GE usou firma suspeita para vender ao Brasil

Multinacional recorreu à mesma empresa que foi utilizada para outros negócios que resultaram em prisões no Rio

Italo Nogueira
Rio de Janeiro

Oficialmente fora do alvo principal das investigações da Operação Ressonância, a General Electric utilizou ao menos uma empresa suspeita no caso para exportar seus produtos para o Into (Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia) e a Secretaria de Saúde do Rio de Janeiro.

Foram quatro exportações entre 2007 e 2016 por meio da Moses Trading, apontada pelo Ministério Público Federal como uma das usadas pelo empresário Miguel Iskin para trazer ao Brasil os equipamentos. Ele é suspeito de ser o organizador do cartel em pregões internacionais nos dois órgãos públicos.

Foram US$ 4 milhões exportados pela GE por meio dessas empresas entre 2007 e 2016, o equivalente atualmente a R$ 15 milhões. No total, a multinacional americana enviou para os dois órgãos no período 17 equipamentos no valor de US$ 24,4 milhões. As informações fazem parte de um relatório da Receita Federal.

Miguel Iskin presta depoimento à CPI das Próteses
Miguel Iskin presta depoimento à CPI das Próteses - Pedro França /Agência Senado

A GE não foi alvo de busca e apreensão, embora seu principal executivo para a América Latina, Daurio Speranzini Jr., tenha sido preso sob suspeita de "contratações espúrias" à frente da empresa. As principais suspeitas sobre ele são da época em que esteve na Philips, em 2010.

Multinacionais como a Philips e a Johnson & Johnson são investigadas de terem se beneficiado de um esquema de cartel organizado por Iskin. Em alguns casos, o empresário recebia apenas uma comissão, sem participação direta na licitação ou na importação dos produtos. Em outros casos, a atuação era mais complexa.

Iskin, segundo o MPF, tinha uma rede de empresas de fachada no Brasil que disputavam licitações direcionadas no Into e na secretaria.

Após vencer o certame, o pagamento era feito a uma outra empresa no exterior, também ligada ao empresário, para realizar a importação do produto.

Esta intermediária adquiria anteriormente equipamentos junto a um fabricante internacional, como a Philips, por um preço até 40% menor. As investigações apontam que essas multinacionais sabiam de toda a operação, e participavam dela como condição para ter seus produtos no Into e unidades da Secretaria de Saúde fluminense.

O ex-secretário de Saúde Sérgio Côrtes afirmou que Iskin era uma espécie de "garantia de sucesso" das multinacionais nas licitações. Réu confesso por receber propina do empresário, ele disse que essas empresas não discutiam os pagamentos com ele, mas sabiam da sua relação próxima com Iskin.

A Moses era uma das seis emrpesas utilizadas por Iskin para realizar a importação do produto aos órgãos públicos. A Philips, investigada no caso, vendeu no total US$ 14,2 milhões para o Into e a secretaria, sendo US$ 2 milhões por meio da Avalena, também usada pelo empresário. São valores inferiores ao da GE.

Outra empresa que exportou produtos da GE foi a MD International. Não há informações de vínculos entre ela e Iskin. Mas, segundo o ex-subsecretário de Saúde César Romero, delator no caso, esta empresa também participava do cartel nos pregões internacionais. Ela foi usada em nove operações que somaram US$ 15,5 milhões no período.

Duas empresas da GE tiveram, no total, R$ 7,7 milhões bloqueados pela Justiça Federal na operação, em razão do cargo ocupado por Speranzini na multinacional.

A GE pediu na Justiça para ter acesso à investigação completa do caso, mas o MPF opinou pelo indeferimento do pedido. Afirmou que "a pessoa jurídica não é investigada pelos crimes em comento, mas sim as pessoas físicas que tenham praticado condutas ilícitas dentro da estrutura empresarial".

A empresa afirmou, em nota, que "não tem conhecimento de qualquer conduta imprópria envolvendo a GE Healthcare e está comprometida em cooperar com as autoridades".

O MPF disse, por meio de sua assessoria, que "investiga fatos, não pessoas (físicas ou jurídicas)". "As apurações seguem em curso, razão pela qual não afastamos o envolvimento de nenhuma empresa ou dirigente nos fatos investigados", diz a Procuradoria.

A defesa de Iskin nega que ele tenha fraudado licitações e pago propina a agentes públicos.

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.