Ministério Público tem poder extraordinário no país, afirma Toffoli em congresso

Para ministro, juízes são árbitros e não protagonistas

Ana Luiza Albuquerque
Curitiba

O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Dias Toffoli afirmou na manhã desta sexta-feira (15) que o Ministério Público tem um poder extraordinário no país. Segundo ele, o órgão foi criado para atuar como contraponto ao Judiciário, visto como retrógrado. 

"A Constituição deu esse empoderamento como alternativa para a sociedade brasileira, em uma espécie de quarto poder", disse em palestra no VI Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral, em Curitiba (PR).

Toffoli afirmou que o protagonismo do Ministério Público tem raízes na nova sociedade que buscava-se criar com a constituição de 1988. Na sua visão, os constituintes não acreditavam ser possível criar um novo modelo social a partir de um Judiciário retrógrado e de uma Suprema Corte indicada pelos militares. "Vamos criar uma instituição que vá conseguir trazer a efetividade dos direitos em nome da sociedade."

Dias Toffoli durante sessão
O ministro Dias Toffoli durante sessão do STF - Pedro Ladeira - 13.jun.2018/Folhapress

Questionado se o Judiciário deveria atuar como árbitro ou protagonista, o ministro disse que os juízes não podem, jamais, ser protagonistas. "Se quisermos ser protagonistas vamos ser substituídos. E por quem? Se somos os árbitros, não podemos ser, jamais, protagonistas."

Segundo ele, este foi o erro cometido pelas Forças Armadas em 1964, ao decidirem protagonizar, em vez de arbitrar. "Em 1° de abril de 1964, eles entraram para arbitrar uma crise na sociedade brasileira. No dia 15 de março de 1964, Castelo Branco era eleito para terminar o mandato de João Goulart. Era uma transição."

SOCIEDADE LÍQUIDA

A palestra de Toffoli, intitulada "O papel do Supremo Tribunal Federal em matéria eleitoral", foi recheada de citações. Para explicar a fragmentação da política, exemplificada pelo grande número de partidos no Brasil, o ministro recorreu ao filósofo Zygmunt Bauman, criador do conceito de "modernidade líquida".

Segundo Toffoli, a fragmentação política nada mais é do que a fragmentação da "sociedade líquida" em que vivemos. "Um mundo em que as pessoas sabem o que não querem, mas não sabem o que querem."

Ele ressaltou que o país não chegou a um propósito único, o que ficaria claro na apresentação das pré-candidaturas à Presidência. "A quatro meses das eleições, quem apresentou um projeto de nação? Absolutamente ninguém."

De acordo com Toffoli, o grande número de partidos não é consequência de decisão do STF que, em 2006, considerou inconstitucional a cláusula de barreira, mas sim da liquidez social. O ministro disse que a sociedade atual, de transição, viverá um sistema de governança caótico, de decisões contraditórias e antagonistas. 

"Deus está morto. O que virá no lugar de Deus?", questionou, em referência à obra do filósofo Friedrich Nietzsche.

PAPEL DO SUPREMO

Para Toffoli, que assumirá a Presidência da corte em setembro, o STF não deve alterar interpretações depois de iniciado o processo eleitoral. "O ideal é que uma vez chegado o período de seis meses [antes das eleições], já se tenha estabilidade das normas e que a jurisprudência não oscile mais, não tome decisões antagônicas."

O ministro também disse que a corte só age quando é provocada e obrigada a decidir. "Acertamos na grande maioria das vezes. Talvez a cláusula de barreira, de desempenho, tenha sido equivocada."

Toffoli afirmou que, toda vez que o Supremo entra numa seara estrita ao campo político-eleitoral, as decisões estão sujeitas aos parâmetros da Constituição e das leis. "Acaba sendo depois discutido no Congresso e vem uma reação normativa às decisões tomadas", disse.

O ministro deu como exemplo a criação pelo Congresso de um fundo público de alto valor como reação à proibição pelo STF do financiamento privado das campanhas. "Sempre vai haver, conforme uma decisão do Supremo Tribunal Federal, uma reação do parlamento."

CONGRESSO

Ainda nesta sexta (15), também participarão do congresso os ministros do STF Luís Roberto Barroso e Luiz Fux, nas conferências "Reforma Política: a agenda inacabada" e "O controle das Fake News pela Justiça Eleitoral".

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