Cabral e Lacerda, com participação de Patah, apontado como o responsável por liberar os recursos.

O Palácio do Planalto reiterou comunicado do Ministério do Trabalho, que diz ter aberto sindicância e dispensado os servidores investigados.

Patah disse que atuou para impedir o registro do Sintramac, mas dentro da legalidade, pois entende que a concessão seria irregular. Ele negou ter procurado Temer sobre o assunto. O sindicalista disse que os R$ 300 mil repassados pela UGT ao Sintraresp foram um empréstimo, pois o sindicato estava em formação e precisava se estruturar. Patah afirmou que a entidade não pagou a dívida e que a UGT vai cobrá-la.

A Folha não localizou representantes do Sintramac e dos servidores investigados. O Sintraesp não se manifestou.

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